Semáforos espaciais vão proteger a Terra de tempestades solares

Investigadores europeus e americanos criaram um modelo de previsão meteorológica espacial capaz de antecipar eventos geomagnéticos, dando-nos tempo para proteger infraestruturas críticas, como satélites e redes elétricas.

tempestades cósmicas
As tempestades geomagnéticas podem paralisar satélites e outros serviços críticos como sistemas de navegação e redes elétricas. Imagem: ESA/Science Office, CC BY-SA IGO 3.0, via Wikimedia Commons.

Por muito que a tecnologia tenha evoluído, continuamos à mercê de fenómenos naturais capazes de comprometer a nossa segurança. As tempestades solares ou geomagnéticas são um bom exemplo disso - são difíceis de prever e as suas consequências podem ser imprevisíveis.

Mas a cada dia que passa, estamos mais bem preparados para saber lidar com os caprichos da nossa estrela maior.

Essa é aliás a missão do projeto PAGER, programa financiado pela União Europeia, que criou um sistema de semáforos espacial para prever tempestades geomagnéticas.

A equipa internacional, com investigadores da academia e da indústria europeia e americana está atualmente a testar um inovador sistema de previsão meteorológica espacial, que poderá antecipar a chegada de tempestades solares, dando-nos mais tempo para proteger as nossas infraestruturas críticas.

O que são tempestades geomagnéticas?

Uma tempestade geomagnética ocorre quando uma poderosa erupção do Sol atinge o nosso planeta. O vento solar transporta partículas carregadas de energia que afetam o campo magnético protetor da Terra, podendo colocar em perigo a operacionalidade de satélites e de outros serviços críticos, como os sistemas de redes elétricas.

Erupção solar
Imagem de uma explosão solar captada pela sonda Solar Dynamics Observatory da NASA. Foto: NASA/SDO

Desde 1958, quando as primeiras investigações espaciais tiveram início, que sabemos como grande parte do nosso modo de vida moderno está ameaçado por eventos solares. Se entrar subitamente num período mais ativo, o Sol pode provocar tempestades geomagnéticas capazes de destruir satélites e causar apagões na Terra.

Zona sensível no cinturão de radiação

A maioria dos satélites opera nos cinturões de radiação da Terra, uma região espacial situada a cerca de 58 mil km acima do planeta, onde as partículas ficam presas pelo campo magnético terrestre.

São, por isso, corredores sensíveis, onde se encontram os satélites GPS e que, durante as tempestades, podem ficar danificados. Embora os atuais aparelhos espaciais estejam bem protegidos, as partículas com mais energia podem penetrar a blindagem e causar sérios danos.

Acidentes com milhões de prejuízos no espaço

Não se trata apenas de cenários meramente hipotéticos. Estas tempestades geomagnéticas já atingiram por diversas vezes instalações espaciais. Em fevereiro de 2022, a empresa americana SpaceX ficou sem 38 dos seus satélites de Internet Starlink após uma forte tempestade geomagnética.

A empresa americana Intelsat também já perdeu o controlo do seu satélite Galaxy 15 em abril de 2010 devido a uma tempestade geomagnética. O aparelho ficou à deriva, ameaçando outros objetos espaciais. O risco pode, por isso, ser enorme com milhões de euros de prejuízos.

Apagões e serviços interrompidos na Terra

As tempestades geomagnéticas também representam um perigo para as infraestruturas terrestres. As correntes elétricas transportadas por ventos solares podem sobrecarregar as centrais elétricas e causar apagões temporários. Foi precisamente isso que aconteceu no Quebeque, Canadá, em 1989, quando uma tempestade geomagnética originou um apagão generalizado de nove horas.

Satélite na órbita da Terra
A inteligência artificial tem vindo a melhorar a precisão dos sistemas espaciais de previsão meteorológica, permitindo proteger os satélites na órbita da Terra. Imagem gerada por IA: Pixabay

Em outubro e novembro de 2003, tempestades muito fortes causaram também a interrupção dos serviços de inúmeros satélites, perturbando as comunicações, as redes elétricas e a navegação por GPS em muitas regiões do globo.

Tanto a Europa como os Estados Unidos dispõem de centros de meteorologia espacial que podem prever quando estes fenómenos solares poderão atingir a Terra. Mas, até muito recentemente, estes cálculos não estavam associados a modelos de previsão capazes de antecipar a forma como a radiação interfere com os satélites ou com as infraestruturas na Terra.

Algoritmos e previsões meteorológicas

Essa é a lacuna que o projeto PAGER procura colmatar. Entre 2020 e 2023, investigadores americanos e europeus desenvolveram um algoritmo que reuniu dados não só dos satélites em órbita da Terra, como dos telescópios e satélites de observação do Sol.

A informação cruzada com modelos de previsão meteorológica permite estimar com uma antecedência de dois dias a direção de uma tempestade geomagnética perigosa e quais as consequências para as infraestruturas espaciais e terrestres.

Como a radiação nociva para os satélites pode ainda demorar mais alguns dias a acumular-se, o sistema poderá dar algum tempo para os especialistas tomarem providências e se preparem para minimizar os efeitos das tempestades

Alertas vermelho, amarelo e verde

O algoritmo concebido pela equipa do PAGER está agora a ser testado para determinar a sua capacidade de previsão e precisão. O projeto assemelha-se bastante a um sistema de semáforos, mas suportado em previsões.

Diante de uma luz vermelha, os operadores de satélites e de redes terrestres elétricas colocam os seus equipamentos em modo de segurança e proteção. O amarelo significa que se devem ter cuidado com os potenciais efeitos, enquanto o verde indica não haver motivos para estar alerta.

Semáforo vermelho
O projeto PAGER desenvolveu um modelo idêntico aos semáforos no trânsito para ajudar os operadores a proteger infraestruturas espaciais e terrestres. Imagem: Hans/Pixabay

As previsões, contudo, ainda precisam de ser melhoradas para estimar a probabilidade destes eventos ocorrerem num horizonte mais alargado e aumentar a margem de manobra de alguns dias para várias semanas.

Mas essa é uma missão em progresso constante, que em breve poderá vir a beneficiar de tecnologias como a aprendizagem automática e a integração de um número cada vez maior de dados e medições em tempo real.

Referência do artigo

Jonathan O’Callaghan. Space researchers build traffic light system to warn of dangerous solar storms. Horizon EU Research&Innovation Magazine