Como está a vinha portuguesa a lidar com as alterações climáticas?
A produção vinícola é dependente do clima e do ambiente em que a vinha está localizada. Por este motivo, com as grandes alterações climáticas que estão a acontecer nos últimos anos, essa produção está a ser ameaçada, sobretudo no Douro Superior e no Alentejo.

As alterações climáticas ameaçam a produção vinícola do Douro Superior e do Alentejo e mudarão a paisagem vinícola, que é hoje Património da Humanidade. Dentro de apenas 30 ou 40 anos, e até 2100, a paisagem do Douro Superior sofrerá modificações com a deslocalização das vinhas. A cultura vinícola poderá ser inviável se não forem tomadas medidas, tais como a rega, embora a água seja cada vez mais escassa.
Com o aumento global das temperaturas, a diminuição das quantidades de precipitação e, consequentemente, o aparecimento de secas mais frequentes e intensas, sobretudo na primavera e no outono, grande parte das sub-regiões e denominações de origem dos vinhos do país ficará afetada.
Portugal é hoje um dos principais produtores mundiais de vinho e, nos cenários de alterações climáticas mais gravosos, a viticultura pode ser inviável, pois as temperaturas elevadas afetam o ciclo vegetativo da planta e a fotossíntese. Além disso, poderá existir falta de água devido à diminuição das chuvas e ao aumento da evapotranspiração.
Secura extrema
Espera-se um futuro com condições mais quentes e secas em todo o país. As áreas húmidas diminuirão substancialmente e desaparecerão, mesmo no cenário mais severo. As regiões do Sudeste e Douro superior terão condições de extrema secura.
No Douro Superior e no Alentejo projeta-se seca severa. A irrigação, que não é tradicional na vinha, será exigível para manter a produção e a qualidade próximas dos níveis atuais. Se a rega for inviável, devido à escassez crescente de água, as condições para a viticultura serão inadequadas.
Já nas regiões dos Vinhos Verdes, Lisboa e Beira Atlântico, as mudanças poderão beneficiar parcialmente com climas mais quentes.
CBS Video Report: Europes wine industry being altered by climate change https://t.co/W6AckbIgAG - Climate change is jolting the #wine industry. Lesley Stahl reports on how the economics, practices and in some cases even the flavors of wine are being altered by shifting #climate
— Fresh Clean Water (@FreshCleanWater) May 25, 2022
De acordo com João Carlos Santos, os desafios são muitos, mas Portugal, nesse aspeto, está melhor do que outros países, porque não tem a tradição do vinho monocasta, o que confere uma plasticidade, uma adaptabilidade muito grande.
Contudo, a tendência parece ser a de consumir vinhos cada vez mais frescos, mais leves, e isso é uma tendência errada, do ponto de vista das alterações climáticas, porque está previsto que, com climas mais quentes e mais secos, a tendência é a de criar vinhos mais encorpados, mais fortes, com maior teor alcoólico, com menor acidez, ou seja, as pessoas terão de adaptar os seus hábitos de consumo ao clima do futuro.
O efeito das alterações climáticas e o exemplo francês
Nos primeiros meses do ano de 2022, Portugal atravessou uma das piores secas de que há registo (ainda está em curso), e os produtores das regiões do Douro e do Alentejo alertaram para um efeito desolador na colheita deste ano.
Contudo, diz a ACIBEV - Associação de Vinhos e Espirituosas de Portugal, a seca, até ao momento não está a ter impacto e as previsões são de que vai ser um ótimo ano vitivinícula, desde que não se registe um fenómeno climático extremo, como aconteceu em França.

No início do mês de junho, a comuna francesa de Chablis, famosa pela sua uva Chardonnay, acordou com videiras cobertas de geada que se estendiam pelas encostas com temperaturas de -5 ºC. Um fenómeno que, no ano passado, acabou por causar danos na mesma região - na ordem dos dois mil milhões de euros - e que o governo francês apelidou de "a maior catástrofe agrícola do século XXI”.
Para contrariar os efeitos da natureza, os agricultores acenderam durante a noite velas entre as vinhas, temendo que a geada tardia destruísse as uvas nascidas em março, mês que registou em França temperaturas acima dos 20 graus, muito acima do normal para a época.
Para Portugal, inovar importa
Em Portugal, garante Bernardo Gouvêa, presidente do IVV, o setor está muito atento ao desafio causado pelas alterações climáticas, e está consciente de que inovar, importa.
Os viticultores estão mais predispostos à automatização e à digitalização, assumindo a sustentabilidade, uma relevância significativa nas tomadas de decisão que diariamente são impostas à gestão, consciente e responsável, das explorações agrícolas.