No Carnaval, os cientistas alertam para os perigos do glitter para o ambiente

A festa mais aguardada do ano em vários pontos do país começou oficialmente na semana passada, enchendo as ruas de música, brilho e alegria. Mas há um risco para o ambiente.

carnaval; purpurina
A purpurina pode representar risco para a saúde, especialmente devido ao contacto com a pele. (Imagem criada por IA)

Das fantasias que muitos utilizam até às escolas de samba, um dos itens mais usados para dar um toque especial a qualquer fantasia de carnaval é a purpurina.

Também conhecida como glitter, a purpurina é um conjunto de partículas minúsculas que refletem a luz e que se prendem a praticamente qualquer superfície. Mas, além da dificuldade em livrar-se dela depois da folia, este pozinho cintilante esconde um lado obscuro: é nocivo ao meio ambiente e levanta preocupações sobre impactos à saúde humana.

Este pozinho cintilante esconde um lado obscuro: é nocivo ao meio ambiente e levanta preocupações sobre impactos à saúde humana.

Uma equipa de investigadores, do Departamento de Química da PUC-Rio, do Brasil, conduziu um estudo detalhado sobre o glitter. Investigou as concentrações de metais e outros elementos químicos presentes neste material, para além de como acontece a sua absorção pelo corpo quando entra em contacto com a pele, e qual o seu comportamento em ambientes aquáticos.

O perigo não é igual em todas as purpurinas

A ideia para o estudo surgiu da preocupação com os microplásticos no ambiente, pois a maioria das purpurinas é composta, basicamente, por plásticos com dimensões menores que 5 milímetros. Esta é feita principalmente de polímeros como o polietileno (PE) e o cloreto de polivinila (PVC).

Por este pó ser tão colorido e cintilante, os investigadores suspeitaram que também poderia conter corantes à base de metais, que refletem a luz e por isso assumem o seu efeito vibrante. O problema destes pigmentos é que estes adicionam um risco extra de contaminação, tanto para o ecossistema quanto para a saúde humana, pelo contacto com a pele.

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Purpurina em excesso, em grandes áreas do corpo, poderão aumentar o risco de intoxicações. (Imagem criada por IA)

Embora os estudos sobre os impactos de microplásticos no ambiente ainda sejam relativamente novos, os efeitos nocivos de certos metais já estão amplamente documentados.

No entanto, a regulação desses compostos ainda é limitada para muitos produtos, e mesmo quando há legislação, a fiscalização pode não ser efetiva, considerando a grande quantidade de novos itens lançados no mercado todos os dias. Assim, para este estudo, a equipa comprou amostras de glitter vermelho, azul e verde que foram analisadas em laboratório.

De acordo com este estudo, a composição química do glitter depende, principalmente, da cor. De facto, são utilizados metais e outros elementos químicos refletores. As amostras de cor verde tinham maior concentração de bromo (123 mg/kg), enquanto as vermelhas continham mais titânio (116 mg/kg). Embora o titânio não seja responsável pela cor vermelha, tem um alto índice de refração, aumentando a intensidade e o brilho.

Além disso, o titânio, especialmente na forma de dióxido de titânio (TiO₂), é frequentemente empregado como corante branco e aditivo de alimentos, mas os seus efeitos tóxicos em humanos ainda são pouco conhecidos, sendo considerado atualmente um poluente emergente, que afeta, principalmente, ambientes marinhos.

máscara carnaval
Apesar dos limites dos metais estarem a ser cumpridos, continua a haver risco para o meio ambiente.

Apesar disto, os níveis de todos os metais encontrados nas amostras de glitter analisadas estavam dentro dos limites de segurança estabelecidos pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA).

Foram simuladas situações comuns de exposição, como o contacto com a pele e com o suor humano. As concentrações de metais e metalóides libertadas pelo glitter nestes cenários não foram suficientes para apresentar um risco imediato à saúde, principalmente porque a quantidade usada por cada pessoa não costuma ser muito grande. Porém, não se pode garantir que não existam riscos de intoxicação caso alguém pinte uma grande área do corpo com glitter.

O que acontece quando nos livramos das purpurinas do nosso corpo?

Assim que o Carnaval acaba, o glitter também sai de cena. Mas para onde vai? Geralmente, ao lavar o rosto, o corpo ou a roupa, a purpurina é levada para o sistema de esgoto. Por serem partículas muito pequenas, passam despercebidas pelos sistemas de tratamento de água convencionais e são libertadas diretamente nos rios, lagos e oceanos. Estas partículas podem persistir no ambiente durante décadas, fragmentando-se em pedaços ainda menores, mas sem desaparecer completamente.

Maquilhagem de carnaval
Retirar as purpurinas do nosso corpo com algodão é melhor opção, quando comparado com o uso de água para o mesmo efeito. (Imagem criada por IA)

No ambiente aquático, o glitter contribui para o sufocamento deste ecossistema e pode agir como uma esponja de poluentes. Este pode absorver substâncias químicas – tóxicas ou não –, como antibióticos, pesticidas, hidrocarbonetos e metais potencialmente tóxicos, transportando-as por longas distâncias. Ao longo do tempo, estes contaminantes podem passar adiante na cadeia alimentar e chegar aos humanos.

Apesar deste estudo indicar que o glitter não representa um risco significativo à saúde humana por contacto com a pele e que a quantidade usada individualmente seja considerada segura, o volume total descartado durante o Carnaval pode causar uma contaminação ambiental aguda significativa.

O que fazer para evitar males maiores?

O ideal seria não usar. Mas tentar remover as purpurinas ao máximo com lenços de papel ou algodão seco e descartar no lixo é uma opção mais sustentável do que passar o corpo por água. Embora isto não garanta que os resíduos não acabem em aterros e, eventualmente, no meio ambiente, pelo menos evita a libertação direta no sistema de esgoto.

Já existem opções no mercado que oferecem o mesmo brilho, mas com menor impacto ambiental. O glitter biodegradável, feito de celulose vegetal ou minerais naturais, é uma alternativa promissora. Este degrada-se rapidamente no ambiente, sem libertar poluentes tóxicos.

Referência da notícia

J.V. Meirelles, R.F. de Almeida, A.J. Morgado, T.B. de Castro, R.C.C. Rocha, R.A. Hauser-Davis, T.D. Saint’Pierre. Metal and metalloid content, bioavailability and sorption processes in glitter and raw glitter materials and associations with human and ecological risk concerns. Journal of Trace Elements in Medicine and Biology (2024).