Produção de peixe em aquicultura supera, pela primeira vez, a pesca de captura
Pela primeira vez, a produção aquícola de animais marinhos ultrapassou a pesca de captura, segundo a FAO. A China, Indonésia, Índia, Vietname, Bangladesh, Filipinas, República da Coreia, Noruega, Egito e Chile lideram o setor.
A produção da pesca e da aquicultura em 2022 aumentou para 223,2 milhões de toneladas em todo o mundo, mais 4,4% face ao ano de 2020, de acordo com a edição de 2024 do Estado Mundial da Pesca e da Aquicultura (SOFIA), um relatório da Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura (FAO).
O documento (264 páginas) foi apresentado durante o Evento de Alto Nível sobre a Ação dos Oceanos denominada “Imersos na Mudança”, que decorreu em San José, na Costa Rica, nos dias 7 e 8 de junho.
A grande novidade deste relatório, que é também um recorde, é que a produção aquícola de animais marinhos ultrapassou, pela primeira vez, a pesca de captura. A produção atingiu 185,4 milhões de toneladas de animais marinhos e 37,8 milhões de toneladas de algas.
“A FAO saúda as conquistas significativas alcançadas até agora, mas são necessárias mais ações transformadoras e adaptativas para fortalecer a eficiência, a inclusão, a resiliência e a sustentabilidade dos sistemas alimentares marinhos e consolidar o seu papel na abordagem da insegurança alimentar, na redução da pobreza e na governação sustentável”, afirmou o diretor-geral da FAO durante o evento, na Costa Rica.
Comentando a publicação deste relatório, QU Dongyu justificou as as razões porque a FAO defende a transformação azul. Este alto responsável, que nasceu em 1963 na província chinesa de Hunan, foi vice-ministro da Agricultura e Assuntos Rurais da China e foi reeleito em julho de 2023 para um segundo mandato na FAO, explicou que a transformação azul é “a forma de satisfazer os requisitos globais de melhor produção, melhor nutrição, um ambiente e uma vida melhor sem deixar ninguém para trás”.
10 países dominam a aquicultura
A FAO sublinha que o crescimento da aquicultura - atividade de criação de peixes, crustáceos e outros em viveiros aquáticos - indica a sua capacidade de contribuir ainda mais para satisfazer a crescente procura global de alimentos marinhos. A organização alerta, contudo, que a futura expansão e intensificação desta atividade “deve dar prioridade à sustentabilidade e beneficiar as regiões e comunidades mais necessitadas”.
O problema é que “muitos países de baixo rendimento em África e na Ásia não estão a utilizar todo o seu potencial”, alerta a FAO. Por essa razão, este organismo das Nações Unidades defende a implementação de “políticas específicas, transferência de tecnologia, desenvolvimento de capacidades e investimento responsável”. Eles serão instrumentos “cruciais para impulsionar a aquicultura sustentável onde esta é mais necessária, especialmente em África”, diz a FAO.
“UE ocupa posição diminuta” na aquicultura
Se esta produção recorde de alimentos marinhos mostra o potencial do setor no combate à insegurança alimentar e à desnutrição no mundo - o consumo global terá atingido 162,5 milhões de toneladas em 2021, segundo a FAO -, a União Europeia (UE) está muito aquém do que podia produzir.
Quem o diz é o Tribunal de Contas Europeu (TCE). Nas conclusões de uma auditoria ao setor divulgadas em novembro de 2023, o TCE concluiu que, “em 2020, a produção aquícola total da União foi de, apenas, 1,1 milhões de toneladas, o que representa menos de 1 % do total mundial”.
Isto, apesar de a aquicultura ser “um dos setores alimentares com crescimento mais rápido no mundo”, mas no qual “a UE ocupa uma posição diminuta”, lê-se no relatório daquele Tribunal, batizado com o sugestivo título “Política de aquicultura da UE: Maior financiamento da UE, mas produção estagnada e resultados pouco claros”.
O cenário é tanto mais constrangedor para a UE quando sabemos que a UE dispôs de 1,2 mil milhões de euros de apoios do Fundo Europeu dos Assuntos Marítimos e das Pescas (FEAMP) entre 2014 e 2020 e que novo Fundo Europeu dos Assuntos Marítimos, das Pescas e da Aquicultura (FEAMPA) tem uma dotação de 1,0 mil milhões de euros para o período de 2021-2027.
“O Tribunal conclui que, embora o quadro estratégico da União no domínio da aquicultura tenha melhorado nos últimos anos, o crescimento registado foi fraco”. E recomenda aos Estados-membros que “eliminem os obstáculos ao desenvolvimento sustentável da aquicultura da UE” e “melhorem a orientação dos fundos da União” para o setor, que se integram no âmbito da Política Comum das Pescas (PCP).
Portugal cresceu 4,8% na aquicultura
Em Portugal, de acordo com as últimas Estatísticas da Pesca (2023), a produção aquícola total em 2022 atingiu as 18 822 toneladas, o que significou um aumento de 4,8% face a 2021. Ainda assim, são quantidades muito abaixo das necessidades de consumo de pescado (55,6 kg/per capita/ano, mais do dobro do consumo médio na UE).
O Instituto Nacional de Estatística (INE) revela que, naquele ano, as vendas da aquicultura geraram uma receita de 159,8 milhões de euros, mais 1,7% relativamente a 2021.
Quanto à pesca, em 2023 estavam licenciadas 3 728 embarcações em Portugal, menos 147 que em 2022. Em todo o caso, o volume de descargas de pescado efetuado pelas organizações de produtores (OP) da pesca em 2023 aumentou 11,1% face a 2022, devido à maior captura de sardinha (+2,7%) e de outras espécies (+36,9%).
Em 2023 foram capturadas pela frota portuguesa 171 235 toneladas de pescado, mais 3,3% face a 2022. O pescado transacionado em lota gerou uma receita de 339 794 mil euros, mais 1,3% face a 2022.
A FAO lembra que os alimentos marinhos fornecem proteínas de alta qualidade – 15% das proteínas animais e 6% do total de proteínas em todo o mundo. Fornecem ainda nutrientes essenciais como ácidos gordos ómega-3, minerais e vitaminas, todos eles “cruciais para promover dietas saudáveis” e “melhorar a nutrição em todo o mundo”.