Os cientistas alertam para a presença perigosa de microplásticos no cérebro: como se acumulam e o que podemos fazer?

Cada gole que toma com uma palhinha de plástico não só contribui para a poluição ambiental, como também pode estar a deixar partículas minúsculas no seu corpo, incluindo no seu cérebro.

micro e nanoplásticos; cérebro
Certos nanoplásticos, devido à sua dimensão minúscula e composição química, podem atingir o tecido cerebral. (Imagem criada por IA)

Um estudo recente publicado na revista Nature Medicine revelou provas alarmantes da acumulação de microplásticos em órgãos humanos vitais. Esta revelação surgiu poucos dias antes de o Presidente dos EUA, Donald Trump, ter assinado uma ordem executiva para reverter a proibição das palhinhas de plástico e eliminar as palhinhas de papel.

Partículas omnipresentes

Os microplásticos são partículas de plástico com menos de 5 milímetros de diâmetro. Os chamados nanoplásticos são ainda mais pequenos, medindo menos de um micrómetro (um milésimo de milímetro). Devido à sua pequena dimensão, têm a capacidade de atravessar barreiras biológicas: estima-se que uma pessoa comum possa ingerir dezenas de milhares de partículas de microplástico por ano.

Os microplásticos e os nanoplásticos foram detetados em praticamente todos os ecossistemas do planeta, desde os oceanos até ao ar que respiramos. As suas principais fontes incluem resíduos de plástico no ambiente, como garrafas, palhinhas, sacos e embalagens, que se decompõem em partículas minúsculas ao longo do tempo.

Estima-se que uma pessoa comum possa ingerir dezenas de milhares de partículas de microplástico por ano.

Além disso, as embalagens de alimentos e as garrafas de plástico podem produzir partículas minúsculas ao longo do tempo, contaminando o que consumimos. Mesmo o ar urbano contém microplásticos suspensos em poeiras, o que significa que também os inalamos diariamente.

Como é que entram no corpo?

Os microplásticos podem entrar no nosso corpo através da ingestão de alimentos e água, inalação de partículas transportadas pelo ar e, possivelmente, absorção através da pele. A via mais estudada é a ingestão, uma vez que estes contaminantes foram detetados em água engarrafada e da torneira, em mariscos e peixes que os ingerem do ambiente, no sal de mesa e até em frutas e legumes que podem absorver partículas de plástico através do solo e da água de rega.

Além disso, a utilização de recipientes e utensílios de plástico para armazenar ou aquecer alimentos pode transferir nanopartículas para o que consumimos. A inalação é outra via de exposição. As fibras sintéticas presentes no vestuário, o pó de interiores e as emissões geradas pela fricção dos pneus nas estradas podem libertar partículas minúsculas.

corpo humano; microplásticos
Os microplásticos estão em, praticamente, todo o lado, inclusive dentro do corpo humano. (Imagem criada por IA)

Foram encontrados microplásticos nos pulmões de pessoas vivas, o que sugere que podem alojar-se no sistema respiratório e, em alguns casos, migrar para a corrente sanguínea e atingir outros órgãos.

Embora os efeitos específicos no sistema respiratório ainda estejam a ser estudados, a presença destas partículas nos pulmões suscita preocupações quanto a possíveis reações inflamatórias e problemas respiratórios.

Por último, embora a pele seja uma barreira eficaz, alguns estudos levantaram a possibilidade de os nanoplásticos mais pequenos poderem atravessar a pele, especialmente se houver feridas ou se estiverem presentes em produtos cosméticos, como cremes e esfoliantes.

Impacto no cérebro

A investigação acima referida revelou que certos nanoplásticos, devido à sua dimensão minúscula e composição química, podem atingir o tecido cerebral.

Dados recentes indicam que as concentrações de microplásticos no cérebro podem ser mais elevadas do que noutros órgãos, o que sugere uma acumulação preferencial ou uma capacidade de eliminação reduzida nesta região. Foi proposto que o transporte destas partículas pode ocorrer através da circulação sanguínea ou mesmo por migração ao longo do nervo olfativo a partir da cavidade nasal.

Uma vez que estas partículas atravessam a barreira hemato-encefálica, podem alterar o equilíbrio celular e desencadear respostas adversas. Os principais mecanismos envolvidos incluem danos oxidativos e stress celular, inflamação e ativação do sistema imunitário, bem como possíveis associações com doenças neurodegenerativas como a demência.

Os dados deste estudo indicam que os microplásticos podem gerar um ambiente pró-oxidante no cérebro, promovendo danos nas proteínas, lípidos e ADN neuronal. Esta situação pode comprometer a integridade das células cerebrais, alterar a sinalização neuronal e predispor à morte celular.

A presença de microplásticos no cérebro parece ativar cronicamente as células da microglia, especializadas na resposta imunitária do cérebro, desencadeando uma resposta inflamatória sustentada. A investigação sugere que níveis elevados destas partículas podem aumentar os marcadores de inflamação, o que pode contribuir para a deterioração neuronal progressiva e para a perturbação dos circuitos neuronais essenciais para a memória e a aprendizagem.

Estratégias para reduzir a exposição

Embora o corpo humano disponha de mecanismos naturais de desintoxicação e eliminação de substâncias estranhas, como o sistema linfático e os processos hepáticos e renais, não é claro até que ponto estes podem lidar com os microplásticos. Atualmente, a estratégia mais eficaz consiste em minimizar a exposição.

Com a crescente preocupação com a presença de microplásticos nos alimentos, especialmente no marisco, devemos então deixar de comer peixe e marisco? Definitivamente não. Eles são fontes essenciais de proteínas, ácidos gordos ómega 3 e outros nutrientes fundamentais para a saúde cerebral e cardiovascular.

peixe; plástico
Os peixes maiores tendem a acumular mais microplásticos, pelo que devemos optar pelo consumo de peixes mais pequenos. (Imagem criada por IA)

No entanto, podemos reduzir o consumo de microplásticos provenientes destes produtos. Por exemplo, é aconselhável lavar bem o peixe e remover o trato digestivo e o abdómen antes do consumo, uma vez que estes tecidos acumulam mais microplásticos. Optar por peixes mais pequenos, como a sardinha e a anchova, é outra boa estratégia, uma vez que os peixes maiores tendem a acumular mais poluentes ao longo da cadeia alimentar.

É também importante escolher produtos de origem sustentável e com certificações que privilegiem a saúde dos oceanos, evitar o consumo de mariscos filtradores, como mexilhões e ostras, e preferir embalagens sem plástico.

Em segundo lugar, para minimizar o risco de inalação, recomenda-se a utilização de purificadores de ar de alto desempenho capazes de captar partículas em suspensão no ar, evitar o aquecimento de alimentos ou líquidos em recipientes de plástico e reduzir a utilização de têxteis sintéticos como o poliéster e o nylon. Optar por fibras naturais como o algodão, a lã e a seda pode ser uma alternativa mais segura. É também aconselhável aspirar o pó em vez de varrer e eliminar corretamente os resíduos de plástico.

Referência da notícia

Alexander J. Nihart, Marcus A. Garcia, Eliane El Hayek, Rui Liu, Marian Olewine, Josiah D. Kingston, Eliseo F. Castillo, Rama R. Gullapalli, Tamara Howard, Barry Bleske, Justin Scott, Jorge Gonzalez-Estrella, Jessica M. Gross, Michael Spilde, Natalie L. Adolphi, Daniel F. Gallego, Heather S. Jarrell, Gabrielle Dvorscak, Maria E. Zuluaga-Ruiz, Andrew B. West & Matthew J. Campen. Bioaccumulation of microplastics in decedent human brains. Nature Medicine (2025).