Frio em Portugal: que fenómenos meteorológicos nos têm afetado com este super anticiclone?
O território continental português conheceu nos últimos dias rigorosas temperaturas, sobretudo noturnas, conjugadas com um conjunto de fenómenos meteorológicos notáveis e particularmente belos. Visitamo-los aqui, tal como o histórico de extremos meteorológicos. Venha conhecê-los!
Os últimos dias em Portugal Continental têm sido particularmente frios e secos, principalmente nos territórios do interior, em especial em regiões depressionárias e vales e nas zonas mais abrigadas, onde os termómetros têm vindo a registar temperaturas negativas.
Há que assinalar, ainda assim, a exceção do dia de quarta-feira (20), onde se registou precipitação e nebulosidade em diversos locais das regiões Norte e Centro, em especial em concelhos das regiões do Minho e Douro Litoral.
Apesar dos dias soalheiros, as baixas temperaturas têm sido sentidas sobretudo no período noturno, onde se tem registado um acentuado arrefecimento. As amplitudes térmicas têm-se revelado bastante consideráveis, em alguns locais superiores a 15 ºC.
O frio tem sido tal que obrigou o Instituto Português do Mar e da Atmosfera a emitir um Aviso Amarelo para os distritos de Bragança, Vila Real, Guarda e Viseu. Estes avisos foram, posteriormente, estendidos também para outros fenómenos, como o nevoeiro (Aviso Laranja atualmente).
Como temos noticiado na Meteored Portugal, o Continente tem sido afetado por um invulgar e super anticiclone que tem revelado um comportamento quase estacionário, posicionado sobre o Atlântico Norte, e que vai exibindo valores de pressão atmosférica recorde para esta temporada.
Este tempo anticiclónico tem potenciado alguns fenómenos meteorológicos, tais como a formação de geadas, neblinas e nevoeiros densos, típicos em toda a geografia continental e outros particularmente mais majestosos como o sincelo, mais comuns no Nordeste Transmontano e Beira Alta.
Estes eventos têm sido testemunhados nos últimos dias, em particular nas regiões do Douro, Nordeste Transmontano e Beira Alta. Todos eles estão associados a inversões térmicas, típicas de situações de forte estabilidade atmosférica.
Têm tendência para ocorrer nas noites de inverno, tal como aconteceu na passada noite de 19 de dezembro na cidade raiana do Sabugal, onde se registaram 7,8 ºC negativos, ou em Bragança onde a temperatura não foi além de -1,1 ºC. Corresponde, no fundo, a uma alteração na natural posição das camadas atmosféricas, ou seja, o ar frio deposita-se em altitudes mais baixas, enquanto que o ar quente se vai assumir em altitudes mais elevadas.
Esta realidade é tão mais evidente quanto maior for o bloqueio anticiclónico. A concretitude dos factos mostra-nos que estamos perante um fortíssimo e pouco usual bloqueio, ou seja, as altas pressões têm empurrado o ar frio junto ao solo, aprisionando-o nestas altitudes, principalmente no período noturno e no meio da manhã. Já o ar quente fica retido nas camadas mais altas da atmosfera.
A este fenómeno dá-se, como se disse, o nome de inversão térmica. Esta é normalmente quebrada à medida que o sol gradualmente aquece ou devido ao vento, que vão permitir um normal fluxo e mistura das massas de ar.
Também associado aos centros de altas pressões e à inversão térmica está aparecimento de outro fenómeno de especial espectacularidade visual, o sincelo. Confundido por geada ou neve, este fenómeno natural dá-se em situações de nevoeiro quando a temperatura regista valores inferiores a 0 ºC, abaixo do ponto de congelação.
O sincelo acontece quando o arrefecimento das superfícies sólidas é suficiente para condensar ou solidificar a humidade do ar, formando-se cristas de gelo suspensos, pela congelação da água do orvalho, e que é bem visível nas beiradas dos telhados, na vegetação arbórea e arbustiva, mas também na herbácea.
Assistimos, um pouco por toda a extensão do Nordeste Transmontano e da Beira Alta a imagens de encantadoras paisagens que relatam este fenómeno meteorológico natural, como o pequeno vídeo do tweet acima é testemunho. É expectável que nos próximos dias estes fenómenos possam vir a ocorrer novamente nas mesmas geografias.
E quais serão os lugares historicamente mais frios de Portugal?
Apesar de em situações de grande estabilidade se darem inversões térmicas, ainda é em altitude, na ausência destas, e em casos de instabilidade atmosférica, que se registam as mais baixas temperaturas em Portugal Continental. Talvez porque não existam medições nas regiões mais depressionárias e nos vales mais encaixados, não se encontrem valores tão baixos.
É expectável que na Torre, 493 metros acima de onde está instalada a estação meteorológica das Penhas da Saúde, os valores tenham sido ainda mais baixos, porém não há registo oficial que o comprove.
O ano de 1954 é de muito boa memória para os algarvios, já que vez jamais se repetiu um nevão de dimensão idêntica na região como no mês de fevereiro desse ano.
Já o mês de fevereiro de 1956 é de particular relevância histórica, uma vez que marca a mais intensa e mais longa vaga de frio alguma vez documentada no nosso país, fazendo deste o mês mais frio de sempre desde que há registos.
Por dois dias daquele ano (11 e 12 de fevereiro), à exceção do Cabo Carvoeiro e de Sagres, o território continental apresentou valores de temperatura mínima inferior a 0 °C. Foram observados valores de temperatura mínima inferiores a -10 °C nas regiões do interior Norte e Centro: -16.0 °C nas Penhas da Saúde; -14.0 °C na Lagoa Comprida; -13.3 °C nas Penhas Douradas; -12.3 °C na Guarda; -10.8 °C em Montalegre; e -10.0 °C em Miranda do Douro, Moimenta da Beira e Arouca/Serra da Freita.
Certo é que estes valores serão cada vez mais invulgares e esporadicamente excecionais, num mundo em mutação climática, marcado pelo constante e gradual aquecimento das temperaturas médias globais. Não é, no entanto, pelo menos motivo, possível, de todo, descartar a existência de tais fenómenos meteorológicos, que se esperam ser menos extensos no tempo e em número, mas mais intensos em grau.