A seca está a definhar o arroz português, mas os investigadores do Porto não baixam os braços
Melhorar a genética das plantas e introduzir técnicas de rega mais eficazes são os trunfos da Faculdade de Ciências da Universidade do Porto para recuperar a produção nacional.
Os portugueses são os campeões da Europa no consumo do arroz - 18 quilos per capita consumidos por ano é um recorde difícil de ultrapassar. O apetite, quatro vezes superior à média europeia, depara-se, no entanto, com uma produção nacional em queda e cada vez mais afetada pelos efeitos das alterações climáticas.
Esse é o motivo que levou os investigadores da Faculdade de Ciências da Universidade do Porto a lançar o PrOryza: Desenvolvimento de arroz luso termotolerante – análise genética e reprodutiva. O projeto visa desenvolver uma variedade de arroz “português” resistente ao calor e às oscilações de temperatura e testar ainda modelos de irrigação mais eficientes.
Os ensaios de campo, realizados nas áreas de cultivo em Montemor-o-Novo, no Alentejo, vão avaliar o aumento da produtividade e a tolerância ao stress térmico das variedades Oryza sativa L., consideradas como as comercialmente mais relevantes em Portugal.
Bagos de arroz no laboratório
As subespécies a serem estudadas incluem o arroz carolino, especificamente as variedades portuguesas Caravela e Ceres, mas também há outras estirpes, de origem italiana, como Ariete, Lusitano e Sprint.
Identificar e analisar os marcadores genéticos que conferem à planta uma maior resistência a temperaturas elevadas é um passo determinante nesta investigação. Procurando tirar partido dessas propriedades, os cientistas irão, na fase seguinte, realizar cruzamentos artificiais entre as variedades selecionadas com vista a obter exemplares mais tolerantes ao calor.
O processo, feito em laboratório, conta com a parceria do Centro Operativo e Tecnológico do Arroz (COTAArroz), a entidade que coordena o programa nacional de melhoramento genético do arroz. O intuito passa, no essencial, por reverter a queda da produção nacional. A redução de produtividade dos campos de arroz está estreitamente relacionada com o aumento das temperaturas e diminuição da precipitação.
Alentejo com maiores perdas
O fenómeno agrava-se em particular nas regiões do sul. No Alentejo, por exemplo, os investigadores da Faculdade de Ciências da Universidade do Porto estimam que, nos últimos anos, houve uma perda de 10% na produção de arroz para cada subida de 1ºC de temperatura.
A fase de desenvolvimento da semente, ainda antes da formação do grão de arroz, é a mais delicada e muito sensível às variações de temperatura. No jargão da Biologia, as alterações climáticas estão a provocar a “esterilidade floral” nas plantações de arroz, levando a uma consequente diminuição de grãos produzidos. O fenómeno inibe as interações de grão de pólen-pistilo, originando sementes que não se conseguem reproduzir.
A investigação nos campos de cultivo
O desempenho reprodutivo das variedades Oryza sativa L. diante de secas cada vez mais frequentes é uma parte essencial do projeto de investigação PrOryza. Mas não é a única e há muito trabalho fora do laboratório que terá ainda de ser feito para medir e avaliar as condições a que vai ser sujeito o arroz cultivado nos campos do Alentejo.
Os ensaios de campo vão servir para comparar dois modelos distintos de irrigação, tentando avaliar os impactos do sistema de rega gota-a-gota e do método tradicional de cultivo por alagamento.
Rega gota-a-gota versus alagamento
O alagamento, segundo os investigadores, é a técnica mais utilizada entre os agricultores portugueses. E é também aquela que provoca um efeito-tampão ao redor da planta, ajudando na termorregulação e impedindo oscilações de temperatura durante o seu desenvolvimento.
Essa é, contudo, uma capacidade que o arroz perde ao ser sujeito à rega gota-a-gota. Os cientistas pretendem, por isso, verificar no terreno, como se comportam as variedades geneticamente melhoradas diante destes dois modelos.
O PrOryza, financiado pelo Programa Promove – O Futuro do Interior, da Fundação La Caixa, tem um orçamento de 150 mil euros e uma duração de três anos. Além da Faculdade de Ciências da Universidade do Porto, o projeto conta ainda com outros parceiros, como o Instituto de Tecnologia Química e Biológica António Xavier, da Universidade Nova de Lisboa, o COTArroz e a Sociedade Agrícola do Bem Calado Sul, de Montemor-o-Novo.