Um projeto criou novos “óculos inteligentes” alimentados por IA para melhorar a mobilidade das pessoas cegas
Um novo sistema de apoio visual pode interpretar informações do exterior e guiar pessoas cegas utilizando comandos de voz e estímulos cutâneos. Saiba mais aqui!

Encontrar soluções para ajudar as pessoas cegas na sua vida quotidiana é um objetivo perseguido por várias equipas de investigação em todo o mundo. Alguns destes grupos estão a explorar métodos para tentar restaurar, pelo menos em parte, a visão perdida.
Outros estão a tentar encontrar formas de compensar essa falta de visão convertendo a informação do ambiente em mensagens para outros sentidos que não a visão, para guiar as pessoas afetadas pela cegueira no mundo em que vivem.
A revista Nature Machine Intelligence publicou pormenores de um dispositivo que, seguindo esta segunda linha de investigação, pode guiar pessoas cegas em torno de qualquer obstáculo no seu caminho.
O dispositivo que pode ajudar as pessoas com cegueira
O dispositivo, que a pessoa pode usar como se fosse um simples par de óculos, pode, graças a algoritmos de inteligência artificial, interpretar informações do exterior e guiar o utilizador através de comandos de voz e estímulos cutâneos para evitar que tropece em qualquer objeto.
Concretamente, o dispositivo, desenvolvido por investigadores da Universidade Shanghai Jiao Tong, em Xangai (China), converte os dados de imagem captados por uma câmara incorporada no dispositivo em indicações auditivas que chegam ao utilizador através de auscultadores e vibrações que orientam a sua direção e movimentos através de uma pele artificial colocada no pulso.

Os cientistas, liderados por Leilei Gu, começaram por testar a utilidade do dispositivo em robots humanóides com capacidade de locomoção semelhante à humana e, depois, em pessoas que sofrem de perda parcial de visão e de cegueira total. Os investigadores realizaram experiências em diferentes ambientes, tanto virtuais como reais, que tentaram emular situações quotidianas que as pessoas cegas podem encontrar no seu dia a dia.
O dispositivo foi testado em três cenários diferentes
Um deles exigia várias voltas e mudanças de direção. Começaram por realizar as experiências com um grupo de 12 doentes e depois validaram a estratégia com outros oito doentes, todos eles com deficiências visuais graves. Neste caso, os cenários foram montados em ambientes abertos e fechados, com a presença de obstáculos estáticos e móveis e em ambientes que imitavam escritórios e outros ambientes de trabalho.
As experiências mostraram a utilidade do dispositivo. Antes de utilizar os “óculos” desenvolvidos, a grande maioria dos indivíduos estudados tropeçava nos objetos presentes na sala ou não conseguia completar o percurso estabelecido de forma independente. Em contrapartida, com a utilização do dispositivo, todos foram capazes de completar as tarefas assinaladas.
Além disso, à medida que realizavam as experiências, a sua capacidade de deambulação, de acordo com as instruções do dispositivo, melhorava, de modo que concluíam as tarefas pré-determinadas de forma mais rápida e eficiente. Os indivíduos que participaram no estudo avaliaram positivamente a facilidade de utilização do dispositivo.
Os resultados, segundo os investigadores, sugerem que a integração de componentes de tecnologia tátil e áudio oferece um apoio visual eficaz. Em termos gerais, concluem, “o sistema apresenta-se como um protótipo de investigação promissor, abrindo caminho para futuros avanços na assistência visual vestível”.
Esta pode ser uma das contribuições mais interessantes para as pessoas cegas
Para Manuel Lozano, do grupo de Processamento e Interpretação de Sinais Biomédicos (BIOSPIN) do Instituto de Biotecnologia da Catalunha (IBEC) e professor associado do Departamento de Engenharia de Sistemas, Automação e Informática Industrial da Universitat Politècnica de Catalunya (UPC), o sistema proposto neste estudo tem algumas caraterísticas que, na sua opinião, representam “um desenvolvimento interessante para o avanço dos sistemas de apoio à visão”.
Manuel Lozano
Este grupo de investigação está, também, a explorar a utilização de elétrodos do tipo tatuagem para registar sinais fisiológicos, nomeadamente sinais eletromiográficos para o estudo do bruxismo ou da atividade muscular respiratória.
Quanto às limitações deste trabalho, Lozano destaca "a necessidade de testar o sistema numa amostra maior de utilizadores. Um dos pontos críticos deste tipo de tecnologia é a aceitabilidade e usabilidade por parte dos utilizadores finais. Neste sentido, é importante dispor de dados verificados sobre o nível de aceitação e utilização que o sistema proposto teria numa grande amostra de utilizadores com deficiência visual.
Referência da notícia
Jian Tang, Yi Zhu, Gai Jiang, Lin Xiao, Wei Ren, Yu Zhou, Qinying Gu, Biao Yan, Jiayi Zhang, Hengchang Bi, Xing Wu, Zhiyong Fan & Leilei Gu. Human-centred design and fabrication of a wearable multimodal visual assistance system. Nature Machine Intelligence (2025).