A frágil muralha da ecologia costeira e os manguezais
Processos evolutivos ao longo de milhares de anos balancearam a biodiversidade planetária. O impacte da pressão humana e de alterações nos padrões climáticos infere consequências danosas aos frágeis ecossistemas costeiros do planeta.
O clima do planeta caracteriza-se por um mecanismo de constantes variações meteorológicas, numa dinâmica que se reflete nas esferas hidro-, eco-, e biológica. Neste permanente processo, as florestas, assumem determinante influência, afetando o comportamento do clima, inferindo no albedo, no ciclo do carbono, no fluxo de energia e de vapor de água. Estas manchas verdes ocupam cerca de 31% da superfície do planeta, edificado arbóreo que compõem florestas desde tropicais, boreais, temperadas, (...) a manguezais.
Na zona costeira da litosfera, numa estreita faixa terrestre predominantemente dominada pela esfera oceânica, é estabelecido um interface relacional entre a terra e o mar, uma zona de influência recíproca, cujo efeito se repercute nos ambientes terrestre, marinho e atmosférico. Esta faixa costeira, apesar de formada essencialmente por arribas e formações geológicas compostas por sedimentos, partículas de rocha, praias de areia, a particularidade geografica faz aflorar, em áreas do planeta como, na Baixa Califórnia, Caribe, Florida, Norte da Austrália, Índia, Este e Oeste de Africa, incríveis ecossistemas de florestas aquáticas, os manguezais.
Estas florestas, representando cerca de 0,6% do total da vegetação terrestre, distribuem-se por mais de 120 países, predominantemente nas latitudes tropical e subtropical, numa área superior a 150 mil km², correspondendo, só à Indonésia 23 mil km², e ao Brasil 20 mil km². Trata-se de um complexo e eficaz ecossistema, constituído por plantas e animais que colonizam regiões entre-marés, em costas abrigadas, bancos de rios, estuários, um limite entre o habitat terrestre e o aquático, que é inundado por marés.
Refira-se que a denominação de mangal caracteriza uma área de terreno costeiro, lodoso, alagado na praia-mar pela água salgada, no qual a vegetação, para além de fetos e palmeiras, é designada por mangue. Plantas halófitas, extremamente bem adaptadas, lenhosamente hidrofílicas, conseguem sobreviver a condições anaeróbicas, são tolerantes à salinidade, e podem atingir 30 metros de altura. Resilientemente, para absorver O₂, estas árvores, os mangues, desenvolvem prolongamentos aéreos das raízes, pneumatóforos, que se projetam acima do substrato e da água.
As suas raízes são dotadas de membranas especiais que filtram até 80% do sal presente na água, sendo que, em algumas espécies de mangues, o sal é excretado através de glândulas localizadas nas folhas, impedindo que este entre no sistema vascular da planta. A espetacularidade deste tipo de vegetação, demonstra-se também pela peculiaridade de albergarem simultaneamente comunidades terrestres e marinhas, pois as suas copas são habitadas por símios, serpentes e aves, enquanto por entre as raízes se refugiam peixes, crustáceos, moluscos e tartarugas.
Tal como os recifes de coral, as florestas de mangais, com o seu intrincado sistema de raízes, proporcionam uma zona de águas abrigadas, potenciando a reprodução e desenvolvimento de toda uma panóplia de espécies, representando uma espécie de nurserie para inúmeros animais aquáticos, incluindo os tubarões que aí passam os primeiros meses de vida protegidos de predadores.
Biologicamente, os manguezais são ecossistemas altamente produtivos!
Representam um total de 24 ton/ha/ano de biomassa biótica, sendo por isso extremamente importantes para a acumulação de nutrientes nas águas costeiras, o que faz prosperar as flora e fauna do lugar. E esta elevada produtividade dos manguezais relaciona-se com a acumulação e degradação das suas folhas caducas, assim como de detritos de plantas marinhas e fragmentos de conchas, transportadas pelas correntes até à costa, onde, nas baías resguardadas, com uma menor velocidade da água, o material em suspensão é depositado, enriquecendo o solo e a microflora.
A importância deste ecossistema é determinante, considerando que estas comunidades ajudam a estabilizar bancos de rios e orlas costeiras, protegendo da ação erosiva e devastadora de eventos meteorológicos extremos como furacões/tufões, pois atuam como barreiras mitigadoras da energia que transportam. A relevância da ação dos pântanos de mangais relaciona-se com a retenção dos sedimentos que provêm da terra, bem como do mar, formando uma barreira natural à penetração da água salgada, por exemplo, em terrenos adjacentes usados para fins agrícolas.
Denominados de ecossistemas de carbono azul, pelas folhas dos mangues, por ação da fotossíntese, é sequestrado CO₂ da atmosfera, e aprisionado nas suas raízes, contribuindo substancialmente para a mitigação das cíclicas e incontornáveis alterações climáticas. Mas, este extraordinariamente improvável ecossistema, enfrenta pesadas pressões que o tornam perigosamente vulnerável. Uma ameaça premente é representada pela indústria de aquicultura de crustáceos, nomeadamente camarões, uma espécie com elevada dinâmica comercial, mas com negativo impacte no equilíbrio natural dos manguezais.
A sua implicação no mecanismo da biosfera é deveras significativa, considerando tão só duas asserções – os manguezais sequestram cerca de cinco vezes mais carbono do que as florestas tropicais; estima-se que cerca de 80% das capturas globais de pescado depende direta ou indiretamente da dinâmica natural dos mangais! Não obstante a conotação de ambiente inóspito, barrento, infestado de insetos, os manguezais desempenham, de facto, fundamental importância na geração e produção de vida no planeta!