Portugal tem “um grave problema de acumulação de stock de vinho”. ANCEVE debate os desafios do setor

O setor do vinho atravessa “um momento de grande incerteza” em Portugal. A Associação dos Comerciantes e Exportadores de Vinhos e Bebidas Espirituosas debate os "Desafios e oportunidades para o setor do vinho – vem aí uma crise vitivinícola sem precedentes?", a 19 de setembro, no Porto.

vindimas
A deficiente remuneração dos viticultores é muito sentida em particular na Região Demarcada do Douro, que tem os custos de produção mais altos do país devido à orografia do território.

As vindimas de 2024 estão à porta e vão ser “das mais polémicas das últimas décadas, que recordaremos nos anos vindouros e a partir das quais o setor não será certamente o mesmo”.

A afirmação é da ANCEVE – Associação Nacional dos Comerciantes e Exportadores de Vinhos e Bebidas Espirituosas, que organiza uma conferência a 19 de setembro, na Universidade Portucalense, no Porto, para debater os "Desafios e oportunidades para o setor do vinho – vem aí uma crise vitivinícola sem precedentes?". O ministro da Agricultura, José Manuel Fernandes, encerrará a sessão.

O momento é “de grande incerteza” para o setor do vinho, refere Paulo Amorim, presidente da Associação, que faz questão de lembrar que, na última década, o setor “tem tido uma história de sucesso”, mas, ao mesmo tempo, “regista dificuldades de produção e colheitas cada vez mais imprevisíveis, devido às alterações climáticas”. Há mesmo “especialistas que vêm alertando para a possibilidade de uma crise vitivinícola sem precedentes”, refere o dirigente da ANCEVE.

928 milhões de euros de exportações

Apesar do contributo para o PIB nacional – as exportações de vinhos portuguesas atingiram 928 milhões de euros em 2023, embora tenham falhado a meta dos mil milhões definida pela ViniPortugal -, esta fileira “enfrenta desafios significativos”, refere a ANCEVE.

Num comunicado divulgado à comunicação social, a Associação liderada por Paulo Amorim fala da “quebra e alterações dos padrões de consumo”, da “instabilidade do contexto internacional”, da “dificuldade em conseguir aumentar o valor acrescentado” e da “deficiente remuneração dos viticultores”.

A remuneração das uvas aos produtores é muito sentida em particular na Região Demarcada do Douro, que tem os custos de produção mais altos do país devido à orografia do território.

A difícil situação dos pequenos e médios viticultores da Região Demarcada do Douro foi, aliás, denunciada na última semana pela Confederação Nacional da Agricultura (CNA).

Protesto dos viticultores a 7 de agosto, na Régua

A Confederação considera “inaceitável” o “corte brutal de 14 mil pipas (face à campanha de 2023)” no benefício (quantidade de mosto que cada viticultor pode destinar à produção de vinho do Porto), anunciada a 25 de julho pelo Instituto dos Vinhos do Douro e Porto (IVDP).

“Na Região Demarcada do Douro, os agricultores enfrentam preços muito baixos à produção de uva e de vinho (os mesmos de há 25 anos)” e sentem “enormes dificuldades de escoamento da produção”, cujos “custos de produção são elevadíssimos”, refere a CNA.

Como se não bastasse, “os grandes agentes da transformação e do comércio ameaçam não lhes comprar as uvas da vindima de 2024”, diz a Confederação, que convocou um iniciativa de reclamação e protesto de viticultores para o dia 7 de agosto, na Régua.

O problema não é, porém, exclusivo da Região Demarcada do Douro. Em todas as regiões vitivinícolas há “apelos constantes às destilações de crise e aos negócios por elas proporcionados”, assim como ao “controle relativo ao trânsito de vinhos” e às “importações de vinho a granel de baixo preço, que desvirtuam o mercado”, diz a ANCEVE.

Produção de vinho no Douro
A Confederação Nacional da Agricultura (CNA) considera “inaceitável” o “corte brutal" de 14 mil pipas (face à campanha de 2023) no benefício, que é a quantidade de mosto que cada viticultor pode destinar à produção de vinho do Porto.

A Associação também não esconde que são cada vez mais as “reclamações sobre as deficiências da fiscalização” no setor, não falando da “problemática em redor do arranque de vinhas” e do futuro do programa VITIS, o regime de apoio à reestruturação e reconversão das vinhas, financiado pela União Europeia. Até 2025, há 80 milhões de euros disponíveis para este fim.

Colheitas cada vez mais imprevisíveis

A Associação liderada por Paulo Amorim está ciente de estamos perante um “momento de grande incerteza” para a produção vitivinícola. E que todo o setor e as suas organizações devem “adaptar-se a estas novas realidades”, a ANCEVE reúne numa mesa redonda, a 19 de setembro, na Universidade Portucalense, no Porto, vários especialistas.

Estão já confirmados os presidentes da Viniportugal (Frederico Falcão), da Andovi (que congrega as entidades públicas e privadas a quem cabe representar, certificar e promover as Denominações de Origem Vitivinícolas Portuguesas) e das comissões vitivinícolas regionais de Lisboa (Francisco Toscano Rico), da Região dos Vinhos Verdes (Dora Simões), do Alentejo (Francisco Mateus) e da Beira Interior (Rodolfo Baldaia de Queirós). O presidente do IVDP - Instituto dos Vinhos do Douro e do Porto, Gilberto Igrejas, ainda não confirmou.

João Rebelo, docente da UTAD - Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro e Vice-Presidente da EUAWE - European Association of Wine Economists, Anselmo Mendes (produtor e enólogo), António Sucena Cláudio (Fórum Unidos pela Vinha de Portugal) e Filipa Melo de Vasconcelos, subinspetora-geral da ASAE - Autoridade de Segurança Alimentar e Económica, também integram os painéis de debate.