É um leitor rápido? O cérebro processa os textos muito mais depressa do que se pensava, segundo os investigadores

Este estudo demonstrou que o nosso cérebro consegue apreender o significado geral de um texto sem ter de o ler palavra a palavra; basta um olhar rápido para o cérebro extrair a sua estrutura e essência.

Dispositivos digitais, processamento cerebral.
Com a tecnologia, a leitura atenta e lenta transformou-se num consumo rápido de informação.

Estamos a acelerar num comboio ou num carro e a paisagem passa pela janela. Árvores, casas, pessoas - tudo se mistura num borrão colorido. No entanto, num instante, a nossa atenção é atraída para um pequeno pormenor, como uma borboleta numa flor ou um gato a olhar pela janela. O nosso cérebro tem uma capacidade espantosa de processar imagens. Em apenas 13 milésimos de segundo, consegue identificar objetos, rostos e cenas inteiras - uma capacidade inestimável na era digital em que vivemos.

É igualmente rápido quando se trata de processar texto? Até que ponto podemos realmente compreender uma mensagem numa fração de segundo?

Ao processar a linguagem num relance, o cérebro começa por identificar a estrutura básica da frase, deixando o significado e outros aspetos gramaticais para segundo plano.

Um estudo recente de uma equipa de linguistas e psicólogos da Universidade de Nova Iorque (EUA) concluiu que o cérebro humano consegue captar a sua estrutura linguística essencial em apenas 150 milissegundos, aproximadamente o tempo que demora a pestanejar.

“Os resultados mostram que, quando é apresentada ao cérebro uma frase curta e completa de uma só vez - tal como acontece quando percebemos uma cena visual -, o cérebro consegue captar a estrutura da frase mais rapidamente do que normalmente demora a ouvir uma única sílaba”, disse Liina Pylkkänen, diretora da investigação e professora em Nova Iorque, durante uma entrevista à SINC.

Os sinais no cérebro surgiram em frases com uma estrutura sujeito-verbo-objeto, independentemente de serem gramatical ou semanticamente corretas. Isto sugere que, ao processar a linguagem num relance, o cérebro começa por identificar a estrutura básica da frase, deixando o significado e outros aspetos gramaticais para segundo plano.

Uma competência essencial para os tempos modernos

O advento do correio eletrónico, seguido da ascensão das redes sociais e dos smartphones, transformou a forma como lemos, de uma atividade ponderada e de lazer para um consumo rápido e fragmentado de conteúdos digitais. Este estudo mostra que os nossos cérebros não só processam instintivamente mensagens rápidas, como também podem tomar decisões imediatas com base nelas, como decidir se guardamos ou apagamos um e-mail ou como reagir a uma breve atualização das redes sociais.

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São necessários apenas 130 milissegundos para compreender uma frase curta.

Os cientistas começaram por analisar as teorias atuais da compreensão da linguagem, que propõem modelos de processamento palavra a palavra. No entanto, concluíram que esses modelos não explicam adequadamente a velocidade com que o cérebro processa frases inteiras num relance, em contraste com o processamento mais sequencial da fala.

Para aprofundar este fenómeno, os investigadores realizaram uma série de experiências em que registaram a atividade cerebral de 36 pessoas durante a leitura de frases gramaticais (por exemplo, “os enfermeiros limpam as feridas”) e de listas não estruturadas de substantivos (por exemplo, “corações, pulmões, fígados”).

Os resultados revelaram que o córtex temporal esquerdo, responsável pela compreensão da linguagem, começa a distinguir entre frases simples de três palavras e listas de palavras não estruturadas apenas 130 milissegundos depois de as ver.

O Professor Pylkkanen afirmou: “Esta velocidade sugere que a compreensão rápida de frases pode assemelhar-se à perceção rápida de uma cena visual, em vez do processo mais lento, passo a passo, que associamos à linguagem falada”.

No entanto, ao introduzir uma “mudança sintática” na estrutura - colocando o objeto na posição inicial para formar uma oração relativa (“enfermeiros limpam as feridas”) - o aumento da atividade neural associada à deteção de frases desapareceu.

Isto sugere que a capacidade do cérebro para identificar ultra-rapidamente a estrutura das frases pode estar limitada a sequências de palavras numa ordem canónica ou habitual.

Referência da notícia:

Jacqueline Fallon, Liina Pylkkänen. Language at a glance: how our brains capture linguistic structure from parallel visual information. Science Advances (2024).