Sem necessidade dos polinizadores? Estudo revela adaptação de plantas devido à escassez de insetos
Os investigadores analisaram as flores amores-perfeitos e descobriram que eram mais pequenas e produziam menos néctar do que há 20 ou 30 anos, tornando-se “menos atraentes” para os polinizadores.
Na história da evolução conhecemos relações entre espécies emblemáticas e belas, uma delas é a das flores e dos insetos. As plantas e as suas flores coloridas cheias de néctar e pólen esperam pacientemente pelos seus visitantes alados, que nelas encontram o alimento e o abrigo necessários para continuar a sua jornada após um bom descanso.
Este grande exemplo de cooperação mútua conhecido como polinização, onde os insetos transportam pólen para a reprodução das plantas, pode estar a tomar um rumo inesperado.
Um estudo recente da Universidade de Montpellier, em França, mergulhou no passado e no presente das violetas selvagens (Viola arvensis), também conhecidas como amores-perfeitos, na região de Paris para desvendar a evolução das suas interações com os polinizadores.
“Revivendo” os ancestrais
Numa viagem no tempo, os investigadores utilizaram uma metodologia conhecida como “ecologia da ressurreição”, procedimento que, neste caso, consiste em cultivar sementes armazenadas há vários anos e compará-las com os seus contemporâneos.
Foram analisadas diversas gerações, medindo características como o tamanho e a cor das flores, bem como a quantidade de néctar que estas produzem. O resultado: flores que são 10% menores e que produzem 20% menos néctar do que as flores que cresciam nos mesmos campos há 20 ou 30 anos. Destacaram também que são menos visitadas por insetos.
Síndrome de autopolinização, um círculo vicioso
Além do tamanho e da produção de néctar, o estudo mostrou que as novas gerações de Viola arvensis tinham menos cor e se tornaram “menos atrativas” para os insetos.
Conforme detalhado na publicação, isso mostra a rápida adaptação ao panorama atual, onde há cada vez menos disponibilidade de polinizadores. As violetas selvagens caminham para a autopolinização, para se tornarem autossuficientes e se reproduzirem consigo mesmas, sem depender de insetos.
Samson Acoca-Pidolle, investigador principal do The Guardian.
E embora seja fascinante, segundo a investigação, este é um ponto controverso, porque ocorre num “círculo vicioso”, em que “a diminuição dos polinizadores leva a uma menor produção de néctar pelas flores, o que por sua vez “poderia agravar o declínio destes insetos.”
Evolução em tempo real
A evolução é um processo que leva muito tempo – é uma questão de olhar para o caso do próprio Homo sapiens – porém, as violetas selvagens parecem ser uma “corrida” de rápida adaptação e que acontece em tempo real, diante dos nossos olhos.
“Esta investigação mostra uma planta desfazendo milhares de anos de evolução em resposta a um fenómeno que só existe há 50 anos”, disse Philip Donkersley, especialista em impacto ecológico da Universidade de Lancaster, no Reino Unido, ao The Guardian.
Os investigadores sublinharam a importância de tomar medidas para contrariar este fenómeno o mais rapidamente possível e, assim, salvaguardar as interações entre plantas e polinizadores, que existem há milhões de anos.
Referência da notícia:
Acoca-Pidolle S., Gauthier P., et. al. Ongoing convergent evolution of a selfing syndrome threatens plant–pollinator interactions. New Phytologist (2023).