Energia solar produzida na Lua: a chave para as futuras colónias espaciais?
Os cientistas propõem o fabrico de células solares diretamente na Lua, utilizando rególito e perovskitas. Isto reduziria os custos e aumentaria a viabilidade da criação de bases lunares sustentáveis.

A Lua pode ser mais do que apenas uma paisagem rochosa e estéril. Os investigadores descobriram uma forma de transformar o seu solo, o rególito, numa fonte importante de energia solar. Isto permitiria que as futuras bases lunares fossem auto-suficientes, utilizando materiais locais para fornecer eletricidade.
O rególito lunar, abundante na superfície, pode ser fundido para formar um tipo de vidro conhecido como "moonglass", que serviria de base e proteção para células solares feitas de perovskitas, um tipo de material que ganhou popularidade na energia solar terrestre devido à sua eficiência e baixo custo de produção.
Ao utilizá-lo como substrato e encapsulamento, os investigadores evitariam o transporte de grandes quantidades de vidro da Terra, o que reduziria drasticamente o peso e, consequentemente, o custo das missões espaciais. Estima-se que se poderia poupar até 99% do peso dos materiais necessários para gerar energia solar.

Isto não só facilita a logística lunar, como marca uma mudança de paradigma: em vez de trazer soluções da Terra, pode construir diretamente lá com o que tem. A ciência está a dar passos em direção a uma economia espacial circular, onde a autossuficiência será a chave para a sobrevivência.
Perovskitas: estrelas em ascensão na energia solar
As perovskitas são materiais cristalinos capazes de absorver a luz solar de forma muito eficiente. Ao contrário do silício tradicional, são mais fáceis de fabricar, requerem menos energia e podem ser produzidos a baixas temperaturas, o que é ideal para um ambiente como a Lua, onde os recursos são limitados.
Além disso, as perovskitas toleram muito melhor as impurezas e os defeitos do que o silício, o que as torna perfeitas para o fabrico em condições extremas, como as que se encontram numa base lunar. A sua flexibilidade e adaptabilidade tornam-nas candidatas ideais para uma nova geração de tecnologia espacial.
Em testes laboratoriais, os investigadores conseguiram fabricar células solares em moonglass utilizando uma pequena quantidade de perovskita. Com apenas um quilograma deste material, é possível cobrir 400 metros quadrados de painéis solares, uma superfície considerável para alimentar uma base.
Enquanto as primeiras versões destas células atingiam eficiências de 8-12%, os modelos simulados com melhorias projetam uma eficiência de até 21%. Isto coloca-as ao nível das tecnologias solares mais avançadas, mas com a grande vantagem de quase todo o material ser obtido no próprio satélite.
Energia resiliente para um ambiente extremo
Um dos maiores desafios na Lua é a radiação: sem uma atmosfera, as partículas solares e cósmicas bombardeiam a sua superfície sem restrições. Por conseguinte, qualquer equipamento tecnológico deve ser altamente resistente para sobreviver a longos períodos de funcionamento neste ambiente extremo.
As células solares feitas de moonglass e perovskitas demonstraram uma resistência notável em testes com protões de alta energia, equivalentes aos que encontrariam na Lua. De forma notável, mantiveram 99,6% da sua eficiência inicial após a exposição, sem necessidade de materiais especiais ou revestimentos dispendiosos.

Isto deve-se em parte à composição do moonglass, que inclui pequenas quantidades de ferro. Este elemento atua como estabilizador e impede que o vidro escureça sob radiação, mantendo a transparência necessária para que a luz solar passe para a camada ativa de perovskita.
Combinando essa resistência com o seu baixo peso e facilidade de fabrico, estas células solares poderão tornar-se um componente essencial para manter vivas as primeiras colónias lunares. O melhor de tudo é que tudo isto pode ser conseguido sem depender do silício, que requer processos de purificação complexos que não são viáveis lá em cima.
Rumo a uma nova era de energia espacial
Esta investigação marca um ponto de viragem na forma como pensamos a exploração espacial. Produzir energia solar diretamente na Lua não só é possível, como já estão em curso testes bem sucedidos para o provar. A autossuficiência energética no espaço está mais próxima do que pensamos.
A abordagem proposta evita a necessidade de transportar grandes quantidades de materiais da Terra ou de criar fábricas complexas para extrair silício puro. Utilizar o rególito tal como está, e adicionar apenas uma quantidade mínima de perovskita do nosso planeta, simplifica muito todo o processo.
As implicações são enormes: se esta tecnologia for ampliada, poderá não só alimentar bases científicas na Lua, mas também missões a Marte, satélites e estações espaciais autónomas. Poderíamos imaginar verdadeiras colónias permanentes, alimentadas por energia gerada in situ.
Desta forma, a humilde poeira lunar - que parecia inútil - poderia ser a chave para abrir uma nova era de presença humana no espaço. Uma era em que a energia não vem do planeta azul, mas é forjada, literalmente, debaixo dos nossos pés... mesmo que estejamos a 384.000 quilómetros de casa.