Cérebro e a generosidade: estudo revela papel-chave da amígdala basolateral no comportamento social
A generosidade humana pode ter origem mais profunda do que a educação ou a cultura: está enraizada na estrutura do cérebro. Um novo estudo internacional revela que a amígdala basolateral, uma área do sistema límbico, desempenha um papel essencial na calibragem do comportamento social.

A generosidade, um dos pilares do comportamento humano, é influenciada por mais do que fatores sociais ou culturais. Uma equipa internacional de investigadores, liderada pelo Professor Tobias Kalenscher da Universidade Heinrich Heine de Düsseldorf (HHU), descobriu que a amígdala basolateral – uma subregião do sistema límbico – regula a forma como ajustamos o nosso comportamento social em função da proximidade emocional. O estudo foi publicado na Proceedings of the National Academy of Sciences (PNAS).
A amígdala basolateral como reguladora da generosidade
A investigação envolveu investigadores da Alemanha, Países Baixos, Suíça e África do Sul e baseou-se numa amostra rara: cinco mulheres com doença de Urbach-Wiethe (UWD), uma condição genética que afeta seletivamente a amígdala basolateral. Estas pacientes, que vivem em Namaqualand, apresentam alterações na forma como percebem e interpretam emoções, constituindo um “laboratório natural” para explorar o comportamento social.
Breakdown of utilitarian moral judgement after basolateral amygdala damage: "... value-based decisions to sacrifice another human for the greater good critically depend on the BLA." @PNASNews https://t.co/6UwS4isbHH
— Abigail Marsh (@aa_marsh) August 1, 2022
Para estudar o impacte desta lesão, os cientistas usaram uma versão modificada do “jogo do ditador”, um teste clássico da psicologia económica. Cada participante recebeu 200 rands sul-africanos (cerca de 11 dólares) para distribuir por oito pessoas do seu círculo social, escolhidas segundo diferentes níveis de proximidade emocional — desde a melhor amiga até um estranho.
Os resultados revelaram que as participantes com lesão na amígdala foram tão generosas quanto os controlos com pessoas próximas, mas tornaram-se significativamente mais egoístas com indivíduos mais distantes emocionalmente. Esta diferença, chamada de “desconto social”, foi muito mais acentuada nos casos com UWD, o que indica uma dificuldade em ajustar o comportamento pró-social em função do contexto.
Como o cérebro calibra as decisões sociais?
A tendência para agir de forma mais egoísta quando a ligação emocional é fraca não se deve a diferenças na empatia, personalidade ou tamanho da rede social – fatores controlados no estudo. Em vez disso, sugere que, sem uma amígdala basolateral funcional, o cérebro deixa de processar eficazmente o conflito entre interesses próprios e os dos outros.
A descoberta também ajuda a esclarecer resultados anteriores aparentemente contraditórios. Alguns estudos apontavam para comportamentos altruístas excessivos em pacientes com UWD, especialmente em dilemas morais ou jogos de confiança. A nova investigação mostra que a ausência da calibragem social da amígdala pode levar a respostas automáticas — por vezes excessivamente altruístas, outras vezes mais egoístas, dependendo do contexto.
Apesar da amostra reduzida — uma limitação inevitável dada a raridade extrema da doença —, a simetria e especificidade das lesões cerebrais nos participantes tornam este estudo particularmente robusto. Os investigadores excluíram familiares e coabitantes da lista de alvos, o que pode ter levado a padrões de generosidade mais conservadores em todos os participantes.
Em conclusão, a amígdala basolateral surge como uma peça-chave na regulação das decisões sociais humanas, ajustando o comportamento consoante a proximidade emocional com os outros. Este estudo fornece uma explicação inovadora e unificadora sobre como o cérebro gere o equilíbrio entre o altruísmo e o interesse próprio, com implicações relevantes para a compreensão de perturbações do comportamento social.