A crise climática na produção alimentar agrava-se com a estagnação da eficiência agrícola

A crescente ineficiência na produção alimentar está a intensificar a crise climática, a ameaçar agravar as emissões de Gases com Efeito de Estufa (GEE) e a desflorestação num futuro próximo.

Produção Crise Climática
Produção alimentar desenfreada exacerba crise climática. Conclusões são ditadas por estudo publicado na revista PNAS.

A crise climática está a intensificar-se com a crescente ineficiência na produção alimentar, o que poderá ter consequências graves num futuro próximo. Com o crescimento da população mundial, uma das formas mais eficazes de reduzir as emissões de Gases com Efeito de Estufa (GEE) provenientes da agricultura seria tornar a produção de alimentos muito mais eficiente.

Estagnação na eficiência agrícola ameaça aumentar emissões e desflorestação global

Desde 2010, as melhorias na eficiência da produção agrícola têm estagnado, o que poderá resultar num aumento substancial das emissões e na intensificação da desflorestação, dado que a procura por alimentos continua a crescer.

Lin Ma, da Academia Chinesa de Ciências em Shijiazhuang, e a sua equipa, ao analisarem dados disponíveis, calcularam as emissões de GEE por unidade de proteína produzida entre 1961 e 2019. Optaram por medir a proteína em vez de calorias, por considerarem que a proteína é um indicador mais adequado da qualidade alimentar, conforme explica Ma.

A equipa relata que, entre 1961 e 2010, as emissões por unidade de proteína diminuíram para um terço. Contudo, desde então, não se registaram mais progressos, e há até sinais de um possível aumento. Como a agricultura é responsável por aproximadamente um terço de todas as emissões de GEE e a procura por alimentos deverá aumentar em 50% até 2050, o facto de a eficiência na produção agrícola não estar a melhorar sugere que as emissões agrícolas poderão crescer na mesma proporção, alertam os investigadores.

Expansão agrícola e consumo de carne são as principais responsáveis

Se a eficiência agrícola não melhorar, o único meio de aumentar a produção será através da expansão dos terrenos agrícolas, o que levará inevitavelmente a mais desflorestação e à perda de biodiversidade.

Richard Waite, do Instituto de Recursos Mundiais em Washington DC, que não participou na investigação, alerta: “isso seria uma notícia muito má. Precisamos de reduzir drasticamente as emissões, não aumentá-las”. Waite destaca ainda que “a contínua – e até acelerada – expansão de terrenos agrícolas desde o início do século é extremamente preocupante, pois os planos para manter o aquecimento global dentro dos 1,5 °C dependem do fim imediato da desflorestação”.

Dan Rejto, do Instituto Breakthrough, aponta várias razões para o abrandamento na redução das emissões por unidade de proteína produzida. Uma delas é o aumento do consumo de carne a nível global, que é significativamente mais intensivo em emissões de GEE do que os alimentos à base de plantas. Outro fator a considerar é o grande volume de culturas que estão a ser utilizadas para produzir biocombustíveis em vez de alimentos.

Rejto comenta que “o aumento dos biocombustíveis à base de culturas provavelmente explica parte da desaceleração na descarbonização que o estudo identifica”.

As culturas de biocombustíveis, cultivadas para produzir energia, são escolhidas pela sua elevada densidade calórica, mas têm um rendimento proteico inferior, o que reduz a sua eficiência quando medida pela equipa de Ma.

Embora o estudo não tenha analisado o impacte do aumento dos fenómenos climáticos extremos, como secas e inundações, sobre as colheitas e os preços dos alimentos a nível internacional, Ma crê que os efeitos destas condições extremas sobre as colheitas foram relativamente pequenos até 2019. No entanto, este cenário pode ter mudado desde então.

O que fazer para evitar a aceleração da crise climática?

Este panorama é alarmante. Se a estagnação na eficiência da produção alimentar continuar, o crescimento populacional global poderá exigir uma expansão significativa de terrenos agrícolas, colocando em risco os esforços para reduzir as emissões globais de GEE e capacidade para lidar com a crise climática. A desflorestação resultante agravaria ainda mais a perda de biodiversidade, ameaçando todos os ecossistemas.

youtube video id=3lrJYTsKdUM

A solução requer um esforço global para estabilizar e aumentar a eficiência da produção alimentar, invertendo a tendência de estagnação observada desde 2010. Isto poderia ser alcançado através do desenvolvimento e adoção de tecnologias mais sustentáveis, da promoção de dietas baseadas em plantas e de uma gestão mais racional e eficiente dos terrenos agrícolas. Caso contrário, o mundo poderá enfrentar um futuro em que a produção alimentar se torna um dos principais motores da crise climática.

Referência da notícia:

Bai, Z.; Zhang, N.; Winiwarter, W.; Luo, J.; Chang, J.;... & Ma, L. (2024). Decline in carbon emission intensity of global agriculture has stagnated recently. PNAS, 121(34), e2317725121.