Aumento das temperaturas na Europa poderá tornar doenças como a dengue endémicas
Crise climática deverá fazer de doenças como a dengue importantes ameaças à saúde pública na Europa, em especial nos países do sul, alerta responsável da OMS. Veja aqui os pormenores!
Falar de alterações climáticas não se cinge ao aumento das temperaturas, a mudanças nos padrões de precipitação, ao aumento da variabilidade climática e a uma maior frequência e magnitude de eventos extremos, mas também ao (re)aparecimento de doenças e à sua transmissão.
Com o aquecimento do planeta cada vez mais claro e evidente, estão a criar-se condições favoráveis à propagação dos mosquitos portadores de doenças como a dengue e estão a aumentar os casos da doença, mesmo em regiões do mundo onde, outrora, não existam tais ameaças.
A dengue está entre as 10 principais ameaças globais à saúde pública, de acordo com a Organização Mundial da Saúde (OMS) e está presente em 125 países.
Uma doença em crescimento exponencial
Em 2022 foram diagnosticados 4,2 milhões de casos em todo o mundo. As autoridades de saúde pública esperam níveis de transmissão quase recorde este ano. Atualmente, o Bangladesh vive o pior surto alguma vez registado, com mais de mil mortes.
Segundo especialistas, este surto está ligado tanto ao aquecimento global, ao aumento da humidade e das chuvas, como à urbanização, à industrialização e à construção de edifícios em altura, fatores que bloqueiam as condutas de água e transformam as cidades em refúgios para os mosquitos.
Na Europa, a doença também tem crescido. No ano passado foram notificados 71 casos, quase tantos quanto os que foram registados ao longo dos últimos 10 anos. A verdade é que as taxas de prevalência da doença aumentaram oito vezes a nível mundial desde 2000.
As autoridades esperam agora que a doença aumente no sul dos Estados Unidos da América, na Europa, em especial nos país do sul, e em novas regiões de África. Atualmente a dengue representa um flagelo em grande parte da Ásia e da América Latina, causando cerca de 20 mil mortes por ano.
Isso mesmo considera o responsável da OMS, Jeremy Farrar. Para este especialista, a crise climática fará com que o vírus da dengue, atualmente difundido em regiões de clima tropical e subtropical, se torne endémico em algumas regiões dos Estados Unidos e da Europa.
Farrar estudou por dezoito anos doenças tropicais, incluindo a dengue, no Vietname. Dirigiu a instituição de caridade Wellcome Trust para a saúde global e aconselhou o governo do Reino Unido durante a pandemia da COVID-19.
Pela sua experiência, Farrar considera que a situação deverá exercer uma pressão sobre os sistemas hospitalares de muitos países, considerando que os sistemas de saúde europeus não estão preparados para lidar com o impacto da dengue.
O especialista releva, ainda assim, uma maior preocupação com os países da África Subsariana, onde os sistemas de saúde são mais débeis.
Para Farrar a prevenção é fundamental para se evitar a propagação da doença. Essa prevenção deve incluir planos de triagem para hospitais, bem como inovação científica, juntamente com outros fatores-chave, como o planeamento urbano, por forma a evitar áreas onde a água se encontra estagnada perto ou dentro das casas.
Características da dengue
A dengue é uma doença febril aguda causada por um vírus que é transmitido pela picada do mosquito Aedes Aegypti ou Aedes Albopictus. Estes mosquitos portadores são comuns em climas quentes e húmidos e, no verão passado, já se espalharam por toda a Europa, como havíamos adiantado, aumentando o espectro geográfico global da doença.
O indivíduo infetado apresenta febre alta, náuseas e dores de cabeça, podendo estes sintomas ser confundidos com uma simples gripe, pelo que é fundamental que exista um diagnóstico rápido e assertivo.
Embora a maioria das pessoas que contraem dengue pela primeira vez experimentem uma doença mais ligeira, parte dos indivíduos que a contraem uma segunda vez acabam por ter um caso mais grave, que pode levar à falência de órgãos e, no pior dos casos, à morte.
Cerca de uma em cada 20 pessoas que adoecem com dengue desenvolvem dengue grave. As crianças, as grávidas e as pessoas que já tiveram dengue no passado estão em maior risco.
A maior preocupação centra-se na variante hemorrágica da doença, que causa uma hemorragia interna grave, devido ao colapso dos vasos sanguíneos. Segundo a OMS, esta forma grave da doença termina em morte em 2,5% dos casos. Se o paciente não receber o tratamento adequado, a mortalidade pode aumentar até 20%.
Não existe um tratamento específico para esta doença, embora existam vacinas disponíveis no mercado, como é o caso da Qdenga da Takeda Pharmaceuticals, recomendado pela OMS para crianças dos 6 aos 16 anos em áreas onde a infeção é um problema de saúde pública significativo, e de outras, como veremos em seguida.
O exemplo português
Em Portugal, o mosquito da dengue existe no arquipélago da Madeira, onde já houve epidemias da doença no passado. Foram também já identificados mosquitos em Penafiel (Tâmega e Sousa) e em Mértola (Baixo Alentejo).
No nosso país está disponível uma vacina que tem a capacidade de proteger contra todos os tipos de dengue e apresenta "uma eficácia de 80% aos 12 meses", segundo Filomeno Fortes, diretor do Instituto de Higiene e Medicina Tropical (IHMT) e, "de 90,4% quanto à prevenção de internamentos".
Esta vacina não exige contacto prévio com o vírus, ou seja, pode ser tomada preventivamente, e é eficaz contra a doença e a prevenir hospitalizações até quatro anos e meio após a inoculação. É especialmente indicada para os viajantes que vão para zonas onde a dengue é endémica, devendo estes proceder à vacinação com pelo menos duas semanas de antecedência.