É possível viajar no tempo? Um cientista resolve o “paradoxo do avô” com a matemática
Propõem uma solução para o “paradoxo do avô”, sugerindo que a viagem no tempo poderia ser possível sem contradições graças às leis quânticas, à relatividade e à termodinâmica, reenquadrando um dos maiores desafios da física moderna.
Um artigo recente publicado na revista Classical and Quantum Gravity pelo físico Lorenzo Gavassino, da Universidade de Vanderbilt, no Tennessee, propõe uma possível solução para o famoso “paradoxo do avô”, uma das principais barreiras lógicas que desafiam a possibilidade de viajar no tempo.
Apesar de ser apenas uma experiência de pensamento, este paradoxo realça as inconsistências lógicas que as viagens no tempo poderiam gerar no universo. Para as resolver, Stephen Hawking propôs a “conjetura da proteção cronológica”, que sugere que existem leis da física ainda desconhecidas que impediriam essas viagens.
A sua conhecida frase "a melhor prova de que a viagem no tempo não é possível é não sermos invadidos por uma legião de turistas do futuro” ilustra esta ideia. No entanto, Gavassino afirma que, combinando a relatividade geral, a mecânica quântica e a termodinâmica, seria possível viajar para o passado sem gerar contradições.
A natureza do tempo
A nossa perceção quotidiana do tempo baseia-se na física newtoniana, em que os acontecimentos se desenrolam linearmente do passado para o futuro. No entanto, a teoria geral da relatividade de Einstein, publicada em 1915, revolucionou esta perspetiva ao mostrar que os objetos maciços deformam o espaço-tempo, curvando-o de forma semelhante à de uma bola pesada afunda num tecido esticado. Em casos extremos, como os buracos negros, esta curvatura pode fechar-se sobre si própria, permitindo teoricamente a existência de “Curvas Temporais Fechadas” (CTC), trajectórias que poderiam levar um viajante ao passado.
Gavassino afirma no seu artigo que “num universo com Curvas Temporais Fechadas, assume-se frequentemente que as pessoas podem viajar para o passado. Superficialmente, esta parece ser uma implicação óbvia, uma vez que, em grande escala, uma curva de tempo pode ser entendida como a trajetória de uma nave espacial através do espaço-tempo”. Segundo o investigador, o movimento da matéria no universo, que gira sempre em torno de algo, poderia “arrastar” consigo o espaço-tempo.
Embora este efeito seja negligenciável a nível local, Gavassino argumenta que, se todo o universo estivesse a girar, o espaço-tempo poderia deformar-se o suficiente para formar um ciclo temporal.
Entropia e loops temporais
Um dos maiores desafios da viagem no tempo é o paradoxo do avô e outras inconsistências que podem surgir. A maior parte das leis físicas são simétricas em relação ao tempo, mas a segunda lei da termodinâmica, que afirma que a entropia (ou desordem) do universo aumenta sempre, introduz uma direção temporal definida. Por exemplo, podemos fritar um ovo, mas nunca “descongelá-lo”, como o ABC cita como exemplo.
No entanto, num loop temporal, a entropia poderia comportar-se de forma diferente. Gavassino explica que as flutuações quânticas dentro de uma Curva Temporal Fechada poderiam inverter a entropia, eliminando os efeitos do envelhecimento e apagando as memórias do viajante. Segundo a sua investigação, a memória, que pode ser considerada como um registo de acontecimentos passados, perder-se-ia inevitavelmente ao passar por um loop temporal, deixando o viajante no seu ponto de partida com a entropia intacta.
Um princípio de auto-consistência
Este mecanismo funcionaria como uma espécie de proteção universal contra os paradoxos. No caso do paradoxo do avô, o universo ajustar-se-ia para manter a coerência lógica, assegurando que os acontecimentos irreversíveis se anulassem dentro do ciclo temporal. "O aumento da entropia é a razão pela qual envelhecemos e morremos. Mas se invertermos esse processo num ciclo temporal, isso poderia neutralizar acontecimentos contraditórios como matar o avô”, explica Gavassino.
O físico salienta ainda que este princípio de auto-consistência emerge naturalmente das leis quânticas sem necessidade de postulados adicionais. O seu trabalho fornece um quadro teórico rigoroso que suporta a possibilidade de viajar no tempo sem gerar paradoxos. No entanto, permanece uma questão fundamental: será que as Curvas Temporais Fechadas existem de facto no Universo? Muitos físicos acreditam que não, mas a investigação de Gavassino abre novas portas para explorar este domínio fascinante.