À medida que as temperaturas globais aumentam ano após ano, será que o Acordo de Paris vai falhar?

Os dados recentes de temperatura refletem um agravamento, uma vez que 2024 se tornou o primeiro ano em que a temperatura média global à superfície ultrapassou os 1,5 ºC acima da era pré-industrial.

Calor
O ano 2024 foi o ano mais quente alguma vez registado.

Estudo recente, publicado na Nature Climate Change, foi motivado por este ponto de inflexão para determinar se os dados de 2024 prenunciam uma violação iminente do limite do Acordo de Paris.

O Acordo de Paris vai ser cumprido?

É impossível afirmar que o limite do Acordo de Paris já foi quebrado, uma vez que se baseia na média móvel da temperatura da superfície global, medida em períodos de 20 anos. Um ano de 1,5 ºC acima dos níveis pré-industriais, como ocorreu em 2024, não significa, portanto, que o limite tenha sido ultrapassado, uma vez que fatores como um evento El Niño, um padrão climático natural que resulta no aquecimento do Oceano Pacífico, impactam os dados anuais.

Em 2023, a temperatura média global do ar à superfície atingiu 1,43 °C acima do nível pré-industrial (1,32-1,53 °C, intervalo provável). Este valor excedeu a melhor estimativa para o aquecimento induzido pelo homem de 1,31 °C (1,1-1,7 °C), indicando que, entre outros fatores, a variabilidade natural, incluindo a marca de um evento El Niño, contribuiu para a temperatura observada em 2023.

O ano seguinte, 2024, tornou-se o mais quente de que há registo a nível global e foi anunciado como o primeiro ano civil acima de 1,5 °C por várias organizações internacionais que acompanham de forma independente a temperatura global. Embora exista alguma incerteza entre os conjuntos de dados, em média, os dados indicam um consenso de que a temperatura do ar à superfície da Terra atingiu 1,55 °C de aquecimento em 2024.

Anomalias da temperatura
Anomalias da temperatura média anual da superfície do globo em 2024, em relação ao valor médio no período 1991-2020. Fonte: NOAAGlobalTemp v6.0.0-20250106

No estudo da Nature Climate Change, investigou-se de que forma os anos quentes isolados estão relacionados com o início do período de 20 anos de aquecimento global, combinando observações e simulações de modelos climáticos. Os autores do estudo concentraram-se em modelos com capacidade para representar as tendências de aquecimento no período 1981-2014.

Foram examinadas as tendências de aquecimento no passado para ver como o mundo atingiu os limites de temperatura anteriores: 0,6, 0,7, 0,8, 0,9 e 1,0 ºC acima dos níveis pré-industriais. Os autores do estudo verificaram que o primeiro ano em que cada um destes limites foi consistentemente excedido ocorreu dentro dos primeiros períodos de 20 anos que atingiram os mesmos limites de temperatura.

Este padrão implica que, como 2024 atingiu uma média de 1,5 ºC acima dos níveis pré-industriais, pode-se já ter entrado num período de aquecimento de 20 anos, o que poderá eventualmente marcar uma violação do Acordo de Paris.

Se isto for verdade, os impactos de um mundo que terá uma média de 1,5 ºC mais quente poderão em breve materializar-se.

Apelo à ação climática imediata

De acordo com os autores do estudo, há uma hipótese de reduzir a probabilidade de aquecimento acima de 1,5 ºC nos próximos anos, mas isso exigiria esforços de mitigação rigorosos em todo o mundo.

Este estudo fornece fortes evidências de que um único ano acima de 1,5 °C é um sinal de alerta de excedência permanente; a probabilidade da Terra já ter entrado na era de 1,5 °C é extremamente elevada, a menos que sejam tomadas medidas climáticas globais urgentes.

Um ano acima de 1,5 °C não é altura para desespero, mas sim um apelo à ação. Os governos devem agir imediatamente para reduzir as emissões, implementar medidas de adaptação e prepararem-se para os riscos crescentes de um mundo mais quente.

A crescente ameaça das alterações climáticas tornou-se ainda mais evidente em 2024, com o Acordo de Paris a surgir constantemente como um lembrete de que os esforços de mitigação precisam de ser intensificados. No entanto, foram levantadas preocupações sobre a prioridade das agendas climáticas em todo o mundo.

Emissões
É urgente que sejam aplicados planos de redução de emissões a nível global.

Recentemente, das 195 partes que assinaram o Acordo de Paris, apenas 13 apresentaram planos de redução de emissões até à data limite de 10 de fevereiro.

As partes que cumpriram estas promessas, destinadas a abordar a forma como as nações reduzirão as emissões até 2035, incluem o Brasil, os Emirados Árabes Unidos, o Reino Unido e os EUA. Aqueles que falharam o prazo incluem algumas das maiores economias do mundo, principalmente a China, a Índia, a Rússia e a União Europeia.

Este estudo, que prevê um futuro mais quente serve de alerta para que as nações sigam planos climáticos ambiciosos e se esforcem por cortes imediatos nas emissões.

Referência da notícia

“A year above 1.5 °C signals that Earth is most probably within the 20-year period that will reach the Paris Agreement limit”, Nature Climate Change, Emanuele Bevacqua, Carl-Friedrich Schleussner & Jakob Zscheischler, Published: 10 February 2025