Cientistas avaliam, pela primeira vez, o aquecimento no interior de algumas grutas nos Alpes à escala da década
Estudo científico pretende documentar e quantificar o aquecimento em curso no interior de algumas grutas alpinas e encorajar a investigação de seguimento, de modo a tirar o máximo partido da riqueza de dados de temperatura disponíveis para grutas noutros locais do globo.
Embora existam séries temporais locais de medições de temperatura em diferentes grutas (e partes das mesmas) desde há muitos anos, este é o primeiro estudo que avalia sistematicamente as medições de temperatura obtidas em quatro grutas nos Alpes.
Importância das grutas
As grutas formam-se com mais frequência nas regiões com calcário e dolomite, rochas particularmente solúveis. Ao longo de milhares de anos, a água que se infiltra da superfície corre por poços, corredores ramificados e câmaras enormes, com tamanho suficiente para neles se ocultarem rios e lagos. Por vezes, os minerais precipitam-se a partir da água que goteja no interior das grutas, formando estalactites que ficam penduradas no teto e estalagmites que se erguem do chão.
Em certas regiões dos Alpes, estas grutas abundam e algumas são suficientemente frias para que no interior cresça gelo em vez de rocha. Ninguém sabe ao certo quantas destas grutas de gelo existem, mas são mais numerosas aqui do que em qualquer outra região.
Milhares de grutas que contêm gelo perene podem ser encontradas nas cordilheiras europeias. Nos Alpes austríacos e italianos, as entradas para as grutas de gelo encontram-se a altitudes entre 1.500 e 2.000 metros.
Quando a temperatura é muito baixa, a água escorre para o interior da gruta, gota a gota, congela e assume formas fascinantes e em constante mutação. Sincelos com vários metros de comprimento ou largura enfeitam o teto. Placas de gelo grossas descem, em bandeira, pelas paredes. No solo, o lento gotejamento pode construir cones de gelo com vários pisos de altura ou enormes blocos que tapam poços inteiros.
Atualmente, o volume de gelo diminui em muitas grutas e em algumas, o gelo já não é perene, vai desaparecendo no verão, derretido pela chuva e pelo ar quente que se infiltra nas cavernas. Muitos dos registos históricos do gelo desaparecerão.
Aquecimento climático em grutas dos Alpes europeus
Pouco se sabe sobre se, e em que medida, o sinal do aquecimento atmosférico já chegou ao interior dos sistemas de grutas.
Os investigadores examinaram as médias diárias dos dados medidos nas quatro grutas e nas estações meteorológicas próximas no exterior. Os dados foram submetidos a um controlo de qualidade e limitados ao período que fornece os registos mais consistentes (2000-2020).
As principais análises incidiram sobre as características climatológicas e as relações com as condições externas, as tendências utilizando diferentes métodos, incluindo os aspetos sazonais, a representatividade espacial e temporal e a relação com a evolução do gelo nas grutas.
Os cientistas, autores do estudo, observaram alterações estatisticamente significativas da temperatura do ar nas quatro grutas dos Alpes estudadas.
As grutas investigadas representam diferentes tipos em termos do seu regime de ventilação e uma delas acolhe também gelo perene. O aquecimento contínuo conduzirá a grandes alterações nos ambientes das grutas alpinas, incluindo alterações na força e direção do fluxo de ar nas grutas, nos recursos hídricos e nos ecossistemas subterrâneos.
A degradação do permafrost (camada do subsolo da crosta terrestre que está permanentemente congelada) pode também levar à desestabilização das passagens das grutas, com queda de rochas. O aquecimento pode afetar o regime de ventilação das grutas de grande altitude, alterando as entradas superiores, que, de outro modo, podem estar obstruídas por neve ou gelo.
Por último, o aquecimento dos ambientes subterrâneos terá potencialmente um grande impacto no habitat de algumas espécies, como morcegos, aranhas, bactérias, que são sensíveis mesmo a pequenas alterações no microclima.
Referência da notícia:
Climate warming detected in caves of the European Alps. Scientific Reports volume 14, Article number: 27435 (2024). Friedrich Obleitner, Martin Trüssel & Christoph Spötl