Tempo em janeiro em Portugal: será que a possível rutura do vórtice polar irá resultar em vagas de frio, chuva e neve?
Nos últimos dias, as consequências de um poderoso aquecimento súbito da estratosfera e da possível rutura do vórtice polar têm sido bastante comentadas no seio da comunidade científica. Irá isto traduzir-se em vagas de frio, chuva e neve em Portugal nas próximas semanas?
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Os primeiros dias de 2024 têm sido marcados pelo céu nublado e pela queda de precipitação associada a uma frente atlântica no Norte e Centro de Portugal - reforçada por um rio atmosférico -, cenário que aliás se irá generalizar a todo o Continente ao longo destes próximos dias.
Aspetos da climatologia de janeiro
Climatologicamente, janeiro é o mês mais frio do ano em Portugal, com uma temperatura média no conjunto do país de cerca de 8,9 ºC, embora com grandes contrastes: das temperaturas gélidas do interior Norte e Centro montanhoso passamos às temperaturas amenas das regiões do litoral expostas ao efeito termorregulador do Atlântico, ou às temperaturas primaveris, do Arquipélago da Madeira e até mesmo dos Açores. Janeiro é também um mês no qual existe a possibilidade de ocorrer queda de neve com mais frequência e intensidade, mas nem sempre é assim.
Em janeiro, as temperaturas são ligeiramente mais baixas do que em dezembro de norte a sul do território de Portugal continental. As geadas noturnas são frequentes em vastas zonas do interior e nas montanhas. As temperaturas máximas mais amenas do Continente concentram-se na Península de Setúbal, em Leiria e no Algarve, com valores entre 15 ºC e 16 ºC.
É o quarto mês mais chuvoso do ano à escala do Continente
Janeiro tem tendência para ser influenciado meteorologicamente por calmas anticiclónicas (tempo seco, frio e soalheiro) ou pelo fluxo zonal (tempo húmido, chuvoso e instável, repleto de frentes, depressões e às vezes rios atmosféricos). É o quarto mês mais chuvoso do ano em Portugal continental de acordo com a normal climatológica 1981-2010, ficando apenas atrás dos meses de dezembro, novembro e outubro, com uma média mensal de precipitação de 104,2 mm.
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A precipitação média mensal ultrapassa os 150 mm no Minho e em Viseu, registando valores entre 100 e 150 mm no Douro Litoral, Vila Real e nas Regiões de Aveiro, Coimbra e Leiria. No extremo oposto encontram-se as regiões do Alentejo Central, Baixo Alentejo e Algarve, todas com uma média mensal de precipitação inferior a 70 mm.
Previsão das temperaturas: é esperada uma vaga de frio em Portugal?
Segundo as últimas previsões do nosso modelo de referência, são esperadas temperaturas 1 a 3 ºC acima da média climatológica durante a primeira semana de janeiro em praticamente todo o país.
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Contudo, o panorama poderá alterar-se entre 8 e 15 de janeiro, com a configuração de uma crista atlântica que poderia empurrar ar polar e ártico sobre o continente europeu, o que produziria temperaturas bastante baixas. Em Portugal continental e nos Açores, as temperaturas ficariam dentro do normal nalgumas regiões (Centro e Sul), ainda que no Norte e parte do Centro do Continente se possa registar anomalia térmica negativa - isto é - mais frio do que o habitual. Na Madeira as temperaturas continuarão mais elevadas do que o normal.
Se a mais recente atualização dos modelos se concretizar, parece que esta situação de frio será de curta duração, dado que para a segunda quinzena se vislumbram valores de temperatura acima da média em todo o território, com anomalias positivas de 1 a 3 ºC, tanto em Portugal continental, como nos Açores e na Madeira. Nalgumas regiões e países da Europa tudo indica que janeiro será um mês muito frio. Por enquanto parece que Portugal continental apenas deverá estar exposto a uma possível vaga de frio na semana de 8 a 15 de janeiro, mas não em todas as regiões.
Será que vai chover de forma abundante nas próximas semanas? Haverá queda de neve?
As últimas previsões indicam que as frentes e as depressões deslocaram-se ligeiramente para latitudes mais meridionais nesta primeira semana de janeiro, que será mais húmida do que o normal de norte a sul de Portugal continental, inclusive no Alentejo e no Algarve - regiões que carecem de bastante água e que ainda estão a sofrer de seca. A Madeira e os Açores também deverão registar níveis de chuva acima da média.
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Na semana de 8 a 15, as frentes e os centros de baixas pressões poderão rondar a nossa geografia, produzindo precipitação acima da média nas regiões a sul do Mondego (mas também em zonas da Beira Alta), nos Açores e na Madeira. A norte do Mondego o mapa não revela anomalias significativas. Assim, com este cenário, a queda de neve provavelmente será inexistente ou residual, dado que o vento de Nor-Nordeste poderá ser dominante.
Na segunda quinzena, tudo aponta para um regresso do fluxo zonal, o que resultaria novamente num panorama de chuva acima do normal de norte a sul de Portugal continental, Madeira e Açores. Do ponto de vista pluviométrico, se estas previsões se concretizarem, janeiro de 2024 constitui assim um mês com boas perspectivas para sanar a seca meteorológica de zonas alentejanas e algarvias e reforçar o armazenamento de água em barragens e albufeiras.
Quais poderiam ser as consequências do próximo aquecimento súbito da estratosfera?
Nos últimos tempos têm sido discutidas no seio da comunidade científica as possíveis consequências de um iminente e poderoso aquecimento súbito da estratosfera (SSW), que poderia provocar a rutura do vórtice polar e cujos efeitos se podem fazer sentir mais ou menos a partir de meados de janeiro. O vórtice polar desestabiliza-se e pode variar em latitude ou mesmo dividir-se em duas partes (bilocação).
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Neste caso, o ar muito frio confinado no Ártico pode ser libertado para latitudes mais baixas. No entanto, um aquecimento súbito da estratosfera não implica automaticamente a chegada de uma vaga de frio a Portugal continental. Os efeitos do atual terão de ser observados, mas muitos não produzem alterações significativas no nível do jato polar na troposfera, e o ar frio pode ser libertado em qualquer ponto do hemisfério norte. Este fenómeno acrescenta mais um fator de incerteza às previsões para janeiro.