Denise também não traz esta chuva: rio de humidade inunda Norte de Portugal
O estado do tempo agravou-se esta terça-feira no Norte de Portugal continental, mas não por causa da Depressão Denise. Já há registo de inúmeras inundações na Região Norte. Afinal, porque está a chover tanto? Contamos-lhe aqui!
Desde o passado domingo (20) que o fluxo zonal de oeste voltou a “instalar-se” em Portugal continental graças à descida em latitude do jato polar. Esta configuração atmosférica permite que mais frentes, associadas a depressões nascidas no oceano Atlântico, atinjam a latitude do Sudoeste da Europa, onde o nosso país se situa. Ontem a depressão Denise, a quarta tempestade de alto impacto da temporada 2022/2023, foi nomeada pelo Serviço Meteorológico Espanhol (AEMET).
Contudo, Denise não terá qualquer efeito prático, do ponto de vista meteorológico, em Portugal continental. Ainda assim, o nosso país tem vivido umas horas muito chuvosas, marcadas também pela queda de neve nos pontos mais elevados da geografia, pelas fortes rajadas de vento (tanto no litoral, como no interior) e pela agitação marítima. Afinal, que mecanismo atmosférico está por detrás de toda esta instabilidade meteorológica?
O que é um rio de humidade?
Tal como explicado pela NOAA, rios de humidade ou “atmospheric rivers”, são faixas extremamente longas e estreitas na atmosfera, semelhantes a rios no céu, que transportam a maior parte do vapor de água (cerca de 90%) nas camadas mais baixas da atmosfera, das regiões subtropicais para as regiões a norte, as chamadas latitudes médias.
Estas pouco profundas, estreitas, mas muito compridas “línguas” de vapor de água deslocam-se em conformidade com a circulação geral da atmosfera, transportando grandes quantidades de vapor de água (como a que está a chegar até Portugal continental procedente do Estado da Flórida, EUA) e, quando atingem terra, geralmente precipitam-no sob a forma de chuva ou neve.
Costumam ser o “combustível” de episódios de chuva persistente nas latitudes médias. Por vezes, as situações extremas de “atmospheric rivers” são responsáveis por cheias, inundações e deslizamentos de terra por causa da maciça quantidade de vapor de água que arrastam consigo. Imagine-se, figurativamente, que é como um rio a desaguar sobre as nossas cabeças.
Em países com costa ocidental, tais como Portugal, Espanha, França, Reino Unido e Noruega, estes fenómenos hidrológicos extremos geram grandes repercussões à escala local. Todavia, a sua influência pode mesmo chegar até regiões continentais, mais interiores.
De onde vem o rio de humidade e porque reforça o potencial de precipitação?
Sucessivas frentes atlânticas têm regado abundantemente o Norte e Centro de Portugal continental nos últimos dias. Mas o destaque vai, sobretudo, para o dia de hoje, 22 de novembro, e em particular para a Região Norte. Esta terça-feira, consideravelmente mais húmida e chuvosa, tem sido dominada por uma densa nebulosidade e pela visibilidade reduzida e embaciada, por causa da presença do dito conteúdo de vapor de água.
Numa estreita ligação, quase umbilical, o rio de humidade (ou atmosférico) e a frente atlântica têm-se alimentado mutuamente, com a precipitação gerada a ser descarregada sobre Portugal continental via Minho.
Mas também o Douro Litoral e a Região de Aveiro, bem como pontos do Alto Tâmega, Douro, Viseu Dão-Lafões e a área da Serra da Estrela foram abundantemente regadas nas últimas horas. Inclusive, de acordo com a Autoridade Nacional de Emergência e Proteção Civil (ANPC) já houve inundações em vários distritos nortenhos, tais como Viana do Castelo, Braga e Porto.
Esta situação meteorológica observa-se, na perfeição, no tweet acima, que mostra o canal visível da imagem de satélite, o trajeto da frente atlântica e do rio de humidade, a colossal massa de nuvens e os locais onde a chuva tem sido despejada com “fartura”.
Previsão de chuva abundante até quinta-feira
Esta enorme estrutura nebulosa não acontece por acaso, por trás dela está ar subtropical carregado de humidade. Neste caso, a linha de instabilidade chegou até ao nosso país desde a Flórida, sustentada pelo dito rio de humidade. Embora esteja muito distante e tal como já foi referido acima, a configuração destas estruturas origina, normalmente, eventos de chuva persistente e intensa como os que iremos viver durante esta quarta (23) e, sobretudo, quinta (24).
Com base no nosso modelo de referência, o ECMWF, estão previstas acumulações de precipitação superiores a 100 mm até ao final de quinta-feira (24) nas regiões do Minho, Douro Litoral, Aveiro, partes do Alto Tâmega e Douro, Viseu Dão-Lafões e Serra da Estrela. Assim, a chuva será mais expressiva e abundante no noroeste de Portugal continental, na área da Serra da Estrela e também nas áreas expostas aos ventos de Oeste.
Expandir-se-á para outras regiões a Sul do Tejo, mas em muito menor quantidade, devido ao efeito de barreira orográfica exercido pelo sistema montanhoso Montejunto-Estrela que retém grande parte do “bolo” de nuvens e chuva, e praticamente impede a chegada de precipitação ao Alentejo e ao Algarve.