Que diferenças há entre "fissão" e "fusão" nuclear? Esclarecendo a proeza
Após décadas de trabalho nesta experiência, a ignição da fusão nuclear foi finalmente conseguida. O que significa isto e o que representa para a sociedade do futuro? Sem dúvida, é um grande avanço energético que permitirá "limpar" o nosso consumo.
Atualmente, a energia gerada nas centrais nucleares é obtida a partir da fissão nuclear, um processo que deixa resíduos radioativos. Para otimizar esta prática, os cientistas internacionais têm investigado há mais de 60 anos o oposto da fissão, isto é, a fusão nuclear. A grande questão era como fazer um ganho líquido através desta fonte de energia limpa e quase ilimitada.
Pela primeira vez, um reator de fusão conseguiu gerar mais energia do que a utilizada com lasers para desencadear a reação. O anúncio foi feito na terça-feira (13) pelo Departamento de Energia dos EUA: é a primeira experiência de fusão controlada na História a atingir este marco, afirmou num comunicado de imprensa.
No passado 5 de dezembro, o National Ignition Facility (NIF), pertencente ao Lawrence Livermore National Laboratory na Califórnia, EUA, disparou um conjunto de lasers com uma energia de 2,05 megajoules (MJ) para um cilindro que continha uma pastilha de deutério congelado e trítio, dois isótopos - ou tipos - de hidrogénio. Isto fez com que a cápsula se comprimisse e aquecesse: a temperatura e a pressão atingidas eram suficientemente intensas para fazer com que o hidrogénio no seu interior se fundisse. Neste processo, foram libertados 3,15 MJ de energia, quase 50% mais do que a utilizada pelos lasers.
O que são fusão nuclear e a ignição?
Dirigiram 192 lasers para o pequeno objetivo: os átomos de hidrogénio fundiram a cerca de 3 milhões de graus Celsius. Nestas condições, "simularam de forma breve as condições de uma estrela e conseguiram a ignição", disse Jill Hruby, a secretária adjunta da Administração Nacional de Segurança Nuclear (NNSA) na conferência de imprensa.
Antes de compreendermos o que é a ignição, precisamos de olhar para o conceito de fusão nuclear. Neste processo, os átomos são combinados ou fundidos entre si para formar um núcleo maior, que liberta energia. Em comparação com a fissão, que é a divisão dos átomos para formar núcleos mais pequenos, é uma forma mais segura de geração de energia, porque evita desencadear uma reação em cadeia descontrolada.
O NIF aplicou o confinamento inercial na fusão nuclear: unindo deutério e trítio, cria-se um átomo de hélio, um neutrão livre e uma grande quantidade de energia. É como recriar o que acontece no Sol, a nossa principal fonte de vida. Quando a energia de fusão libertada excede a energia dos lasers, ocorre a chamada "ignição".
Energia limpa do futuro
A comercialização deste tipo de energia não seria fácil. Tal reator teria de gerar 50 a 100 vezes mais energia do que a que os seus lasers emitem para cobrir o seu próprio consumo energético e fornecer energia à rede, esclarece Riccardo Betti, um físico da Universidade de Rochester. As ferramentas para assegurar um novo futuro energético ainda não estão disponíveis.
Certamente que assistimos a um grande avanço. Seria o suficiente para aliviar o aquecimento global? A eliminação da utilização de combustíveis fósseis impediria a emissão de gases com efeito de estufa. A fusão nuclear seria então um caminho a seguir, mas faltam progressos tecnológicos para o consumo global. Entretanto, continua a ser oportuno concentrar-se noutras fontes de energia limpa, tais como a solar ou a eólica.