Será o aquecimento global responsável por mais desigualdades sociais?

Até 2030, estima-se que mais pessoas possam ser empurradas para a pobreza devido às alterações climáticas. É expectável também que sejam agravadas as desigualdades entre os países, nas cidades num mesmo país e até entre indivíduos em função do género.

As alterações climáticas irão agravar ainda mais as desigualdades sociais.
As alterações climáticas estão a agravar ainda mais as desigualdades sociais e são responsáveis pela violência de género.

Embora os efeitos das alterações climáticas sejam globais e os impactes sejam projetados para todas as áreas do planeta, diversos estudos sugerem que os riscos climáticos afetam mais os países e pessoas mais pobres, que padecem de maior exposição e vulnerabilidade perante os impactes das alterações climáticas.

Acresce que, até 2030, podem ser empurradas para a pobreza entre 68 e 135 milhões de pessoas a mais por causa das alterações climáticas, segundo dados de um relatório do World Bank de 2020. Isto acarretará uma maior dificuldade em manter a trajetória perante os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS), onde se inscreve a redução das desigualdades entre nações e as sociedades.

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A emissão de gases com efeito de estufa está atualmente fortemente vinculado ao nível de riqueza de um país. Os países mais ricos representam 16% da população mundial e quase 40% das emissões de CO2, e é nos Estados Unidos da América que se encontra a nação que mais contribui para a emissão de gases com efeito de estufa para a atmosfera (emissões acumuladas de 25% do total).

As desigualdades sociais são acentuadas pelas alterações climáticas

Estas desigualdades encontram-se profundamente enraizadas na história dos países, mas têm consequências globais significativas. A vulnerabilidade de um país perante os impactes das alterações climáticas é também determinada pela rapidez com que acede a meios que apoiem a adaptação ao fenómeno.

A título de exemplo, um país que possa construir rapidamente defesas que o protejam do aumento do nível das águas do mar pode estar menos vulnerável do que aquele que não tem acesso nem a recursos económicos nem financeiros que o possibilitem.

Entre países, sistemas, instituições e pessoas há diferenças na rapidez de resposta, associado ao que se designa por capacidade adaptativa. Grosso modo, os países mais desenvolvidos têm maior capacidade adaptativa do que as nações em desenvolvimento.

Todavia, outros fatores podem afetar a vulnerabilidade perante os impactes das alterações climáticas, onde se incluem as condições de cada indivíduo: os salários, a ocupação, a educação ou até o género.

O aumento da violência de género é consequência de fenómenos climáticos extremos

Em alguns países, as mulheres são particularmente desfavorecidas, relacionando-se com fatores intrínsecos à norma social vigente e à estrutura socioeconómica. Nessas situações, pode chegar a ser tão grave que a mulher privada de aceder a recursos, à tomada de decisão ou à informação não tem forma de atuar, nem voz ativa perante os problemas encontrados.

Um estudo recente na revista Nature alerta que em países que tal aconteça será maior a propensão à exposição perante as alterações climáticas.

Numa investigação publicada no The Lancet Planetary Health, foram analisados 41 estudos com revisão por pares e descobriram que a violência baseada no género (designadamente, as agressões sexuais ou o tráfico), durante e após uma catástrofe associada às alterações climáticas, parecem ser um tema recorrente na literatura científica.

Nessa investigação, não ficaram surpreendidos com o aumento da violência de género durante e após os eventos climáticos extremos, mas pelo facto de a violência de género ser compartilhada pela maioria dos contextos analisados (desde o furacão Katrina em Nova Orleães a um período de seca severa na Índia).

Um facto é que a literatura sugere que as mulheres são menos propensas a se adaptar após uma catástrofe natural devido à insegurança financeira e ao apoio institucional mais reduzido.


Esta situação é particularmente incidente em países onde é importante salvaguardar a honra da família, a dignidade e a possibilidade de casamento de uma filha, acarretando uma maior subnotificação e subestimação dos efeitos reais dos eventos extremos na violência de género.

Outras razões poderão tratar-se do medo de se apresentar, as falhas na aplicação da legislação e a normalização da violência.

A resposta é urgente e deve contribuir para melhorar os padrões de vida a nível internacional

Certamente, a mitigação e adaptação às alterações climáticas tem que ser vista como uma condição necessária para melhorar de forma sustentável os padrões de vida em todo o mundo, reduzindo desigualdades a diversos níveis (e.g., de género ou de rendimentos).

É cada vez mais importante ter em conta os efeitos sociais que as alterações climáticas podem trazer. É necessário implementar mais esforços para que todas as desigualdades sejam atenuadas.

Ao nível do planeamento e da justiça ambiental, o esforço para reduzir as emissões de gases com efeito de estufa deve pautar-se por objetivos mais alargados de desenvolvimento, tais como a redução da pobreza e da desigualdade, a criação de empregos dignos, a melhoria da qualidade do ar e a melhoria da saúde pública.