Praga de gafanhotos surge aos biliões na África Oriental
Biliões de gafanhotos que surgiram no leste de África são fruto da alterações climáticas extremas e podem ser catastróficas para esta região que ainda sofre com a seca e as inundações mortíferas, segundo os especialistas.
Um denso aglomerado de insetos vorazes espalhou-se da Etiópia e da Somália para o Quénia, naquela que foi a pior infestação da região em décadas. A Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação (FAO) estima que o enxame no Quénia alcançou cerca de 2.400 quilómetros quadrados, o que significa que pode conter até 200 biliões de gafanhotos, cada um dos quais consome o seu próprio peso em comida diariamente.
Esta invasão de gafanhotos é a maior da Etiópia e da Somália em 25 anos e a maior do Quénia em 70 anos, de acordo com a FAO. Se esta praga não for controlada, o número de gafanhotos poderá crescer 500 vezes até junho, espalhando-se para outros países como Uganda e Sudão do Sul, e devastando plantações e pastagens numa das regiões mais pobres e vulneráveis do mundo.
Isto pode levar a "um grande problema de segurança alimentar", disse Guleid Artan, do grupo de especialistas regionais do Centro de Previsão e Aplicações Climáticas (ICPAC), numa entrevista coletiva em Nairobi. Os gafanhotos foram, segundo Artan, o sintoma mais recente de condições extremas que fizeram com que 2019 começasse com uma seca e terminasse numa das estações mais chuvosas em quatro décadas nalguns territórios, com inundações a matar centenas na parte leste inteira de África.
Dipolo do Oceano Índico, o responsável pela praga
Artan disse que a invasão ocorreu após um ano de eventos meteorológicos extremos, incluindo oito ciclones na África Oriental, a maioria num só ano desde 1976. Isto ocorreu devido ao oeste do Oceano Índico, mais quente, uma condição climática conhecida como dipolo do Oceano Índico, que por sua vez levou a uma seca severa na Austrália que está a debater-se com os seus próprios extremos: incêndios, tempestades de granizo e areia. "Sabemos que a África Oriental é uma das áreas mais vulneráveis às alterações climáticas. Sabemos que esta região verá mais extremos", avisou.
Um especialista na conferência de imprensa em Nairobi tranquilizou os participantes, dizendo que a invasão de gafanhotos após a seca e as inundações não são um presságio do "fim dos tempos" bíblico. Enquanto que os agricultores tiveram alguma sorte, porque as suas colheitas amadureceram ou foram colhidas na época certa, os pastores enfrentam outro golpe duro, pois a vegetação dos seus animais está a ser consumida pelos gafanhotos famintos.
Artan disse que os pastores estavam só agora a emergir de três anos de seca, e que a recuperação de um período seco demora normalmente até cinco anos. Se os gafanhotos não forem controlados no início da próxima plantação e estação das chuvas, normalmente em março, os agricultores terão as colheitas dizimadas.
Insegurança alimentar na região
Stephen Njoka, diretor da Organização de Controlo de Gafanhotos do Deserto da África Oriental, com sede em Nairobi, disse que o Quénia tem cinco aeronaves a pulverizar pesticidas em enxames e quatro outras a realizar vigilância. Segundo ele, os produtos químicos não são uma ameaça para os humanos e as autoridades estão a fazer o possível para limitar os danos a outros pequenos insetos, polinizadores e pastagens. Todavia, a insegurança na Somália está a dificultar algumas operações de pulverização, informou a FAO.
As espécies de gafanhotos do deserto são significativamente difíceis de controlar porque ocorrem em áreas remotas e podem deslocar-se até 150 quilómetros num dia. O Grupo de Trabalho Regional de Segurança e Nutrição Alimentar declarou que a África Oriental já está a experienciar um elevado grau de insegurança alimentar, com mais de 19 milhões de pessoas a passar fome.