Plantar árvores resolve tudo? Entenda porque é que esta ideia pode estar a atrapalhar o combate à crise climática

Apesar de parecer a solução perfeita, o plantio de árvores pode estar a atrapalhar o avanço de outras formas eficazes de remoção de carbono, alertam investigadores. A confiança excessiva no "verde" pode limitar o combate climático.

árvores, reflorestação
A preferência global pela reflorestação: técnica mais reconhecida e apoiada entre várias opções de remoção de carbono, independentemente da região ou nível de desenvolvimento.

Plantar árvores é quase um sinónimo de salvar o planeta. Campanhas de reflorestação viralizam nas redes sociais, empresas prometem “neutralizar” as suas emissões com projetos verdes, e até governos apostam na natureza para combater o aquecimento global.

Mas será que confiar tanto nesta solução aparentemente simples não está a desviar-nos de alternativas igualmente, ou até mais, necessárias?

Uma nova onda de estudos mostra que o entusiasmo com as árvores pode estar a tornar-se um problema. A ideia de que plantar florestas basta para lidar com as alterações climáticas está tão presente no imaginário coletivo que acaba por ofuscar outras formas de remoção de carbono da atmosfera. E o que parece uma escolha inofensiva, na verdade, pode comprometer a construção de um plano climático mais robusto, diversificado e eficiente.

A sedutora ideia de "voltar à natureza"

As árvores têm um apelo quase mágico: são vistas como puras, naturais, e conectadas à vida. Quando se fala em combater o excesso de carbono na atmosfera, é comum que a primeira imagem que venha à mente seja uma floresta verdejante. Este vínculo emocional é tão forte que, em investigações feitas em mais de 30 países, o plantio de árvores foi citado espontaneamente como a principal solução climática, mesmo quando os entrevistadores tentavam evitar este tema para discutir outras técnicas.

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O coletivo associa as árvores a soluções climáticas naturais e seguras.

Este “efeito árvore” cria uma barreira invisível. Pessoas comuns têm mais dificuldade para aceitar tecnologias como captura direta de carbono do ar ou uso de rochas para absorver CO₂, porque estas alternativas parecem artificiais, caras ou até assustadoras. Já as árvores, além de familiares, transmitem sensação de segurança e ação imediata. É a velha ideia de que “não se mexe com a natureza”.

Nem tudo o que é verde é simples ou suficiente

O problema é que confiar exclusivamente no plantio de árvores pode criar uma falsa sensação de solução. Primeiro, porque o planeta simplesmente não tem espaço suficiente para florestas que capturem todo o carbono que estamos a emitir.

Estima-se que só os compromissos climáticos atuais exigiriam 500 milhões de hectares de terra, o equivalente a toda a União Europeia.

Além disso, as árvores não são um armazenamento permanente de carbono. Podem morrer, ser queimadas, atacadas por pragas ou cortadas, libertando novamente o CO₂ que tinham absorvido. É por isso que muitos cientistas alertam: precisamos de uma combinação de soluções, que incluam também métodos mais duradouros, como:

  • Captura direta de CO₂ com armazenamento geológico
  • Bioenergia com captura e armazenamento (BECCS)
  • Intemperismo de rochas com capacidade de absorver carbono
  • Técnicas biológicas inovadoras, como biochar e a recuperação de solos e áreas húmidas ricas em matéria orgânica.

A diversidade é a chave para reduzir riscos, garantir estabilidade e ganhar tempo no combate ao aquecimento global.

O papel do Brasil e a importância de mudar o foco

O Brasil, devido à sua cobertura florestal e biodiversidade, ocupa uma posição de destaque nesse debate. Não há dúvida de que conservar e recuperar biomas como a Amazónia e o Cerrado é essencial para o equilíbrio climático global. Mas também é fundamental entender que só as árvores não bastam.

Carbono, CO2, mudança climatica
Amazónia: um dos maiores sumidouros naturais de carbono do planeta, essencial para o clima global, mas a sua preservação, sozinha, não resolve a crise climática.

O país precisa de investir em ciência, inovação e políticas públicas que considerem um leque mais amplo de soluções climáticas. Isto inclui explorar novas tecnologias, incentivar investigações sobre técnicas alternativas de remoção de carbono e, principalmente, envolver a população num debate mais informado e menos romantizado.

Plantar árvores é importante, mas acreditar que isto resolve tudo pode ser uma armadilha perigosa. O verdadeiro desafio é encarar a complexidade da crise climática com soluções à altura, e isso exige ir além do óbvio verde.

Referência da notícia

Carbon removal beyond the trees. 2 de abril, 2025. Cox, E., Low, S., Baum, C.M. et al.