Os macacos-tití também têm nomes: novo estudo na origem do nosso próprio sistema de comunicação
Um estudo publicado na Science revela que os macacos-tití (Callithrix jacchus) são capazes de usar nomes individuais para identificar membros do grupo, tal como os humanos. Saiba mais aqui!
Um novo estudo publicado na revista Science revela que os titís (Callithrix jacchus), pequenos primatas do Brasil, utilizam nomes para identificar outros membros do grupo, uma capacidade anteriormente conhecida apenas em humanos, delfins, elefantes e papagaios. Através de vocalizações chamadas "phee", os titís conseguem aprender e adaptar sons para chamar especificamente cada indivíduo.
Esta descoberta sugere um paralelo evolutivo entre a comunicação vocal dos titís e a dos humanos, possivelmente influenciado pela necessidade de cooperação na criação das crias.
Titís surpreendem a ciência com uso de nomes individuais
Os macacos-tití (Callithrix jacchus), pequenos primatas originários do Brasil, surpreenderam a comunidade científica, tendo os últimos estudos revelado uma capacidade inédita entre primatas: o uso de nomes individuais para se referirem uns aos outros.
Esta descoberta, publicada recentemente na prestigiada revista Science, coloca os titís no restrito grupo de animais conhecidos por atribuírem nomes, até agora limitado a humanos, elefantes e papagaios. O estudo, realizado por investigadores da Universidade de Jerusalém, pode contribuir com novos indícios sobre as origens do nosso próprio sistema de comunicação e o desenvolvimento do aprendizado vocal.
Estas chamadas são emitidas quando os membros do grupo se encontram separados, facilitando a localização e o contacto entre indivíduos. O que diferencia as chamadas "phee" de outras vocalizações é o facto de terem por base a aprendizagem, algo raro entre os primatas, cujas vocalizações são geralmente inatas e pouco flexíveis.
Neste estudo, os cientistas analisaram as chamadas "phee" de 10 titís mantidos em cativeiro. Em cada experimentação, dois indivíduos eram colocados em recintos adjacentes, separados por uma cortina que impedia o contacto visual.
Ao gravar e analisar as vocalizações emitidas, com o uso de algoritmos de inteligência artificial, os investigadores chegaram à conclusão que as chamadas variavam consoante o destinatário. Mais surpreendente ainda, os titís respondiam consistentemente às chamadas que lhes eram dirigidas, sugerindo que estas funcionam como nomes individuais.
Aprendizagem vocal e criação cooperativa entre titís sugerem novas pistas sobre a evolução dos nomes individuais no reino animal
Para confirmar a hipótese, os investigadores reproduziram as gravações para os próprios animais, observando que os titís reconheciam as vocalizações direcionadas a si e respondiam de acordo. Além disso, verificou-se que os titís de um mesmo grupo familiar usavam vocalizações semelhantes para se referir aos mesmos indivíduos, indicando um componente de aprendizagem social.
Estes resultados reforçam a ideia de que a aprendizagem vocal é fundamental para a criação de nomes individuais, e que este fenómeno pode ser mais comum do que se pensava inicialmente entre espécies altamente sociais.
Uma possível explicação para o desenvolvimento desta capacidade entre os titís está ligada ao seu sistema de reprodução e criação. Os titís são conhecidos por terem sempre gémeos, o que representa uma grande exigência energética para as mães.
Para garantir a sobrevivência das crias, os membros do grupo, incluindo familiares e indivíduos não emparentados, ajudam ativamente na criação, transporte e alimentação dos recém-nascidos, num comportamento conhecido como criação cooperativa.
Uso de nomes como resposta a pressões sociais
Curiosamente, os titís apresentam um desenvolvimento inicial mais lento comparado com outros primatas de tamanho semelhante, o que resulta em crias altriciais, ou seja, nascem pouco desenvolvidas e altamente dependentes dos cuidadores.
Este traço assemelha-se aos humanos, cujos bebés também nascem com cérebros imaturos que necessitam de tempo e interação social para desenvolver capacidades complexas como o controle vocal e a linguagem. Nos humanos, há evidências de que os bebés que produzem vocalizações mais elaboradas recebem mais atenção dos cuidadores, sugerindo uma pressão evolutiva para a aprendizagem vocal precoce.
O estudo propõe, assim, um paralelo interessante evolutivo entre humanos e titís, onde a combinação de crias altriciais e um sistema de criação cooperativa poderia ter impulsionado a necessidade de vocalizações mais flexíveis e aprendidas. Esta hipótese de convergência evolutiva sugere que, embora os humanos e os titís tenham divergido há aproximadamente 40 milhões de anos, ambos desenvolveram independentemente capacidades semelhantes de aprendizagem da fala devido às pressões sociais e reprodutivas comparáveis.
As implicações desta evidência são vastas. Ao expandir o leque de espécies capazes de aprendizagem vocal e uso de nomes, abre-se a porta para novas investigações sobre a evolução da linguagem e da comunicação social. Estudar o comportamento vocal dos titís poderá proporcionar um modelo natural para compreender melhor as origens da linguagem humana e os mecanismos subjacentes.
Em última análise, o estudo sugere que o uso de nomes individuais não é uma característica exclusivamente humana, mas um resultado possível de contextos sociais complexos que exigem uma comunicação precisa e diferenciada.
Referência da notícia:
Oren, G., Shapira, A., Lifshitz, R., Vinepinsky, E., Cohen, R., Fried, T., ... & Omer, D. (2024). Vocal labeling of others by nonhuman primates. Science, 385(6712), 996-1003. DOI:10.1126/science.adp3757