Uma lua perdida pode ter originado os anéis de Saturno
Os investigadores dizem que a perda de uma lua grande poderá ajudar a explicar tanto a origem dos anéis de Saturno, como a inclinação invulgar do planeta. Saiba mais aqui!
Os anéis de Saturno são encantadores de se ver, mas uma dor de cabeça colossal para explicar. Agora, os cientistas planetários chegaram a uma nova teoria sobre a sua origem. Há cerca de 160 milhões de anos, afirmam, uma lua gelada foi rasgada quando a sua órbita a aproximou demasiado do planeta. A lua perdida, a que chamam Chrysalis, pode também ajudar a explicar a evolução do eixo de rotação estranhamente inclinado de Saturno.
Outros investigadores estão intrigados, mas não convencidos. A descoberta "abre uma nova janela sobre a origem dos anéis de Saturno", diz Maryame El Moutamid, uma cientista da Universidade de Cornell, que escreveu um artigo no qual explica o seu significado. Luke Dones, outro cientista do Instituto de Investigação do Sudoeste, diz que o estudo é "inteligente", mas também tem algumas reservas sobre ele.
Saturno e os seus anéis
Os cientistas há muito que debatem se os anéis de Saturno têm biliões de anos - como o Sistema Solar - ou talvez apenas 100 milhões de anos. Os dados da nave espacial Cassini da NASA, que deixou de operar em 2017 após ter avaliado a abertura entre os anéis e o topo das nuvens de Saturno, trouxeram um forte argumento a favor da versão mais recente.
A nave encontrou os anéis menos maciços do que anteriormente se pensava, e expostos a uma chuva de poeira fuliginosa do Sistema Solar mais forte do que se esperava, o que tenderia a escurecê-los com o tempo. "Juntas, estas descobertas sugerem que os anéis de gelo-água relativamente primitivos devem ser jovens", afirmou Jack Wisdom, um cientista do Massachusetts Institute of Technology (MIT).
Contudo, explicar o que criou os anéis continua a ser um desafio - especialmente algo tão tardio na história do Sistema Solar, quando a hipótese de um grande cometa impactar o planeta ou estilhaçar uma lua seria baixa.
A inclinação do planeta
Inicialmente, Wisdom e os seus colegas concentraram-se noutra aspeto estranho em Saturno: a surpreendente inclinação de 27° do seu eixo de centrifugação. Isto porque um planeta sem inclinação não teria estações e rodaria em torno de um eixo perfeitamente perpendicular ao plano em que orbita o Sol.
Quando Saturno coalesceu de um disco giratório de gás e poeira logo após o nascimento do Sistema Solar, deveria ter acabado com uma pequena inclinação, tal como Júpiter, o outro gigante de gás do nosso Sistema Solar. "Embora o Sistema Solar estivesse cheio de protoplanetas na altura, seria necessário um impacto com algo tão grande como Urano para derrubar Saturno", disse Wisdom.
Wisdom e os seus colegas acreditam que Saturno adquiriu a sua inclinação devido a uma sincronicidade peculiar: a precessão do seu eixo de rotação - a forma como oscila a um ritmo particular - estaria suspeitosamente em sintonia com uma precessão na órbita de Neptuno.
Se Saturno e Neptuno ficassem presos nesta ressonância, a inclinação de Saturno seria "um pouco vulnerável a outras forças que poderiam causar a sua mudança", diz Rola Dbouk, uma estudante do MIT em Ciências Planetárias.
Em 2020, os cientistas da Cassini descobriram o que a equipa do estudo pensa ser esse estímulo externo: Titã, a maior lua de Saturno, está a afastar-se de Saturno cerca de 11 centímetros por ano. Num estudo publicado na revista Science, Dbouk, Wisdom e colegas mostram como a migração de Titã, em combinação com a ressonância Saturno-Neptuno, poderia ter feito subir a inclinação de Saturno ao longo de 1 bilião de anos.
A origem dos anéis
Este estudo também deu uma explicação possível para a origem dos anéis de Saturno. Utilizando as medições de Saturno dos campos gravitacionais de Cassini para modelar a estrutura interior do planeta, os investigadores aprimoraram os cálculos para a oscilação do eixo de rotação de Saturno e descobriram que já não está em sincronia com Neptuno. "Algo o expulsou da ressonância", diz Dbouk.
Primeiro excluíram a possibilidade de mudanças caóticas nas órbitas de algumas das maiores dezenas de luas de Saturno poderem ser responsáveis. Mas quando acrescentaram outra lua à mistura, as coisas tornaram-se interessantes.
Em várias simulações, os investigadores incluíram um objeto (Chrysalis) do tamanho de Iapetus, a terceira maior lua de Saturno, em órbita entre as órbitas de Titã e Iapetus. Descobriram que esta lua poderia ter dado o empurrão necessário à ressonância se de repente tivesse sido derrubada da sua órbita, devido a interações caóticas com os seus vizinhos há cerca de 160 milhões de anos.
A equipa realizou 390 simulações totais deste evento. Nalgumas, a lua perdida colidiu com Titã ou Iapetus; noutras, foi ejetada do sistema de Saturno no seu conjunto. Contudo, em 17 das simulações, a lua raspou Saturno, onde poderia ter sido retalhada por forças gravitacionais, acabando por se tornar nos anéis icónicos.
"Pensámos que 17 vezes foi o suficiente para acreditarmos que isto poderá mesmo ter acontecido", diz Dbouk. Para El Moutamid, ainda é uma "série de acontecimentos improváveis". Ela espera que outros investigadores modelem a dinâmica deste possível evento com mais detalhe.