Equipa portuguesa descobre bactéria capaz de combater infeções respiratórias graves
Investigadores do ITQB NOVA identificaram microrganismos nas nossas vias respiratórias que inibem doenças como meningite, sépsis, pneumonia, otites ou sinusites. Saiba como a descoberta pode ajudar a combater estas infeções.

O nosso corpo é um verdadeiro viveiro de microrganismos. As estimativas apontam para cerca de 100 triliões de bactérias que formam o microbioma humano. Elas são a primeira e a mais importante linha de defesa para o sistema imunológico criar barreiras contra outras bactérias que invadem o nosso organismo, provocando infeções e outros tipos de patologias. A sua utilidade, no entanto, não se resume somente a combater doenças.
As bactérias benéficas para a nossa saúde são tantas e tão complexas que ainda não sabemos tudo sobre elas. Todos os dias há avanços na microbiologia que nos permitem descobrir novas valências. A mais recente descoberta foi anunciada agora pelos investigadores do Instituto de Tecnologia Química e Biológica (ITQB), da Universidade Nova de Lisboa.
Um trunfo escondido nas vias respiratórias
Um novo estudo, publicado na revista científica Applied and Environmental Microbiology, da Sociedade Americana de Microbiologia, sugere que algumas bactérias a viver no nosso trato respiratório superior - nasofaringe e orofaringe – são o melhor trunfo que temos para combater uma série de infeções, desde otites e sinusites até doenças mais graves, como meningite, sépsis e pneumonia.

Os microrganismos encontrados nas regiões logo atrás da cavidade nasal e da boca são particularmente eficazes a inibir a maioria das variantes de S. pneumoniae, também conhecidas como pneumococos.
O estudo traz, por isso, novas possibilidades para desenvolver formulações de probióticos, como sprays nasais, com o potencial de reduzir a colonização destas bactérias no nosso trato respiratório.
A investigação poderá ser especialmente útil para as populações mais vulneráveis como é o caso dos idosos, que são os que tendencialmente têm o sistema imunológico mais debilitado.
Também as crianças estão incluídas neste grupo de risco, com mais de 300 mil mortes por ano atribuídas a este agente patogénico, segundo os números citados no comunicado do ITQB.
Uma descoberta intrigante que conduziu a um novo estudo
Os investigadores estavam a estudar a frequência de colonização por S. pneumoniae quando reparam que algumas pessoas não tinham este agente patogénico. Em contrapartida, as suas vias respiratórias superiores estavam colonizadas por bactérias inofensivas, particularmente a Streptococcus oralis e a Streptococcus mitis.

O caso intrigou a equipa do ITQB, levando-os a querer saber se outros micróbios a residir na nasofaringe e orofaringe poderiam limitar a presença de S. pneumoniae. Esse foi o ponto de partida para começar a recolher amostras de bactérias retiradas de 300 crianças e 300 adultos sem pneumococos.
Ou seja, os investigadores concluíram que essas bactérias inofensivas conseguem impedir os agentes patogénicos de se agarrarem à mucosa respiratória e estabelecerem uma colónia resistente ao sistema imunitário e aos antibióticos.
As estirpes de S. oralis e S. mitis foram, como tal, reconhecidas pelos autores do estudo como uma importante defesa do nosso organismo para combater infeções respiratórias. E o melhor de tudo é que conseguem desempenhar esse trabalho sem danificar a restante microbiota.
O verdadeiro poder das estirpes destas bactérias protetoras está na capacidade de produzir moléculas antimicrobianas, toxinas com atividade antipneumocócica, também chamadas de bacteriocinas.
Os investigadores acreditam que, além de agirem contra a maioria das variantes dos pneumococos, é expectável que as bacteriocinas induzam menos resistência que os antibióticos, atuando contra pneumococos, mas preservando a restante microbiota.
As estirpes de S. oralis e S. mitis podem vir a ser, portanto, aproveitadas para criar probióticos capazes de reduzir a colonização por parte dos pneumococos.

O passo seguinte será agora explorar o mecanismo de ação das bacteriocinas com o intuito de avaliar a sua eficácia e segurança em humanos. Mas ainda antes de avançar para esta etapa, a equipa do ITQB já submeteu um pedido de patente provisório que abrange produtos farmacêuticos com estas bactérias ou as suas moléculas inibidoras de pneumococos.
Referência da notícia
João Borralho, Sara Handem, João Lança, Bárbara Ferreira, Catarina Candeias, Adriano O. Henriques, N. Luisa Hiller, Carina Valente & Raquel Sá-Leão. Inhibition of pneumococcal growth and biofilm formation by human isolates of Streptococcus mitis and Streptococcus oralis. Applied and Environmental Microbiology journal.
A bacterial spray to keep respiratory infections away? Instituto de Tecnologia Química e Biológica António Xavier. Universidade Nova de Lisboa.