Estarão os micróbios a filtrar a água da praia? Estudo de Stanford mostra a sua vulnerabilidade às alterações climáticas
Os micróbios existentes nas praias filtram substâncias nocivas, mas as alterações climáticas e a subida do nível do mar ameaçam a sua função vital, segundo um estudo.
Os micróbios presentes nas águas subterrâneas sob as nossas praias são verdadeiros heróis invisíveis que desempenham um papel crucial na saúde costeira. Filtram os produtos químicos e o excesso de nutrientes das águas subterrâneas antes de estas chegarem ao mar. Desta forma, protegem as águas costeiras da proliferação de algas nocivas e ajudam a manter um ecossistema marinho saudável.
Comunidades microbianas no subsolo das praias
Uma investigação efetuada na praia de Stinson, na Califórnia, permite conhecer a vida invisível que se encontra sob a superfície da praia:
As comunidades microbianas localizadas nos chamados “estuários subterrâneos” (aquíferos subterrâneos) são responsáveis pela purificação das águas subterrâneas antes de estas chegarem ao oceano.
Estas comunidades incluem uma variedade de micróbios, nomeadamente Proteobacteria, Bacteroidota e o superfilo de Archaea DPANN. A sua função é decompor o excesso de nutrientes, como o azoto, provenientes de fontes naturais, como material vegetal em decomposição ou atividades humanas (escoamento agrícola).
Estabilidade e desafios dos micróbios
O estudo de Stanford foi particularmente exaustivo: os investigadores recolheram amostras do aquífero subterrâneo de Stinson Beach durante duas semanas, tanto na estação das chuvas como na estação seca.
Os seus resultados mostram que a comunidade microbiana permanece relativamente estável, mesmo quando as marés ou as estações mudam. Mas há uma exceção:
Quando ondas fortes, chamadas “sneaker waves” (onda costeira desproporcionalmente grande que às vezes pode aparecer numa sequência de ondas sem aviso prévio), atingem a praia e a água do mar penetra profundamente no aquífero, a composição microbiana altera-se significativamente. Este é um processo a que os investigadores chamam “wave overtopping” ou, em português, galgamento das ondas.
Estes fenómenos representam uma ameaça crescente, uma vez que se tornarão mais frequentes à medida que o nível do mar sobe e as tempestades se tornam mais frequentes. Estes galgamentos de ondas podem perturbar comunidades microbianas sensíveis e prejudicar a sua capacidade de filtrar nutrientes.
As alterações climáticas como ameaça para o ecossistema
Os efeitos das alterações climáticas sobre estes micróbios são preocupantes. As inundações provocadas pelas ondas podem não só reduzir a diversidade microbiana, mas também afetar a capacidade de filtragem de todo o sistema costeiro.
Se os micróbios perderem a sua função de “filtragem”, as substâncias nocivas, como o excesso de nutrientes, poderão entrar livremente no mar, provocando a proliferação de algas e a deterioração da qualidade da água. A longo prazo, isto poderá levar a uma deterioração dramática da saúde das costas e dos habitats marinhos.
Importância para a política de proteção costeira
Este estudo sublinha a necessidade de considerar a comunidade microbiana nos aquíferos costeiros como parte das estratégias de proteção costeira. A proteção e promoção destes ecossistemas é essencial para manter a saúde costeira face às alterações climáticas.
Os investigadores alertam para o facto de a redução da capacidade de filtragem microbiana poder ter consequências graves para as águas costeiras e a vida marinha. Para reforçar a resiliência costeira, os responsáveis pelo planeamento ambiental e os decisores políticos devem incluir estes filtradores ocultos nas suas estratégias de combate às alterações climáticas.
Referências da notícia
Bullington, JA, Langenfeld, K., Phaneuf, JR, Boehm, AB, & Francis, CA (2024). Microbial Community of a Sandy Beach Subterranean Estuary is Spatially Heterogeneous and Impacted by Winter Waves. Environmental Microbiology.
StanfordNews. (2024). Hidden microbes protect coastal waters. Will they do their job as sea levels rise?