População e alimentação: um arriscado 'cocktail' climático
Um ótimo climático e uma evolutiva história alimentar têm possibilitado a existência humana no planeta Terra. Todavia, a conjugação de alterações nos padrões climáticos, desapropriados usos dos solos, consumismo exacerbado e sobrepopulação, potenciam perigosos riscos. Saiba mais aqui.
A Terra regista um histórico de cíclicas flutuações climáticas naturais, com variações de temperatura média de superfície entre os 5 e os 10 ⁰C, refletindo-se em períodos de ausência ou domínio de gelo, que se traduz em aumento ou diminuição do nível do mar e intrinsecamente na modelação dos limites costeiros da litosfera. ' Um mundo em constante mudança' - a expressão cada vez mais difundida em todos os meios de comunicação social. Relacionada com as chamadas 'Alterações Climáticas', a abrangência do sentido da expressão caracteriza a evolução do planeta enquanto organismo vivo, porquanto representa a interação permanente da sua constituição interna com a listosfera, integrando a dinâmica criada pelo complexo sistema atmosfera, criosfera, hidrosfera e biosfera .
Considere-se que a geocronologia da Terra conta aproximadamente 4.6 giga anos, num percurso evolutivo que foi moldando as esferas que a compõem, propiciando condições específicas que permitem a existência de vida nas mais diferentes formas. Numa dinâmica adaptativa que busca o equilíbrio, ao longo dos tempos, incontornáveis reorganizações dos padrões climáticos repercutem-se nos ecossistemas, condicionando inerentemente as possibilidades de sobrevivência humana .
Alterações nos regimes de chuvas e nos períodos de variação das temperaturas, associadas a um contínuo crescimento demográfico e a uma desenfreada cultura consumista, impactuam na capacidade de obtenção, na suficiente disponibilidade de alimentos, e por isso, na segurança alimentar. Pressionados para atender à demanda alimentar, os recursos hídricos e terrestres do planeta são explorados numa escala sem precedentes, depreciando que a esse ritmo se está qualitativamente a perder solo, entre 10 e 100 vezes mais rápido do que a sua própria capacidade de formação.
Os 'agronegócios', a desflorestação e as monoculturas
A cronologia de qualquer escalada é, com efeito, problemática. Urge reavaliar os usos da terra, os tipos de agricultura , dissuadir eficazmente os enraizados comportamentos consumistas , e dissuadir, particularmente, o desperdício alimentar , considerando que em todo o planeta, um quarto dos alimentos são tornados lixo .
O galopante ritmo de desflorestação e a incorreta gestão da floresta , quer para a extração de madeira, quer para a chamada agricultura comercial, representa um perigoso problema planetário, uma vez que desencadeiam a desregulação do mecanismo e feito de estufa, considerando a quantidade de gases como metano e óxido nitroso que são emitidos para atmosfera devido a essas explorações . Analogamente, o uso intensivo e inadequado do solo, com monoculturas, como o milho para a produção de etanol, numa valência de estratégia bioenergética, leva à degradação dos solos e à criação de novos desertos.
Atualmente, e com tendência a aumentar, cerca de 38% da superfície do planeta é ocupada pela prática agrícola, 60% da qual dominada por quatro grandes monoculturas: o milho, o arroz, o trigo e a soja . Destaque-se que aproximadamente 75% dos recursos hídricos potáveis são absorvidos pela produção agrícola e pela pecuária. Colateral às práticas agrícolas, é ainda o exponencial uso de fertilizantes e o seu nocivo impacte nos solos e nos aquíferos.
A prática de atividades como drenagem de regiões húmidas (turfeiras) para utilização agrícola, por exemplo, para a plantação de palma cujo fruto é transformado em óleo, o qual pela sua versatilidade, pode ser utilizado desde a indústria química à alimentar, está de tal modo enraizada que representa um volume de negócio mundial de cerca de 60 milhões de toneladas . Quando drenadas, as turfeiras -ecossistemas que armazenam biliões de toneladas de CO₂- libertam esse gás para a atmosfera numa proporção comparativa, cujos efeitos equiparam 10 mil m² a aproximadamente 27 mil litros de gasolina.
Em direção a um ponto de rutura?
Considere-se que a demanda alavanca um cenário em que as atividades agrícolas já exacerbam alterações no clima, afigurando-se um potencial ponto de ruptura entre a capacidade produtiva dos solos de cultivo e a possibilidade de resposta ao sustento alimentar. A intensificação da ocorrência de eventos extremos por efeito de alterações climáticas, como secas, inundações, ondas de frio e/ou de calor e incêndios florestais, aceleram a degradação dos solos e por consequência o risco de escassez e da qualidade dos alimentos, exponenciando assim o seu custo.
Estima-se que em 2050 a população mundial quantifique 9.7 biliões, um crescimento de 2 biliões que tem inerente uma maior demanda produtiva, perigosamente dependente de dietas regidas por modas e de um sistema alimentar desfasado, refém da vulnerabilidade impactada por perturbações climáticas.
Num mecanismo espiral a acompanhar o aumento populacional e o díspar aumento de rendimentos e poder aquisitivo, cresce a procura de alimentos, que por sua vez exige expansão das áreas de cultivo intensivo. É por isso premente mitigar iminentes impactes socioeconómicos e ambientais , não obstante representarem um colossal desafio transversalmente para a ciência, a tecnologia, as políticas públicas, e consumidores . O mote deve visar uma eficaz gestão dos solos, agricultura menos industrializada e com métodos de cultivo variados, num propósito de 'produzir mais com menos recursos naturais', mitigando a antropogenia e assegurando uma pacifica sobrevivência humana.