Sabia que existe uma enorme variedade de vírus na sua escova de dentes?

De acordo com um estudo é possível encontrarmos, nas casas de banho, milhares de vírus bacteriófagos, com potencial utilização biomédica na luta contra a resistência aos antibióticos.

Vírus
De acordo com investigadores da Universidade Northwestern, nos Estados Unidos, mais de 600 vírus podem viver nas escovas de dentes usadas e nos chuveiros.

De acordo com um recente estudo publicado na revista The Lancet, a resistência aos antibióticos poderá matar mais de 39 milhões de pessoas diretamente e no próximo quarto de século, tornando-se assim uma das maiores preocupações da medicina.

Contudo, segundo os investigadores a solução para este problema pode estar à espera de ser descoberta na nossa escova de dentes.

A afirmação anterior pode-lhe parecer estranha mas a verdade é que as casas de banho são colonizadas por uma fauna invisível que podem ser grandes aliadas do ser humano. Trata-se de famílias de vírus e bactérias que se contam aos milhões e sobre as quais a ciência ainda não sabe o suficiente.

No seguimento deste tema, um novo estudo publicado recentemente na revista Frontiers in Microbiomes, que analisou chuveiros e escovas de dentes em dezenas de casas de banho dos EUA, encontrou uma coleção de vírus diversificada com uma capacidade única de destruir bactérias.

Desenvolvimento de microbiomas complexos e únicos

As bactérias, vírus, fungos e outros organismos são universos microscópicos moldados pela interação humana e por outros fatores ambientais.

Porém, a maior parte dos esforços científicos para os estudar e compreender têm-se centrado nas bactérias, deixando os vírus para segundo plano.

"É incrível a quantidade de biodiversidade inexplorada que existe à nossa volta. E nem sequer é preciso ir muito longe para a encontrar: está mesmo debaixo do nosso nariz."
Erica Hartman, microbiologista de interiores e professora na Universidade Northwestern.

Para identificar os vírus, Hartmann e a sua equipa recolheram 92 amostras de comunidades de microrganismos fixadas à superfície de chuveiros e 34 amostras de escovas de dentes nos Estados Unidos.

Em seguida, levaram as coleções para o laboratório e utilizaram a sequenciação de ADN para as examinar. Os resultados mostraram que as amostras tinham mais de 600 vírus diferentes e que não havia dois modelos iguais.

"Cada cabeça de chuveiro e escova de dentes é como uma pequena ilha em si mesma. Se também tivéssemos escovas de dentes de Espanha ou de qualquer outra parte do mundo, provavelmente todas elas teriam novos vírus."

Erica Hartman.

Todavia esta cientista estava a tentar encontrar um tipo de vírus que coexiste com as bactérias, podendo ser o seu maior aliado ou o seu pior inimigo, o fagos.

María del Mar Tomás, diretora do grupo de Microbiologia Translacional e Multidisciplinar do Instituto de Investigação Biomédica da Corunha há anos que trabalha com este vírus, são tão abundantes que se pensa que por cada bactéria pode haver pelo menos 10 vírus que coexistem com ela.

Até ao momento a ciência identificou dois tipos de vírus fago. Há os que entram na bactéria e coexistem com ela, podem até fornecer proteínas para a fortalecer, chamados fagos lisogénicos, e há os fagos líticos, que seriam algo como destruidores de bactérias.

Para ganhar a resistência microbiana

A ciência precisa de compreender os dois tipos de vírus se quiser ganhar a batalha contra a resistência microbiana.

Bactérias
Apesar desta descoberta soar ameaçadora, os cientistas afirmam que esses vírus não são capazes de prejudicar os seres humanos.

Precisa assim dos fagos lisogénicos, porque a resistência aos antibióticos é muitas vezes produzida por proteínas que o vírus aporta às bactérias para as tornar mais robustas, e dos fagos líticos para compreender os seus mecanismos predadores que destroem as bactérias para que estas se possam replicar para a saúde humana.

Embora tenham encontrado poucos padrões de repetição entre todas as amostras, Hartmann e a sua equipa notaram mais micobacteriófagos do que outros tipos de fagos.

Os micobacteriófagos infetam micobactérias, uma espécie patogénica que causa doenças como a lepra, a tuberculose e infeções pulmonares crónicas.

Contudo Hartmann espera que, um dia, os investigadores possam aproveitar os micobacteriófagos para tratar estas e outras infeções que já causam problemas atualmente.

"Se abordarmos os micróbios que nos rodeiam com um sentido de admiração e curiosidade, podemos compreender como estas criaturas são espantosas".
De acordo com Hartmann.

Segundo a mesma cientista é altura de dar uma boa publicidade aos micróbios, pois são muito poucas as bactérias que nos fazem adoecer. Muitas delas ajudam-nos a digerir os alimentos ou colocam oxigénio na atmosfera.

Referência da notícia:
Hutellmaier, S., et all. Phage communities in household-related biofilms correlate with bacterial hosts (2024)