Bacia hidrográfica do rio Amazonas regista níveis historicamente baixos
A bacia do rio Amazonas registou, nesta quinta-feira (19), novos mínimos históricos, segundo o Serviço Geológico do Brasil. Este fenómeno acontece quando a região enfrenta um das piores secas de que há memória. Veja mais aqui!
A região da Amazónia enfrenta uma seca sem precedentes, aliás, um alarmante retrato dos desafios climáticos que o mundo enfrenta.
Esta região, sobejamente conhecida pelas suas verdejantes áreas de floresta nativa e pelos seus extensos e belos rios, com caudais impressionantes, atravessa, agora, uma periclitante conjuntura, face à falta de precipitação e às altas temperaturas que se têm registado.
É normal que existam períodos de estiagem no bioma amazónico, mas este ano estão a ser batidos vários recordes. Os caudais dos rios e riachos, principalmente dos afluentes do rio Amazonas, há muito que não conheciam níveis tão baixos.
Na sexta-feira (20), a medição do nível do Rio Negro, principal afluente da margem esquerda do rio Amazonas, registou em Manaus, o ponto mais baixo desde 1902, 13,19 metros de altura de caudal, de acordo com o Porto de Manaus.
O rio, conhecido pelo tom escuro das suas águas, razão pelo qual ganhou o nome, e que se estende por mais de 2.200 quilómetros pela Colômbia, Venezuela e Brasil, bateu o seu recorde mais baixo até à data, registado em junho de 2010 com 13,63 metros.
Desde o início de julho, o caudal do rio Negro, diminuiu para praticamente metade, passando de 28 metros para os atuais 14,4 metros.
Em Tefé, as embarcações têm tido dificuldades ao atracar no porto do município, no interior do estado do Amazonas. A gravidade da situação é evidenciada pela régua de medição do nível do Rio Solimões, que há quase 1 mês tem estado abaixo de zero.
De acordo com informações da Defesa Civil Municipal, nalguns trechos, o nível do rio diminuiu para uma média alarmante de um metro e 20 centímetros. Noutros rios importantes da região, como o Madeira, a seca também já é a maior alguma vez registada.
A região está sob pressão do fenómeno climático El Niño, que se manifesta com o aquecimento anormal das águas superficiais do oceano Pacífico, e acaba por afetar o regime de chuvas em várias partes do mundo. Na região amazónica, a seca acentua-se devido à diminuição da humidade e à falta de precipitação, o que prejudica a fauna e a flora locais, bem como as comunidades que destas dependem.
Estas condições têm também contribuído para o aumento do número de incêndios na região. Nos últimos dias, principalmente, a cidade de Manaus, capital do estado do Amazonas, tem estado coberta de fumo, afetando uma população de mais de dois milhões de habitantes.
De acordo com o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) o número de focos de incêndio registados no estado do Amazonas nos primeiros 15 dias de outubro (2.929) aumentou 94% na comparação com o mesmo período do ano passado.
As graves (e variadas) consequências deste fenómeno
Este sério problema tem raízes profundas. Certamente não tanto como as das mais antigas árvores que por ali vivem, mas são já muito antigas as preocupações.
O desmatamento desenfreado, impulsionado pela expansão agrícola, a atividade madeireira e o garimpo ilegal, tem vindo a reduzir a capacidade desta floresta de regular o clima local e reter humidade. Além disso, a destruição de vastas áreas de cobertura vegetal contribui para o aumento das temperaturas e ajudou a criar um ciclo de secas ainda mais acentuadas.
Num estudo recentemente publicado na revista Conservation Biology, foi demonstrado que o desmatamento da Amazónia tem impactos em serviços ecossistémicos essenciais para o Brasil, como os "rios voadores amazónicos". Estes dados científicos mostram-nos que estamos no limiar do desmatamento e da degradação ambiental tolerados por este bioma.
Também as centrais hidroelétricas jogam aqui um papel fundamental. Estas provocam alterações drásticas nos fluxos naturais dos cursos de água, causados pela retenção das águas para a geração de energia. O desvio do fluxo dos rios afeta diretamente os ecossistemas aquáticos e terrestres da região, já que o ciclo hidrológico da bacia é interrompido.
Este fenómeno extremo tem prejudicado sobretudo as populações indígenas que agora se veem privadas de um tão essencial recurso à sua sobrevivência naquela geografia: água potável.
Aliás, estas populações, e também as não indígenas, dependem umbilicalmente dos cursos de água para a sua locomoção e para a recolha de alimentos, essenciais para fazer suprir, principalmente, as suas carências nutricionais.
Também dos cursos de água e dos seus caudais, dependem as atividades comerciais, tanto para a receção de matérias-primas, quanto para o escoamento da produção industrial. Para que tenhamos noção, a logística da Zona Franca de Manaus é hoje realizada praticamente por via fluvial, sendo que 70% chega por navio e o restante através de balsas.
Todo este cenário obrigou a que 50 municípios declarassem situação de emergência. Estima-se que mais 450 mil pessoas já tenham sido afetadas.
Infelizmente, não são apenas os seres humanos que sofrem com a seca. Nos últimos dias, uma triste notícia chamou atenção em Tefé, pelo menos 141 botos de diferentes espécies apareceram mortos nas areias do lago que banha a cidade, segundo o Instituto Mamirauá.