Cientistas debatem críticas dos negacionistas das alterações climáticas: “Baseiam-se na desinformação e na manipulação"

Apesar das evidências científicas esmagadoras e dos recordes climáticos registados em 2024, o negacionismo das alterações climáticas persiste, alimentado por desinformação e interesses económicos. Saiba mais informações aqui!

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Movimentos ultraconservadores e grupos económicos interessados em combustíveis fósseis disseminam discursos negacionistas das alterações climáticas.

O ano de 2024 consolidou-se como o mais quente dos últimos milénios, segundo dados do Copernicus Climate Change Service, e ficou marcado por eventos climáticos extremos a nível mundial. O calor abrasador em diversas regiões, as inundações devastadoras e a perda de gelo no Ártico evidenciaram a urgência da crise climática. No entanto, em alguns setores da sociedade, principalmente ligados a movimentos ultraconservadores e grupos económicos com interesses nos combustíveis fósseis, a negação destas evidências continua a ser disseminada.

Os mitos do negacionismo climático: a ciência responde com evidências

Alguns cientistas e especialistas têm vindo a contestar vigorosamente os argumentos negacionistas, apontando a manipulação e a desinformação como os principais domínios críticos.

Segundo José Manuel Rico Ordás, catedrático de Ecologia e codiretor da Cátedra de Mudanças Climáticas da Universidade de Oviedo, “os negacionistas recorrem a interpretações enviesadas e fora de contexto, ignorando o vasto corpo de investigação científica que demonstra inequivocamente o impacte das atividades humanas no aquecimento global”.

Entre os principais argumentos utilizados pelos negacionistas destacam-se três ideias recorrentes: que o clima sempre mudou; que não existe consenso científico; e que o dióxido de carbono (CO2) não é um poluente. Contudo, especialistas esclarecem que essas alegações não resistem a um escrutínio rigoroso.

Em primeiro lugar, é verdade que o clima do planeta sofreu alterações naturais ao longo de milénios. No entanto, a velocidade do aquecimento atual é sem precedentes na história geológica conhecida.

Paula Izquierdo Muruáis, doutora em Biogeociências da Universidade de Oviedo, sublinha que “os registos dos núcleos de gelo mostram que as concentrações de CO2 atingiram níveis nunca vistos nos últimos 800 mil anos, e esse aumento está diretamente associado às emissões humanas”.

Em relação ao alegado “desacordo científico”, estudos internacionais revelam que mais de 97% dos climatologistas concordam que as alterações climáticas são causadas pela atividade humana. Apesar disso, documentos como a “World Climate Declaration”, assinada por figuras de renome, têm sido usados para alimentar a dúvida pública. No entanto, muitos dos signatários não têm formação em climatologia, e apenas uma pequena fração publicou artigos sobre o clima.

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Estudos demonstram que as alterações climáticas são causadas pela atividade antropogénica e classificam o CO2 como um poluente climático.

Por fim, o argumento de que o CO2 não é poluente é uma simplificação enganadora. Embora seja essencial à vida na Terra e não seja tóxico em concentrações normais, o seu excesso na atmosfera provoca o efeito de estufa e aquece o planeta. Por essa razão, acordos internacionais como o Protocolo de Quioto e o Acordo de Paris classificam-no como um poluente climático.

Desinformação e inação: o custo humano e económico da crise climática

O impacte desta desinformação tem consequências concretas, nomeadamente o atraso na adoção de medidas urgentes para reduzir as emissões e mitigar os efeitos da crise climática. O relatório “Counting the Cost 2024”, da organização Christian Aid, revela que os dez desastres climáticos mais dispendiosos do ano ultrapassaram os 4 mil milhões de euros cada um. Os furacões Milton e Helene, nos EUA, Cuba e México, causaram prejuízos superiores a 115 mil milhões de euros e vitimaram centenas de pessoas.

A perda de gelo no Ártico é outro símbolo dramático das alterações climáticas. Em setembro de 2024, a extensão do gelo marinho atingiu o sétimo valor mais baixo desde o início dos registos por satélite, aproximando-se de um verão sem gelo antes de 2030, segundo um estudo publicado na revista Nature Communications.

Especialistas como Joanna Haigh, professora emérita do Imperial College London, alertam que “ignorar esta realidade climática apenas prejudicará as populações mais vulneráveis”.

A solução passa por acelerar a transição para energias renováveis e financiar os países mais afetados.

De facto, as consequências da crise climática são cada vez mais visíveis, apelando a sociedade para confiar na ciência e exigir ações concretas dos decisores políticos. As escolhas que fizermos hoje determinarão o futuro das próximas gerações.

Referência da notícia

Heuzé, C., & Jahn, A. (2024). The first ice-free day in the Arctic Ocean could occur before 2030. Nature Communications, 15, 10101.