Governo indiano propõe plano para redirecionar a água na Índia
O governo indiano, juntamente com os cientistas, está a preparar um plano para evitar mais inundações catastróficas de que este país é alvo sucessivamente.
Na Índia existem dois mundos: uma parte lida com a grave escassez de água e outra, coincide frequentemente com inundações graves.
Quando estas tragédias duplas ocorrem, os indianos ficam muitas vezes a desejar uma forma de equilibrar as desigualdades, ou seja, transformar o excesso de uma região num bálsamo para a outra.
Desta forma, o governo indiano está prestes a lançar um vasto projeto de engenharia, que se encontrava em construção há mais de 100 anos e que ligará vários rios do subcontinente, transformando os fluxos díspares de bacias hidrográficas vizinhas numa mega rede de água que se estende desde os Himalaias até ao Mar Arábico e à Baía de Bengala.
Na sua totalidade, o Projeto Nacional de Ligações Fluviais permitirá à Agência Nacional de Desenvolvimento da Água da Índia escavar 30 ligações que transferirão anualmente cerca de 200 mil milhões de metros cúbicos de água para todo o país.
O objetivo é ajudar a irrigar dezenas de milhões de hectares de terras agrícolas e reforçar a produção de energia hidroelétrica na Índia. O projeto está avaliado em 168 mil milhões de dólares, e segundo os cientistas é "único na sua grandiosidade incomparável".
Projeto poderá trazer mais consequências do que benefícios
O projeto já está em curso, porém os cientistas e especialistas em política da água, têm dúvidas sobre a base científica do projeto.
Preocupa-os o facto de o governo não ter tido devidamente em conta as potenciais consequências indesejadas da deslocação de uma quantidade tão grande de água.
Segundo a revista Hakai Magazine, novos estudos sugerem que o projeto de interligação de rios ameaça afetar a monção sazonal da Índia.
Um quarto da chuva que a Índia recebe durante a monção anual provém da chamada "precipitação reciclada", água que se evapora da terra num local e cai noutro local sob a forma de chuva.
O desvio de grandes quantidades de água pode interferir com esse processo natural, explica Tejasvi Chauhan, engenheiro hídrico e modelador da biosfera no Instituto Max Planck de Biogeoquímica da Alemanha.
Segundo Chauhan o projeto pode, na verdade, agravar o stress hídrico, fazendo com que a quantidade de chuva que cai em algumas regiões secas diminua até 12%, enquanto aumenta a precipitação noutras regiões.
Tejasvi Chauhan
Para complicar ainda mais o valor do projeto, a investigação mostra que a precipitação está a diminuir nas bacias hidrográficas indianas que se pensa conterem atualmente um excedente de água.
A falta de transparência por parte do governo
Thakkar, parte integrante de um comité nomeado pelo Supremo Tribunal sobre a ligação dos rios, está profundamente preocupado com o projeto de ligação dos rios, sobretudo com a sua falta de transparência.
Este afirma que não lhe foi permitido analisar os dados hidrológicos subjacentes à lógica do plano que define certas bacias hidrográficas como bacias excedentárias e outras como locais com défice de água.
Thakkar
Para além de potencialmente perturbar a distribuição da precipitação em toda a Índia, prevê-se que a ligação inicial do projeto submerja grandes áreas de uma reserva crítica de tigres e mate mais de dois milhões de árvores.
O projeto também irá afetar as populações de gharial (uma família de crocodilos que se alimentam de peixes), abutres e várias outras espécies importantes.
Singh, da agência de água da Índia, diz que o governo está a realizar uma avaliação detalhada do impacto ambiental para cada ligação proposta, com a intenção de preservar os ecossistemas.
Segundo ele, o principal desafio para a implementação do projeto é político, conseguir que os estados indianos cheguem a um consenso sobre a forma como a água será partilhada.
Referência do artigo:
Chauhan, T., Devanand, A., Roxy, M.K. et al. (2023) River interlinking alters land-atmosphere feedback and changes the Indian summer monsoon.