Ciclone de 1941: a tempestade explosiva que varreu Portugal há 82 anos
Foi há 82 anos que Portugal continental foi violentamente atingido por uma depressão muito cavada (ciclogénese explosiva). Esta trágica tempestade, ainda é, à data de hoje, a mais poderosa e mortífera tempestade desde que há recolha de registos meteorológicos. Conheça o Ciclone de 1941!
Em 15 de fevereiro de 1941, a geografia continental de Portugal viveu aflitivamente a influência de uma depressão muito cavada, que sofreu um processo de ciclogénese explosiva.
Ao deslocar-se de sudoeste para nordeste ao longo de toda a costa portuguesa, aquele que ficou conhecido como o “Ciclone de 1941” na história climático-meteorológica do nosso país, provocou ventos muito fortes com rajadas com força de furacão e elevadas quantidades de chuva. Causou numerosas vítimas humanas e avultados prejuízos materiais. De acordo com informações relatadas na época, os danos causados foram avaliados em 1 milhão de contos (metade do orçamento nacional da altura!).
Como nasceu esta depressão?
Esta depressão nasceu em condições que a permitiram evoluir e cavar até atingir a designação de ciclogénese explosiva. Por definição, uma ciclogénese denomina-se de explosiva quando a pressão atmosférica desce, pelo menos, 1hPa por hora durante um período de 24 horas.
Ora, isto é comprovado pela cartografia sinótica de reanálise que mostra que os valores de pressão desceram acentuadamente em 24h, nomeadamente na estação meteorológica de Coimbra. De acordo com dados do IPMA, a variação da pressão em 24h foi de 48,5 hPa, tendo-se registado entre as 15h do dia anterior e as 15h do dia 15, uma variação de 987,0 hPa a 938,5 hPa, respetivamente.
De acordo com um estudo publicado em Cadernos de Geografia (FLUC), “os episódios de vento particularmente forte, como o que ocorreu em Portugal continental (e metade Noroeste da Península Ibérica) no dia 15 de fevereiro de 1941, ou se tratam de situações de carácter local, de dimensão espacial e temporal restrita, associadas a forte instabilidade vertical da troposfera e a consequentes células nebulosas de grande desenvolvimento vertical (caso de tornados ou de downbursts), ou se generalizam a um espaço mais vasto, durante várias horas”, como foi o caso do “Ciclone de 1941”.
Ainda decorria o dia 14 de fevereiro quando uma vasta depressão, com 980 hPa no núcleo, centrada a oeste da Irlanda, estendia-se por grande parte do Atlântico Norte, alargando-se até à Europa Ocidental e Península Ibérica, assumindo a forma de uma corrente perturbada de oeste.
Meio dia mais tarde, à meia-noite do dia 15, a amplificação de uma ondulação ciclónica do fluxo em altitude originou uma onda baroclínica entre os Açores e a Península Ibérica, que acaba por se traduzir num processo de forte ciclogénese no Atlântico, a ocidente de Portugal continental. À superfície, a ciclogénese resultou no aparecimento de um núcleo secundário, com 990hPa no centro, no limite meridional da depressão principal que continuava a situar-se a oeste da Irlanda.
Com o aumento da amplitude da ondulação do fluxo em altitude, ocorreu também uma intensificação forte da convergência sobre Portugal continental e a parte mais próxima do Atlântico. Como consequência, a ciclogénese adquire características que a tornam explosiva.
O aprofundamento do núcleo depressionário entre os Açores e a Península Ibérica, durante o seu trajeto em aproximação à costa ocidental portuguesa foi de 35 hPa em 24h (em Coimbra até mais do que isso, de acordo com valores de pressão registados ao nível da estação), o que revela de forma evidente o seu carácter explosivo, comprovado pelo cavamento rápido da depressão. Como se não bastasse, toda esta atividade ciclogenética acarretou consigo velocidades do vento impressionantes, com força de furacão.
De acordo com o IPMA, “em Lisboa foi registado um valor de rajada de 129 km/h, Coimbra registou 133 km/h e no Porto, Serra do Pilar, 167 km/h, momento em que o anemómetro se avariou”.
Os efeitos à escala nacional desta mortífera tempestade
O fatídico 15 de fevereiro de 1941 destacou-se, tragicamente, pelo elevado número de vítimas mortais, superior a 100, e o número indefinido de feridos.
Aliás, de acordo com o avançado por outro estudo, “Muitas das vítimas mortais, em especial, em Lisboa, Alhandra, Sesimbra, Alhos Vedros terão sido por afogamento devido a inundações que ocorreram nas áreas ribeirinhas. Estas inundações terão resultado da conjugação de múltiplos fatores, destacando-se, entre eles, a sobreelevação do nível do mar ou maré de tempestade. Esta sobreelevação refere-se à subida temporária do nível do mar resultante da existência de condições meteorológicas anómalas, nomeadamente de variações no campo da pressão atmosférica e/ou da ação de ventos fortes e prolongados".
Além dos falecidos, os prejuízos nas telecomunicações e noutras infraestruturas foram enormes, “alguns irreparáveis, que comprometeram seriamente a economia nacional”, segundo o Boletim Mensal, Ministério da Economia, Serviços de Meteorologia, Nº50, 2ª série, Fevereiro de 1941. As comunicações telegráficas e telefónicas com Lisboa ficaram interrompidas durante vários dias, e nalgumas áreas da geografia só foram retomadas no dia 20 de fevereiro. Há também relatos que referem cortes no fornecimento de eletricidade e graves prejuízos em fábricas, habitações e monumentos.
Como se não bastasse, a lista de danos ainda teve a acrescentar vários cortes em linhas ferroviárias, provocados por acidentes, alguns dos quais com vítimas mortais, ora devido a choque de comboios (2 vítimas mortais); ora devido à queda de uma árvore (3 mortes). A rede viária e elétrica foi, também, afetada principalmente devido à queda de árvores. Centenas de embarcações afundaram-se e os estragos à escala florestal tiveram como consequência centenas de milhares de árvores arrancadas.