Cheias no Rio Grande do Sul foram agravadas pelas alterações climáticas, segundo estudo

O estudo da World Weather Attribution revelou que as alterações climáticas tornaram a tragédia no Rio Grande do Sul duas vezes mais provável. Veja mais informações aqui.

inundação, cheia, Porto Alegre, Rio Grande do Sul, Brasil
Inundação em Porto Alegre, no Rio Grande do Sul, em 5 de maio de 2024. Crédito: Ricardo Stuckert/PR.

Continuamos a falar da tragédia climática que aconteceu no estado do Rio Grande do Sul. Um estudo recente realizado pela World Weather Attribution (WWA) divulgou que as alterações climáticas agravaram as cheias que assolaram o estado gaúcho.

A investigação baseou-se na análise de dados meteorológicos e em modelos climáticos que estimam a probabilidade de um evento extremo acontecer com o atual aumento da temperatura da Terra de 1,2 ºC; e também sob as condições existentes no período pré-industrial.

Em apenas 11 dias (de 24 de abril a 4 de maio), choveu mais de 420 milímetros no Rio Grande do Sul, que teve mais de 90% do seu território afetado pelas inundações, uma área equivalente ao Reino Unido, afirma o estudo.

Mas não foi culpa só das alterações climáticas. O estudo afirma que o fenómeno El Niño e falhas de infraestrutura também foram responsáveis pelas cheias no estado. Uma observação do estudo foi que a maioria dos eventos anteriores de chuvas extremas na região ocorreram durante anos de El Niño.

Segundo a organização, as alterações climáticas dobraram a probabilidade de ocorrência do evento extremo no estado, aumentaram a sua intensidade em 6% a 9%, e também amplificaram o efeito do fenómeno El Niño para que chuvas extraordinariamente intensas ocorressem.

Cruzeiro do Sul, no Rio Grande do Sul, Brasil
A cidade de Cruzeiro do Sul, no Rio Grande do Sul, ficou destruída pelas cheias. Crédito: Nelson Almeida/AFP.

Contudo, os cientistas destacam que tais chuvas poderiam não ter causado tanta devastação na cidade de Porto Alegre se os sistemas de proteção estivessem a operar. O sistema de diques, comportas e bombas da cidade começou a falhar quando o nível do Lago Guaíba chegou a 4,5 metros, sendo que ele foi construído para suportar uma inundação de até 6 metros.

Segundo o estudo, este evento extremo no Rio Grande do Sul foi tão raro e destrutivo que poderia esperar-se que acontecesse uma vez num período de 100 a 250 anos.

“A falha no sistema de proteção teve impacto importante porque permitiu a inundação de áreas que poderiam ter sido poupadas ou não ter sofrido tantos danos. Por exemplo, no centro de Porto Alegre”, comentou Maja Vahlberg, do Centro Climático da Cruz Vermelha e do Crescente Vermelho, na Holanda, uma das autoras do estudo.

Outro destaque da investigação é que a destruição da vegetação nativa e a ocupação das margens dos rios contribuíram para intensificar o potencial destrutivo das chuvas.

Regina Rodrigues, professora na Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) e coautora da investigação, explicou que “a intensidade catastrófica das chuvas está associada às alterações climáticas e ao El Niño, mas a magnitude e a persistência dos seus efeitos foram agravadas pela falta de preparação para eventos climáticos, de qualquer grau. Estas chuvas causariam um desastre, mas ele poderia não ter sido tão grande se houvesse um mínimo de preparação”.

Aquecimento global tende a piorar a situação desses eventos

O estudo também frisa algo que já tem vindo a ser falado. À medida que a temperatura da Terra continua a aumentar, este tipo de evento extremo deverá tornar-se mais comum e intenso.

carros submersos, Porto Alegre, Brasil
Carros destruídos no pátio de um 'rent-a-car' próximo ao Aeroporto Internacional Salgado Filho, em Porto Alegre. Crédito: Rafa Neddermeyer/Agência Brasil.

A probabilidade é que chuvas e inundações catastróficas como esta no Rio Grande do Sul, ou até piores, se tornem duas vezes mais frequentes se a temperatura média do planeta aumentar 2 ºC acima do nível pré-industrial. E é esperado que isso ocorra, se continuarmos neste ritmo atual de emissões de dióxido de carbono (CO2).

Até ao momento, a tragédia climática no Rio Grande do Sul já deixou 172 mortos, 44 pessoas continuam desaparecidas e mais de 575 mil estão desalojadas, segundo o último boletim da Defesa Civil divulgado na manhã desta terça-feira (4).

Referência da notícia:

World Weather Attribution (WWA). “Climate change, El Niño and infrastructure failures behind massive floods in southern Brazil”. 2024.