Portugal vive uma grave seca: estamos preparados para o regresso da chuva?
Portugal e uma significativa parte da Europa enfrentam graves consequências duma seca que se tem intensificado durante 2022. Mas, das secas à eventual chuva intensa, há risco de inundações em determinadas áreas. Quais os fatores que potenciam inundações no nosso país?
A seca é um fenómeno natural que pode ser definido como a diminuição da quantidade de água disponível numa dada área e período.
As secas são, para muitos cientistas, a maior catástrofe natural da atualidade, tendo em conta o número de pessoas afetadas à escala global, bem como a gravidade da carência alimentar e proliferação de doenças daí decorrentes e que surgem em vários países.
A seca enquanto risco
A seca não pode ser entendida somente como um risco hidrológico ou meteorológico, porque não depende exclusivamente do quantitativo pluviométrico ou do armazenamento de água disponível nos circuitos superficiais (rios, barragens, lagos) ou subterrâneos (aquíferos, lençóis freáticos) de água.
Constitui também um risco social, cultural, económico e político, porque reflete, muitas vezes, o desenquadramento entre o consumo e a disponibilidade. Ao desenvolver-se muito lentamente, e por revelar um “tempo de vida” muito prolongado, torna-se complicado compreender, e como consequência, avaliar e mitigar.
As definições de seca meteorológica variam conforme os países e os organismos. Segundo critérios estabelecidos pela Organização Meteorológica Mundial (OMM) em 1986, existe seca quando, numa área, a precipitação anual é inferior a 60% da normal durante dois anos consecutivos, em mais de 50% da superfície considerada.
Em Portugal, o índice utilizado pelo Instituto Português do Mar e da Atmosfera (IPMA) para classificar o nível de seca, é o Palmer Drought Severity Index (PDSI). Julho de 2022 apenas serviu para confirmar aquilo que já todos sabem: o país encontra-se “mergulhado” numa seca severa (55,2%) e extrema (44,8%) que a cada mês que passa, se acentua.
De acordo com estudos recentes (Dai, 2011), que tomam o PDSI como referência, é sugerido que a Europa tem experimentado nos últimos anos um maior número de condições extremas tanto de secura, como de precipitação intensa. Acontece que, em 2022, estamos sem dúvida a experimentar condições extremas de secura, como se vê no mapa acima.
Da seca ao risco de inundações
Todos sabemos, mesmo aqueles que não gostam de chuva, que a precipitação é um elemento climático fundamental para a vida nas suas diversas formas, mas é também responsável por elevados prejuízos à escala global, podendo ser responsável por danos materiais de milhares ou milhões de euros e por ceifar vidas.
Pode ser gerada sob a forma líquida, a tão conhecida chuva, ou sob forma sólida como a neve e o granizo. Quanto à intensidade, isto é, a quantidade de precipitação caída num determinado período do tempo, é uma das características mais importantes, essencial para a caracterização dos riscos relacionados com a chuva.
Por fim, a duração dos episódios de precipitação, independentemente da sua quantidade, pode, quando muito prolongada conduzir ao enchimento dos aquíferos, à diminuição da capacidade de infiltração, e, como consequência, à saturação, podendo provocar enormes danos e perdas, especialmente quando proporciona a ocorrência de cheias e inundações.
Apesar da seca severa e extrema que o nosso país vive, quando a chuva regressar a Portugal continental, e se se verificarem episódios de chuva prolongados no tempo e com demasiada intensidade num curto espaço de tempo – passíveis de desencadear cheias e inundações em áreas expostas ao risco de inundação – a questão que surge é se os territórios mais vulneráveis estão devidamente precavidos e adaptados, do ponto de vista dos seus solos, para este risco natural.
O risco climático das inundações rápidas ou flash floods em Portugal
Portugal possui um clima de base claramente mediterrânea, mesmo no Noroeste, onde as influências oceânicas são maiores, ou nas montanhas mais proeminentes, onde o frio e a neve são frequentes no inverno. Uma das principais características deste tipo de clima é a sua variabilidade. Efetivamente, existem verões quentes e secos e invernos suaves e pluviosos, algo que nos é dito empiricamente e confirmado cientificamente a partir da estatística, apesar de muitas vezes não ser assim tão evidente.
Se, por um lado, a seca exagerada é um risco climático típico do domínio mediterrâneo, também se sabe que, em ocasiões, o verão é brutalmente interrompido em agosto ou em setembro com chuvas torrenciais, em geral, esperadas para os dois meses subsequentes. Assim, a ocorrência de chuvas fortes fora da época normal é, também, um risco climático bem conhecido.
Risco hidrológico e a adaptação do Homem
Em Portugal, os riscos hidrológicos, enquadram-se nas características climáticas basicamente mediterrâneas do país. Todos os grandes rios peninsulares que cá desaguam (Minho, Lima, Douro, Tejo e Guadiana), tal como outros totalmente nossos (Mondego, Vouga, Sado), são detentores de um historial repleto de cheias com graves prejuízos ao longo das suas margens, especialmente em espaços urbanos.
Portanto, o risco hidrológico, especificamente o risco de inundação, foi sempre muito grande e o homem foi tendo de tomar as suas precauções, que é como quem diz, teve de se adaptar. A existência de condições climáticas favoráveis à ocorrência de inundações rápidas não significa, obrigatoriamente, que elas aconteçam.
Se acontecerem numa região onde os rios e as ribeiras apresentem características naturais que lhes permitem uma boa drenagem, não haverá problemas, dado que a região estará em equilíbrio com o seu clima.
Contudo, muitas vezes, as ribeiras e os rios já estão com caudais consideráveis e podem transbordar facilmente, ou, por outro lado, estando quase secos, entram numa fase de entulhamento, com leitos muito sobrecarregados de aluviões, não podendo providenciar um canal com capacidade suficiente para o escoamento rápidos de grandes volumes de água.
Como se não bastasse, nem todos os materiais rochosos de base apresentam o mesmo comportamento em relação à infiltração e à retenção da água. Além disto, aos problemas naturais, acrescentam-se os de origem humana, fazendo com que o risco hidrológico ganhe outra dimensão.
As mais catastróficas inundações rápidas em Portugal Continental e Regiões Autónomas
Por último, em Portugal, são relativamente mais frequentes as inundações rápidas (flash floods). As mais catastróficas em espaços urbanos tiveram lugar em Lisboa em 1967, no Funchal (ilha da Madeira) em 1993 e na Povoação (ilha de São Miguel, Açores) em 1986.