O oceano e o 'romancear' das suas espécies
O planeta, denominado de Terra, apesar de coberto por colossais espelhos de água em cerca de ¾ da sua superfície, tem no oceano um componente fundamental no equilíbrio dos ciclos climáticos que propiciam a existência de vida.
No mecanismo ambiental do planeta, a inferência do sistema da Hidrosfera, particularmente a água em estado líquido é fulcral. Registos geológicos e biológicos asseveram que a intrínseca dinâmica entre a atmosfera e a hidrosfera, regula a temperatura e O₂ dissolvido do oceano. Os oceanos influenciam processos de dimensões micro e macro, vitais para a existência de vida, desempenhando papel determinante no sistema climático da Terra.
A magia do grande oceano que cobre o planeta, alberga um reino com extraordinárias formas de vida, moldadas nas mais variadas e extremas condições. Da panóplia de seres vivos que habita os oceanos, os ecossistemas denominados de recifes de coral representam o mais diverso habitat marinho, comparáveis, pela sua complexidade física e biológica, e pela intrincada especialização e co-evolução das espécies, às imprescindíveis florestas tropicais.
Dos mais antigos e biodiversificados ecossistemas do planeta, estimando-se que a sua recente existência remonte a 250 milhões de anos, os recifes de coral, apesar de parecerem coloridas plantas aquáticas, na realidade são pequenos animais, cuja dimensão pode variar da cabeça de um alfinete a uma bola de basquetebol. Geomorfologicamente, representam estruturas rochosas, resistentes à ação mecânica das ondas e correntes marítimas, uma organização composta por organismos marinhos, animais e vegetais, portadores de esqueleto calcário.
Corais, os mega-construtores
Os corais marinhos formam-se muito lentamente, a um impressionante ritmo de 5 a 25 mm por ano, em águas límpidas, pouco profundas (até 40 m), com um optimum de temperatura entre 20 e 30 ⁰C. Sob um processo de extrema complexidade, elevada interdependência e competição entre os agentes, é uma comunidade simbiótica de microalgas, espécies de corais e outros animais.
Pertencente ao Filo Cinidária, como as medusas e anémonas, os corais são organismos sésseis, pólipos que vivem fixos a um substrato, e que apesar de invertebrados, conseguem formar um esqueleto calcário (como os ossos humanos) ou córneo (como as unhas humanas), que os protege e ajuda a se fixarem no fundo do mar. No interior do corpo do coral, no pólipo, habitam algas microscópicas, tão ínfimas, que cada cm² de tecido de coral pode albergar 2 milhões, fazendo delas a espécie mais abundante nos recifes - as zooxantelas, as produtoras de pigmentos que cromatizam os corais.
No topo do pólipo, existe uma “boca” circundada por tentáculos com ferrões para paralisar e captar presas. Os pólipos fornecem nutrientes (CO₂) e protecção às zooxantelas, e estas, em troca, através da fotossíntese, usam a luz do sol para converter o alimento em O₂ e hidratos de carbono, contribuindo com a energia necessária para o processo de crescimento do esqueleto coralino.
Algumas espécies são hermafroditas, outras gonocóricas, reproduzindo-se ou por germinação, no qual os novos pólipos, os botões, se desenvolvem no corpo dos pólipos mais velhos, ou através da libertação simultânea de massivas quantidades de óvulos e espermatozóides. A desova personifica um dos mais surpreendentes espetáculos de sincronicidade do mundo natural, e ocorre quando numa única noite do ano, correntes marítimas e fase da Lua cirurgicamente se alinham. Em metamorfose, minúsculas criaturas nadadoras, as larvas planulares, estabelecem-se numa superfície e transformam-se em pólipos, dando continuidade ao ciclo de vida.
O coral representa uma janela para o passado
Os recifes de coral são a casa de 25% de toda a fauna marinha. Funcionam como filtro de água, já que se alimentam por essa filtração, como trincheira contra as correntes marítimas e predadores, como barreiras naturais contra tempestades e tsunamis, assim como berçários de peixes, vertebrados aquáticos, protegendo-os enquanto crescem.
A poluição oceânica, a pesca de arrasto, e alterações na temperatura da água decorrente de desequilíbrios no ciclo do carbono, comprometem severamente a capacidade dos corais prosperarem. A relação mutualista das zooxantelas com os corais, dita a sobrevivência dos recifes, sujeitando-os a um processo de branqueamento, quando as zooxantelas morrem, devido a alterações no Ph e temperatura da água, e na incidência de luz.
A extinção dos corais já ocorreu no passado por efeito de reorganizações litosféricas e climáticas. Estima-se que até 2050, 75% dos recifes do coral enfrentarão perigosas ameaças, afetando o futuro de milhões de espécies, e de cerca de meio bilião de pessoas que dependem dos recifes como fonte de alimento. O possível desaparecimento de toda uma panóplia de compostos coralinos utilizados em profilaxias de doenças como o cancro, são uma ameaça para a saúde humana.
À medida que o coral cresce, os seus esqueletos de calcário formam camadas que variam em composição e espessura de acordo com as condições do oceano à época, um tipo de datação semelhante à dos anéis das árvores. Considerando que a longevidade dos recifes de coral pode desenvolver-se por milhares ou milhões de anos, os seus registos anelares revelam à ciência
possibilidade de conhecer a história do clima do planeta. Os corais, são de facto seres muito especiais, que personificam a importância do delicado equilíbrio que rege as dinâmicas do mundo natural!