Corais do Mediterrâneo fornecem indícios do histórico da poluição

O crescimento lento e regular dos corais torna-os um indicador ideal para avaliar a poluição nos mares mediterrânicos.

Os corais mediterrânicos fornecem indícios do histórico de poluição
Os corais do Mediterrâneo estão a albergar partículas de carbono provenientes da queima de combustíveis fósseis. Foto de QUI NGUYEN no Unsplash

Os corais funcionam como um arquivo natural para estudos paleoclimáticos, uma vez que o seu crescimento lento e regular produz dados ambientais úteis que remontam a anos atrás, numa base anual, mensal ou mesmo semanal, à semelhança dos anéis das árvores.

Os corais têm sido utilizados para medir condições climáticas passadas, como a temperatura e a química da água, mas, pela primeira vez, a investigação demonstrou que estes notáveis invertebrados marinhos albergam partículas de carbono provenientes da queima de combustíveis fósseis no seu esqueleto de carbonato de cálcio, cuja presença poderá revelar-se uma ferramenta útil para seguir o histórico da poluição.

A poluição dá uma imagem clara

Os investigadores do Instituto de Acuicultura de Torre de la Sal (IATS-CSIC) recolheram amostras da espécie de coral Cladocora caespitosa em vários locais ao longo de um recife ao largo da costa de Castelló, em Espanha. Esta espécie, a única espécie de coral mediterrânico capaz de formar grandes recifes, cresce a uma média de cerca de 0,3 cm por ano. Os recifes foram estudados durante duas décadas e encontram-se numa reserva marinha protegida a quase 60 km da costa, minimizando assim a probabilidade de contaminação local.

Os investigadores da University College London (UCL) dissolveram os corais em ácido e ficaram com partículas esferoidais de carbono (SCPs) ou cinzas volantes libertadas pela queima de combustíveis fósseis. A análise revelou que os poluentes, que foram ingeridos das águas circundantes e incorporados nos esqueletos dos corais à medida que estes cresciam, eram provavelmente provenientes de centrais elétricas a carvão ou a petróleo.

A presença deste tipo de poluição em depósitos naturais é considerada um indicador da forma como os seres humanos estão a influenciar o ambiente e serve como um marcador histórico do início da época proposta para o Antropoceno.

"A descoberta destes poluentes incrustados em esqueletos de coral prolonga-se por décadas e dá uma imagem clara da extensão da influência humana no ambiente", afirmou a Dra. Lucy Roberts, principal autora do estudo Science of the Total Environment, da UCL Geography. "É a primeira vez que conseguimos ver este tipo de contaminante nos corais e o seu aparecimento nestes depósitos é paralelo à taxa histórica de combustão de combustíveis fósseis na região".

Aumento da industrialização

Os corais registaram um aumento significativo da contaminação por SCP entre 1969 e 1992, o que está relacionado com a rápida industrialização da Europa e com o aumento drástico do consumo de carvão. Estes resultados coincidem com outras medições de contaminação por SCP efetuadas em lagos de montanha em Espanha, apoiando a ideia de que os corais podem servir como arquivos naturais para monitorizar a alteração dos níveis de poluição ao longo do tempo.

Os corais mediterrânicos fornecem indícios do histórico de poluição
O aumento da industrialização na Europa é indicado na análise dos corais. Foto de Chris Leboutillier no Unsplash

Os cientistas acreditam que a presença de SCPs pode ser uma ferramenta útil para marcar o início da época do Antropoceno, uma unidade de tempo geológico que descreve a era mais recente da história da Terra, em que a atividade humana se tornou a principal influência no clima e no ambiente do planeta; esta descoberta nos esqueletos de coral apoia este argumento.

"À medida que se torna mais claro que os seres humanos alteraram o ambiente natural a um nível sem precedentes, estes poluentes atuam como marcadores indeléveis, indicando o início da época do Antropoceno", afirma Roberts. "Isto é valioso para os investigadores que tentam compreender melhor a história do impacto humano no mundo natural e serve como um poderoso lembrete da extensão da influência humana sobre o ambiente."