Cientistas descobrem glaciares feitos de sal em Mercúrio e um ambiente potencialmente capaz de albergar vida!
Cientistas do Planetary Science Institute (PSI) anunciam provas da existência de glaciares salgados em Mercúrio! Esta descoberta pode soar ainda mais surpreendente, se tivermos em conta que este planeta inóspito pode afinal conter um ambiente hospitaleiro à vida.
Os cientistas do Planetary Science Institute (PSI) Deborah Domingue, Bryan Travis, Jeffrey S Kargel, Oleg Abramov, John Weirich, Nicholas Castle e Frank Chuang são os co-autores do artigo onde é anunciada a descoberta de glaciares salinos. J. Alexis P. Rodriguez é o autor principal.
A descoberta destes cientistas acerca dos glaciares mercurianos - feitos de sal, em vez dos glaciares compostos por gelo de água que conhecemos na Terra - leva-os a acreditar que se tenham formado sob a crosta em camadas ricas em voláteis (VRL’s em inglês). Os glaciares ficam depois expostos por impactos de asteroides.
Os glaciares de sal são um fenómeno raro na Terra, mas já foram observados em áreas como as Montanhas Zagros, no Irão. A equipa sugeriu processos de formação para estes glaciares de sal e para o terreno caótico pelo qual Mercúrio é bem conhecido, e mecanismos que possam explicar a formação das VRL.
Alexis Rodriguez, autor principal do estudo.
Os investigadores examinaram Borealis Chaos, uma região rica em terreno caótico e perto do pólo norte de Mercúrio. Os impactos de asteroides quase destruíram as crateras desta região, muitas das quais datam dos primeiros tempos da formação do planeta. Por baixo desta camada encontram-se crateras antigas que foram descobertas através da análise de campos gravitacionais localizados. A colocação das duas camadas sugere talvez que as VRL’s possam ter-se desenvolvido de alguma forma sobre um terreno já sólido.
Rodriguez, autor principal da investigação, explica então que esta região de Mercúrio é “caracterizada por intrincados padrões de desintegração, suficientemente significativos para terem obliterado populações inteiras de crateras, algumas datando de há cerca de 4 mil milhões de anos. Por baixo desta camada colapsada encontra-se uma paleo-superfície com crateras ainda mais antiga, previamente identificada através de estudos gravitacionais".
"A justaposição da crosta superior fragmentada, agora formando um terreno caótico, sobre esta superfície antiga revelada pela gravidade, sugere que as VRL’s foram colocadas sobre uma paisagem já solidificada", continua Rodriguez.
Teorias anteriores e uma alternativa
Teorias anteriores sugerem que as diferentes camadas se formaram através da diferenciação do manto, onde os minerais se separam em camadas, mas agora surge uma nova teoria.
Em vez das teorias prevalecentes, as provas agora reunidas parecem apontar para algum tipo de acontecimento global, talvez mesmo do colapso da atmosfera primordial fugaz e quente de Mercúrio, pouco depois da formação do planeta. “Este colapso atmosférico pode ter ocorrido principalmente durante os longos períodos noturnos em que a superfície do planeta não estava exposta ao calor intenso do Sol."
Uma teoria alternativa sugere que a fuga de gás vulcânico pode ter criado temporariamente poças de água ou vapor denso e altamente salgado que poderia ter depositado sal. Quantidades significativas de água ter-se-iam perdido rapidamente no espaço, enquanto algumas poderiam ter ficado presas em minerais, deixando para trás uma camada rica em argila e sal.
Mercúrio, planeta inóspito, parece afinal deter um ambiente propício à vida...
A descoberta dos glaciares em Mercúrio é, por si só, fascinante, mas o que realmente chamou a atenção dos cientistas foi o impacto que isto tem no potencial para áreas de habitabilidade em Mercúrio - ou em qualquer outro planeta. "Esta descoberta inovadora dos glaciares mercurianos alarga a nossa compreensão dos parâmetros ambientais que poderiam sustentar a vida, acrescentando uma dimensão vital à nossa exploração da astrobiologia, também relevante para a potencial habitabilidade de exoplanetas semelhantes a Mercúrio", afirma Rodriguez.
Na Terra, a existência de certos compostos salinos em locais que, de outra forma, seriam inóspitos, permitiu que a vida se instalasse, como por exemplo no Deserto do Atacama no Chile. Fala-se frequentemente das Zona de Goldilocks (zona habitável) em torno das estrelas, a distância a que a água líquida pode existir e, por conseguinte, tem potencial para a vida.
No entanto, a descoberta de voláteis subsuperficiais (que normalmente se teriam evaporado no espaço) sugere que talvez a profundidade seja também um critério-chave para um ambiente hospitaleiro. A superfície de Mercúrio parece inóspita para a vida, mas talvez a vida seja capaz de se instalar no subsolo, desafiando a visão de longa data de Mercúrio como primariamente desprovido de voláteis.
Esta descoberta fortalece a compreensão das VRL’s, potencialmente escondidas nas profundezas da superfície do planeta.
Referência da notícia:
J. Alexis P. Rodriguez et al 2023 Planet. Sci. J. 4 219. "Mercury's Hidden Past: Revealing a Volatile-Dominated Layer through Glacier-like Features and Chaotic Terrains".