Uma das maiores reuniões do mundo num dos rios mais poluídos: o que vai fazer a Índia pela segurança dos peregrinos?

A Maha Kumbh Mela (festival do Grande Jarro) é o maior encontro religioso do mundo e tem o potencial de representar um grave problema de saúde pública. Fique a saber porquê, no nosso portal!

Prayagraj ou Allahabad
A vastidão da cidade, que conta mais de 1 milhão de habitantes, é enriquecida pela quantidade de pessoas e construções que chegam e são feitas para este evento.

Iniciou-se nesta segunda-feira o maior festival religioso do mundo. Durante 6 semanas são esperados mais de 400 milhões de pessoas naquele que é um dos momentos mais importantes para a religião hindu. Esta versão do Kumbh Mela, a Maha (grande) acontece a cada 12 anos, em 4 cidades diferentes (para além de Prayagraj, Haridwar, Nashik e Ujjain) que de forma rotativa recebem milhões de visitantes. Espera-se que esta edição se estenda até ao dia 26 de fevereiro.

(...) esta peregrinação representa desafios enormes, a começar pela segurança de todos.

Ao mergulharem nas águas geladas da zona de confluência dos rios Ganges e Yamuna (onde se acrescenta o mítico rio Sarasvati, que surge nos escritos antigos), os hindus acreditam que estão mais próximos de verem os sus pecados perdoados. Este festival decorre na cidade de Prayagraj, no estado de Uttar Pradesh, na região Norte da Índia.

Uma logística impressionante

Do ponto de vista logístico, esta peregrinação representa desafios enormes, a começar pela segurança de todos. Mais de 40 mil policias vão ficar responsáveis por essa tarefa, em parceria com um sistema de câmaras de videovigilância equipadas com inteligência artificial. Desde o nascer do sol de segunda-feira, dia 13 de janeiro, que mais de 2 milhões de pessoas, entre peregrinos e turistas, esperam pelo nascer do Sol para mergulharem naquelas que são das águas mais poluídas do planeta.

Margens do Ganges
Centenas de milhares de pessoas amontoam-se nas margens do Ganges e do Yamuna com o objetivo de executarem um "mergulho sagrado".

Tendo em conta que a Índia é neste momento o país mais populoso do mundo, já há um certo nível de habituação na preparação deste tipo de eventos. Mesmo assim, os números são impressionantes: foram instaladas mais de 150 mil casas de banho portáteis, perto de 70 mil postes de iluminação e há um mar de tendas de 4000 hectares, o equivalente a 2/3 da área da ilha de Manhattan.

Segundo a cosmologia hindu, o rio Ganges tem origem nos céus. A Kumbh Mela, o grande festival que ocorre ao redor do Ganges, é uma celebração da criação.

Para além dos locais, há milhares de pessoas que chegam às “águas sagradas” vindos de outros pontos do subcontinente indiano, de outros países asiáticos ou mesmo de outros continentes (América do Norte, por exemplo). Este gigantesco banho coletivo é de extrema importância para os hindus, pois simboliza uma batalha mitológica entre deuses e demónios para controlarem um recipiente que continha o néctar da imortalidade.

Possíveis problemas de saúde pública

Para além das águas dos dois rios estarem fortemente poluídas, há outro problema que salta à vista de quem acampou naquela cidade: em muitos locais não há fornecimento de água potável e o fornecimento de energia elétrica é muito irregular. A falta de água faz com que muitas das casas de banho instaladas fiquem rapidamente inutilizadas.

Infraestruturas
Tal como acontece com estes pontões, milhares de infraestruturas são construídas especificamente para acolher os peregrinos que chegam a Prayagraj. Muitas destas construções são de fraca qualidade e ficam rapidamente inutilizadas.

Voltando ao ponto de vista da saúde, fizeram-se estudos nos últimos anos, com dados do último Kumbh Mela, em 2019, com vista a compreender os impactos na saúde da população após frequentar um evento desta dimensão.

Através do estabelecimento de monitorização de cerca de 20 doenças agudas foi possível compreender que a febre e a doença respiratória aguda foram duas das que mais se espalharam pelos peregrinos. Registaram-se ainda dois surtos, de gastroenterite aguda e de varicela, que podem ter sido potenciados pela utilização massiva das águas dos rios sagrados.

Este banho sagrado, que representa para alguns o apogeu da sua vida religiosa, apesar de ter potencial para provocar problemas de saúde pública num futuro próximo, está a ser mais monitorizado que nunca, algo que abre perspetivas vantajosas para os próximos eventos. Minorar os perigos e os riscos é um trabalho contínuo que requer persistência por parte das autoridades, sendo que as locais parecem estar a trabalhar nisso.

Referência da notícia

Aggrawal, V., Dikid, T., Jain, S. K., Pandey, A., Khasnobis, P., Choudhary, S., Chandra, R., Patil, A., Maramraj, K. K., Talyan, A., Singh, A., Babu, B. S., Kumar, A., Kumar, D., Raveesh, P. M., Singh, J., Kumar, R., Qadri, S. S., Madan, P., Vardan, V., … Singh, S. K. (2020). Disease surveillance during a large religious mass gathering in India: The Prayagraj Kumbh 2019 experience. International journal of infectious diseases : IJID : official publication of the International Society for Infectious Diseases, 101, 167–173.