O mais novo segredo da Terra: como os vulcões verdadeiramente funcionam
Não é todos os dias que aprendemos algo que muda a forma como entendemos o mundo. Recentes descobertas da erupção do vulcão Fagradalsfjall na Islândia vêm mudar o que sabemos sobre como estes fenómenos funcionam. Veja aqui!
A 19 de março de 2021, o vulcão Fagradalsfjall, localizado na Península de Reykjanes, na Islândia entrou em erupção, depois de quase 800 anos em silêncio. A erupção no complexo Fagradalsfjall foi precedida de uma forte agitação tectónica em janeiro de 2020, associada a uma intensa atividade sísmica.
Essa sismicidade anómala permaneceu durante todo o ano de 2020. Durante meses foram sentidos cerca de 50.000 tremores de terra, alguns com magnitude superior a 4 graus na escala de Richter, com o último ciclo de agitação a ser iniciado por um terramoto de magnitude 5,7 na escala de Richter, em 24 de fevereiro de 2021.
Após três semanas de uma intensa atividade sísmica, a deformação da superfície indicou um rifting acompanhado de uma injeção de dique ao longo de falhas nas proximidades do complexo de Fagradalsfjall.
A intrusão magmática atingiu a superfície em 19 de março de 2021, declarando-se assim, oficialmente, a entrada em erupção deste poderoso vulcão. O último episódio eruptivo na Península de Reykjanes ocorrera entre cerca de 700 d.C. e 1.240 d.C. As últimas erupções no complexo de Fagradalsfjall ocorreram há mais de 6.000 anos.
A Islândia é uma ilha vulcânica com aproximadamente 24 milhões de anos, situada a sul do Círculo Polar Ártico, num importante local do ponto de vista tectónico. A sua localização entre duas placas tectónicas, a placa norte-americana, a oeste e a placa euroasiática, a leste, que paulatinamente estão a separar-se a uma velocidade média de cerca de 20 mm por ano, proporciona uma intensa atividade vulcânica.
Localizada a cerca de 40 km da capital Reiqueiavique, a erupção do Fagradalsfjall foi motivo de peregrinação de muitos islandeses que quiseram ver de perto este momento histórico. Estima-se que 350 mil pessoas tenham visitado o local.
Esta foi a mais longa erupção na Islândia em meio século, durando seis meses. Este episódio foi particularmente importante para a comunidade científica, representando uma oportunidade única de estudar o magma que foi libertado.
O que a ciência nos revela
Através do estudo desta erupção, um grupo de cientistas da Universidade da Califórnia liderado por Matthew Jackson, concluiu que ainda nem tudo se sabe como estes fenómenos funcionam. Este estudo foi publicado na revista Nature e vem substituir a visão de mais de 2 séculos de experiências associadas ao conhecimento do magma.
Através da recolha de dados na fase inicial da erupção, os cientistas tinham como principal objetivo perceber a profundidade da origem do magma no manto, o quão abaixo da superfície ele estava armazenado e o que aconteceu no reservatório antes da erupção. Estas são perguntas fundamentais para o estudo dos vulcões.
"A suposição era que uma câmara de magma se enche lentamente ao longo do tempo, e o magma fica bem combinado (...) e então drena ao longo da erupção", aponta Matthew Jackson. Este é o padrão normal de outras erupções até agora conhecidas e documentadas.
O estudo revela que a gama total de composições químicas que foram identificadas no magma, nesta erupção, ao longo do primeiro mês, abrange toda a gama de composições químicas das erupções no sudoeste da Islândia nos últimos 10.000 anos.
Segundo o estudo, o magma libertado nas primeiras semanas da erupção era o esperado. Um tipo de magma “esgotado” que se vinha acumulando no reservatório a aproximadamente 16km de profundidade.
As evidências mostraram algo surpreendente
Porém, as evidências logo mostraram algo surpreendente. As amostras recolhidas em abril revelaram que a câmara magmática estava a ser recarregada por derretimentos mais profundos e mais enriquecidos, com uma composição diferente, provenientes de uma região diferente da pluma do manto.
Este novo magma tinha uma composição química menos modificada, com teor de magnésio mais elevado e uma maior proporção de dióxido de carbono, deixando prever que menos gases desse magma escaparam. Os dados recolhidos em maio mostraram que o fluxo de magma estava cada vez mais enriquecido e profundo.
Estas mudanças rápidas e extremas na composição do magma “nunca foram observadas em tempo quase real”. Segundo Matthew Jackson estas alterações podem não ser raras uma vez que não são comuns as recolhas de magma em fases tão iniciais das erupções, uma vez que estas "são enterradas por fluxos de lava posteriores".
Este estudo revela pela primeira vez um fenómeno que se pensava ser possível, mas que nunca havia sido testemunhado antes. Este é um aviso importante de que a Terra ainda tem segredos por revelar e que a aprendizagem sobre o seu funcionamento é uma constante.