Amanhã começa uma temporada de furacões “hiperativa” segundo a NOAA: poderão chegar a Portugal? Há precedentes?
Falta apenas um dia para o início oficial da temporada de furacões do Atlântico Norte e as últimas previsões da NOAA prometem uma temporada de 2024 hiperativa. Poderão os furacões chegar a Portugal? Analisamos aqui os precedentes.
A temporada de furacões do Atlântico Norte de 2024 está prestes a arrancar: começa amanhã, dia 1 de junho e terminará no dia 30 de novembro. Há alguns dias o Centro de Previsão Climática (CPC) da Administração Nacional Oceânica e Atmosférica (NOAA) divulgou a sua previsão oficial pré-temporada.
De acordo com a previsão da NOAA, há 85% de probabilidade de uma temporada de furacões mais intensa que o normal em 2024, contra 10% de hipótese de uma temporada perto do normal e apenas 5% de probabilidade de uma temporada menos ativa que o normal.
É esperada a formação de 17 a 25 tempestades nomeadas, que consistem em sistemas tropicais (tempestades ou furacões) que atingem ventos de 62 km/h ou mais. Das tempestades nomeadas, entre 8 e 13 poderão transformar-se em furacões, com vento acima de 119 km/h, incluindo 4 a 7 furacões de categoria intensa (“major”, em inglês), que são aqueles com vento superior a 178 km/h e classificados como categoria 3, 4 ou 5.
A NOAA também já divulgou a lista de 21 nomes das tempestades deste ano. A primeira tempestade será nomeada Alberto e a última receberá o nome William.
Porque se prevê que a temporada de furacões de 2024 seja mais ativa do que o normal?
Segundo a NOAA, os principais fatores por detrás da previsão de uma temporada de furacões mais ativa que o normal em 2024 são as temperaturas bastante elevadas (recorde) no oceano Atlântico Tropical e o desenvolvimento do La Niña na segunda metade do ano de 2024.
As águas quentes do oceano Atlântico Tropical agem como um combustível para a formação e desenvolvimento de toda a convecção profunda dos sistemas tropicais, dado que as águas quentes fornecem calor e humidade para a atmosfera, elementos fundamentais para o desenvolvimento de nuvens de tempestade.
Deste modo, com um Atlântico bem mais quente que o habitual, a disponibilidade de calor e humidade será ainda maior para a potencial formação de sistemas destes nesta temporada de 2024. Além do calor e da humidade, o cisalhamento do vento é um dos elementos fulcrais para uma temporada de furacões com maior ou menor atividade.
É nesta parte do cisalhamento do vento que o La Ninã aplica o seu poder! Quando o La Ninã está ativo, os ventos ficam mais fracos nas camadas mais altas da atmosfera - são geralmente bem mais fortes que os ventos nas camadas baixas - sobre o Atlântico Norte. A diferença vertical de ventos é reduzida, ou melhor dizendo, o cisalhamento do vento é reduzido.
Concluindo: as águas mais quentes do que o normal do Atlântico, combinadas com uma atmosfera com reduzido cisalhamento do vento já constituem o potencial de uma temporada de furacões ativa. No entanto, esse potencial ainda fica maior se lhe juntarmos o La Niña que já deverá estar ativo quando ocorrer o pico da temporada de furacões do Atlântico Norte. Normalmente esse pico dá-se durante os meses de setembro e outubro.
Furacões em Portugal num passado recente
A chegada de furacões procedentes do Atlântico a Portugal não é um acontecimento muito frequente, mas tampouco é inédito e a sua ocorrência não é assim tão rara. Quando nos referimos a Portugal, referimo-nos às suas três unidades territoriais: o Continente, os Açores e a Madeira.
De acordo com os dados oficiais, passíveis de consulta na base de dados da NOAA, desde 2018 até agora Portugal já foi atingido por vários ciclones tropicais: 10, para ser mais exato, seja por depressões (a sua forma menos intensa), tempestades, ou furacões (a forma mais intensa e potencialmente perigosa).
Segundo esclarecimentos prestados pelo INEM na altura, afortunadamente não houve mortes. Porém, os prejuízos materiais foram imensos: segundo o Diário de Notícias, centenas de habitações ficaram destruídas, assim como infraestruturas de telecomunicações e abastecimento de luz, equipamentos municipais, habitações particulares, parques de campismo, associações, coletividades e instituições do setor social, viveiros e campos agrícolas, entre outros. Também houve dezenas de desalojados.
Alguns distritos da Região Centro foram os mais afetados por Leslie, tais como Aveiro, Coimbra, Viseu e Leiria, mas também a Área Metropolitana de Lisboa.
Ciclones tropicais mais violentos em Portugal desde 2018 | Regiões afetadas | Ciclo de 'vida' dos ciclones |
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Gaston | Açores | 19-27 setembro 2022 |
Danielle | Norte | 31 agosto-15 setembro 2022 |
Wanda | 214 km a nordeste de Lagoa, Açores | 25 outubro-8 novembro 2021 |
Theta | Madeira | 8-16 novembro 2020 |
Alpha | Madeira, Algarve, Lisboa e Centro | 14-19 setembro 2020 |
Paulette | Açores e Madeira | 7-28 setembro 2020 |
Rebekah | Açores | 27 outubro-1 novembro 2019 |
Pablo | 140 km a sudoeste de Furnas, Açores | 23-29 outubro 2019 |
Lorenzo | 206 km a nordeste de Lagoa, Açores | 22 setembro-4 outubro 2019 |
Leslie | Norte, Centro e Lisboa | 29 setembro-13 outubro 2018 |
Fonte: adaptado de dadosmundiais.com e NOAA |
Um dos outros furacões mais mediáticos teve lugar logo no ano seguinte - Furacão Lorenzo - e foi imensamente devastador no arquipélago dos Açores, em particular na ilha das Flores. Várias infraestruturas das ilhas ficaram total ou parcialmente destruídas pela passagem de Lorenzo e ainda hoje não recuperaram totalmente dos seus efeitos nefastos (330 milhões de euros de prejuízos!). Este evento ciclónico destrutivo de origem atlântica tocou terras lusas, mais uma vez num mês de outubro, mais concretamente no dia 2 de outubro de 2019.
Um ano mais tarde, em 2020, foi a vez da tempestade subtropical Alpha surgir sob as luzes dos holofotes mediáticos ao protagonizar um espetacular “landfall” em território português, mais concretamente Monte Real (Leiria). Atingiu Setúbal no dia 18 de setembro, produzindo chuva forte, um tornado e agitação marítima intensa.
Por último, não esquecer o furacão Danielle cujos “restos” atingiram a geografia do Continente, embora já não com a mesma intensidade com que se formou no Atlântico.
Este ciclone teve a particularidade de confundir e surpreender os meteorologistas e especialistas em clima ao desafiar e modificar completamente as previsões iniciais. Pensava-se que Danielle iria para oeste, contudo o furacão protagonizou um volte-face na sua trajetória e rumou para leste em direção à Península Ibérica onde ainda deixou bastante chuva.
Da mesma forma que um ciclone tropical pode extratropicalizar e transformar-se numa tempestade de latitudes médias, uma tempestade também pode fazer o que é conhecido como transição tropical e desenvolver-se como ciclone tropical, derivando numa tempestade subtropical, tropical ou até mesmo num furacão e foi algo semelhante a isto que aconteceu ao que ficou conhecido como “ex-furacão Danielle”.
E em 2024, como poderá ser em Portugal?
Tendo em conta o histórico climático de furacões do passado recente (2018-atualidade) no nosso país e a previsão da NOAA que insiste numa temporada ‘hiperativa’ devido aos fatores anteriormente mencionados, a probabilidade de algum sistema tropical atingir Portugal é bastante razoável.
De acordo com o Centro Nacional de Informações Ambientais da NOAA (NCEI), “os furacões ocorrem ocasionalmente em Portugal. Em média, acontecem cerca de 2 vezes por ano. Muitas vezes, porém, os furacões não atingem Portugal em terra firme, mas desviam-se antes. (...) Causam rajadas de vento e chuva em terra. As regiões mais afetadas são os Açores, a Madeira e o Norte.”
As atuais previsões do Centro Nacional de Furacões dos EUA (NHC) não detetam, para os próximos sete dias qualquer perturbação atmosférica, pelo que a primeira semana de junho estará livre de ciclones no Atlântico e portanto, também Portugal o estará.
Aqui na Meteored estaremos a monitorizar o eventual aparecimento de furacões ou tempestades tropicais em terras lusas e, caso necessário, informá-lo-emos atempadamente. Mantenha-se atento!