Portugal e Espanha “em simbiose”: a prioridade da agricultura é “a água e a mão de obra”

Os ministérios da Agricultura de Portugal e Espanha e as duas maiores confederações de agricultores dos dois países - CAP e ASAJA – estão de acordo: é preciso “definir estratégias conjuntas” a nível ibérico e, com isso, conseguir “uma voz mais audível em Bruxelas” e maior impacto nas políticas comunitárias.

Bovinos
Nos últimos quatro anos, assistiu-se a uma diminuição de perto de 500 mil cabeças de bovinos em Espanha e de 1.200 em toda a Europa. O IV Congresso Ibérico Agropecuário decorreu esta semana em Cáceres (Espanha).

Mais de três centenas de agricultores portugueses e espanhóis juntaram-se esta semana (18 e 19 de setembro) em Cáceres, cidade património mundial da UNESCO localizada na Extremadura espanhola, para o IV Congresso Ibérico Agropecuário, uma organização conjunta da Confederação dos Agricultores de Portugal (CAP) e da ASAJA – Associação Espanhola de Jovens Agricultores.

O ministro português da Agricultura, José Manuel Fernandes, cancelou, à última hora, a presença no evento ibérico, alegando a necessidade de “empenho do Governo na resolução dos incêndios” que grassaram em Portugal nos últimos dias e o “foco” que diz ser “exigido na articulação com as entidades” com competências na definição de resposta à crise suscitada pelos fogos.

João Moura, secretário de Estado da Agricultura, representou o Governo português em Cáceres. Sublinhando “os momentos muito difíceis” por que Portugal está a passar e apresentando "sinceros agradecimentos" ao governo de Espanha pelo apoio prestado no combate aos incêndios, o governante lembrou que “morreram bombeiros, cidadãos e muitos animais” e que largos milhares de hectares de terrenos agrícolas e florestais foram dizimados pelas chamas em vários concelhos do país, sobretudo no Norte e Centro.

“Um património ambiental que é de todos e que tanto custou a conquistar e a preservar" e que, “em minutos, em poucas horas" ficou destruído, disse João Moura perante os congressistas.

A “solidariedade” com Portugal manifestada no congresso pela representante do executivo espanhol - Begoña García Bernal, secretária de Estado da Agricultura e Alimentação - e pelo presidente da Associação Espanhola de Jovens Agricultores, Pedro Barato Triguero, rapidamente deu mote à principal conclusão do IV Congresso Ibérico Agropecuário: “a importância de Portugal e Espanha, à semelhança do que acontece noutras regiões da Europa como os países nórdicos e do Leste Europeu, estreitarem relações e trabalharem colaborativamente no setor agrícola”.

Tudo, dizem, para que seja possível “definir estratégias conjuntas” e “conquistar uma voz mais audível em Bruxelas e maior impacto nas políticas comunitárias”.

Álvaro Mendonça e Moura, presidente da CAP, deixou uma palavra de solidariedade para com “todos os agricultores e produtores florestais portugueses que foram afetados pelos recentes incêndios que assolaram o país” e também agradeceu “a importante ajuda que Espanha concedeu no combate aos fogos”. Mas, logo a seguir, reorientou o discurso, olhando para o futuro e para as políticas europeias para a Agricultura que se desenham após as eleições de 18 de julho, afirmando que a mudança a que assistimos na União Europeia “nos traz esperança”.

Ursula von der Leyen foi reeleita presidente da Comissão Europeia pelos membros do Parlamento Europeu (719 deputados) e vai liderar a Comissão por um novo mandato de cinco anos (2024-2029). Christophe Hansen (nascido a 21 de fevereiro de 1982, no Luxemburgo) será o novo comissário para a Agricultura e Alimentação.

Pecuária
Mais de três centenas de agricultores portugueses e espanhóis juntaram-se esta semana (18 e 19 de setembro) em Cáceres, cidade património mundial pela UNESCO localizada na Extremadura espanhola, para o IV Congresso Ibérico Agropecuário.

Na sessão de encerramento do Congresso Ibérico Agropecuário, o presidente da CAP mostrou-se confiante no trabalho que se vai seguir à apresentação do relatório final com as conclusões do Diálogo Estratégico sobre o Futuro da Agricultura.

Trata-se de um documento entregue neste mês de setembro a Ursula von der Leyen pelo responsável pelo grupo de trabalho criado para o efeito, Peter Strohschneider, e que é dirigido à Comissão Europeia, ao Parlamento Europeu, aos Estados-membros e a todas as partes interessadas no mundo agrícola.

São “alguns primeiros sinais positivos no que diz respeito à defesa dos agricultores, quando comparados com o trabalho realizado nos últimos anos”, disse Álvaro Mendonça e Moura.

“Unidas, com posições concertadas e objetivos comuns, a CAP e a ASAJA devem dizer aos seus governos que trabalhem juntos pelo futuro da agricultura”, prosseguiu o presidente da CAP, que já foi embaixador de Portugal em Madrid.

ASAJA (Espanha) em sintonia com a CAP (Portugal)

E o presidente da ASAJA está em sintonia com o presidente da CAP. “Desafios comuns necessitam de soluções conjuntas”, disse Pedro Barato Triguero, lembrando que este congresso, “alicerçado na união da CAP com a ASAJA, decorreu perante uma recém-formada legislatura europeia, o que apresenta uma grande oportunidade de mudança pela qual temos de trabalhar, defendendo sempre os interesses da Península Ibérica, mas, também, do Sul da Europa”.

As duas confederações estão igualmente sintonizadas na “urgência em garantir preços justos e melhores condições de investimento em toda a cadeia de valor, em promover o desenvolvimento e inovação no setor e em formar os agricultores para a agricultura do futuro, que se prevê cada vez mais tecnológica”, referiu a CAP em comunicado divulgado no final do congresso.

Créditos de Carbono e agricultura regenerativa

A necessidade de gerir e armazenar de forma mais eficiente a água, as potencialidades da agricultura regenerativa e a oportunidade dos créditos de carbono para a atingir a neutralidade das emissões de dióxido de carbono até 2050 na União Europeia também estiveram em destaque no IV Congresso Ibérico Agropecuário. CAP e ASAJA concordam com o princípio “poluidor-pagador”, mas deixam um aviso: “o despoluidor deve ser recompensado". E defendem "o papel preponderante da agricultura enquanto agente de mitigação das alterações climáticas”.

Nos últimos quatro anos, assistiu-se a uma diminuição de perto de 500 mil cabeças de bovinos em Espanha e de 1.200 em toda a Europa, referiu a ASAJA.
Isabel Garcia Tejerina, ex-ministra da Agricultura, Pesca, Alimentação e Meio Ambiente de Espanha e que proferiu uma intervenção no arranque do congresso, lembrou que a pandemia de covid-19 comprovou a importância das cadeias de valor estratégicas, como a agricultura. “O meu desejo é que cada uma das forças que constroem o futuro tenham a ambição que o setor agroalimentar espanhol e português merece”, concluiu.

"Não há futuro sem a agricultura"

Begoña García Bernal, secretária de Estado da Agricultura e Alimentação de Espanha, presente na sessão de encerramento do congresso ibérico, deixou a garantia aos portugueses e espanhóis: "Não há futuro sem a agricultura" e "a ganaderia [pecuária] extensiva é estratégica para Espanha".

A governante defendeu, por isso, "uma frente comum" entre Portugal e Espanha para defender aos interesses da agricultura ibérica. "Juntos seremos mais fortes", garantiu.