Porque é que em mais de 60% destas cidades chove mais que nas zonas rurais circundantes? Cientistas do Texas respondem

Segundo uma investigação à análise global das anomalias da precipitação urbana, são mais de mil as cidades em todo o mundo que reúnem as condições para graves inundações repentinas. Saiba mais aqui!

Inundações extremas
Investigação relata uma análise global das anomalias da precipitação urbana, abrangendo mais de mil cidades em todo o mundo.

Todos nós já estamos familiarizados com a designação ilha de calor urbana, ou seja, quando há uma relação entre a urbanização e a temperatura, nomeadamente a diferença entre a cidade e o campo.

Porém, o que menos é conhecido é o facto da ilha de calor urbana ter uma contrapartida com consequências tão ou mais graves: uma anomalia na precipitação que faz com que chova muito mais na cidade do que nas áreas rurais.

Num estudo, levado a cabo por investigadores da Universidade do Texas em Austin, e publicado na revista Proceedings of the National Academy of Sciences (PNAS), foi analisada a precipitação em 1056 cidades em todo o mundo e descobriu-se que em mais de 60% delas a precipitação era superior à das zonas rurais circundantes.

Segundo os investigadores, esta descoberta pode ter consequências gravíssimas, como inundações repentinas nas zonas urbanas, sobretudo quando aumenta a densidade da área construída.

As grandes florestas de asfalto

O grande problema encontra-se nas grandes extensões de asfalto mal drenadas presentes nas cidades tornando-as assim vulneráveis a fenómenos como as inundações.

Anomalias de precipitação
As anomalias da precipitação anual urbana segundo os continentes e as zonas climáticas. Fonte: Sui, X., et al, (2024)

Este projeto, com financiamento da NASA, analisou dados de precipitação recolhidos por satélites e sistemas de radar de 1056 cidades entre 2001 e 2020.

"Ao comparar os dados com diferentes zonas climáticas, descobrimos que, se o clima local for mais quente e húmido, pode haver uma anomalia de precipitação entre as zonas rurais e urbanas, em comparação com as cidades com climas mais frios e secos".

Xinxin Sui, estudante de doutoramento na Cockrell School of Engineering

Segundo os investigadores a lista de grandes cidades com as maiores diferenças de precipitação inclui Ho Chi Minh City, no Vietname; Kuala Lumpur, na Malásia; Lagos, na Nigéria; e a área metropolitana de Miami-Fort Lauderdale-West Palm Beach.

Já na Europa, na maior parte do norte e centro, as cidades não registam extremos de precipitação mais frequentes e maiores do que as zonas rurais.

No entanto, algumas grandes cidades do sul da Europa, como Milão, Nápoles ou Barcelona, registam anomalias urbanas extremas.

Forte urbanização explica o fenómeno

Segundo Liang Yang, professor da Jackson School, o fator-chave são os edifícios altos, que bloqueiam ou reduzem a velocidade do vento. Isto produz uma convergência de ar em direção ao centro da cidade.

Precipitação extrema
Anomalia da precipitação média anual e extrema nas cidades e nas zonas rurais circundantes para as 49 cidades com mais de um milhão de habitantes. Fonte: Sui, X., et al, (2024)

Este explica que os edifícios reforçam ainda mais esta convergência, abrandando os ventos, o que gera um forte movimento ascendente do ar. Este movimento ascendente promove a condensação do vapor de água e a formação de nuvens, que são as condições críticas para a produção de chuva e precipitação.

No entanto, existem outras cidades em todo o mundo onde se verifica o padrão oposto, como as localizadas em vales e planícies, onde a precipitação é controlada pelas montanhas próximas, como Seattle e Washington nos EUA; Quioto no Japão; ou Jacarta na Indonésia.

A principal conclusão do estudo é que a população de uma região desempenha um papel mais importante na precipitação do que outros fatores ambientais, uma vez que tende a criar zonas urbanas mais densas e mais altas, bem como a provocar mais emissões de gases com efeito de estufa e, por conseguinte, um calor mais pronunciado.

Referência do artigo:

Sui, X., et al, (2024) "Global scale assessment of urban precipitation anomalies."