As zonas húmidas estão em risco na Europa

Nem os recentes episódios de precipitação parecem ter acalmado as situações de seca que se multiplicam pelo continente europeu. Os impactes das sucessivas secas poderão ter consequências graves, num futuro próximo. Fique a saber mais sobre o assunto, connosco!

Doñana.
A aridez é cada vez mais evidente em certas áreas do Parque Nacional de Doñana, na bacia do Guadalquivir.

As zonas húmidas são dos ecossistemas que apresentam mais biodiversidade e ao mesmo tempo, dos mais ameaçados do planeta Terra. Só no último século, cerca de 70% destas áreas desapareceram ou perderam parte das suas características naturais, principalmente devido à sobreexploração dos aquíferos. Na Península Ibérica, há um caso em específico que está a preocupar a comunidade científica e que pode ter graves consequências a vários níveis e a curto ou médio prazo.

O Parque Nacional de Doñana é uma área protegida que fica na margem direita do Rio Guadalquivir, no Sul de Espanha, é a mais importante zona húmida da Europa Ocidental, cobrindo uma área de cerca de 543 km2. Os sapais e as lagoas que se encontram nesta área são albergue de milhares de aves aquáticas e de outras espécies, algumas das quais endémicas, mas também raras e ameaçadas de extinção.

Se não forem tomadas medidas políticas atempadamente a paisagem pode mudar de forma irreversível.

A sustentabilidade do Parque e da sua zona húmida tem sido posta em causa devido ao crescimento urbano e ao aumento da atividade agrícola na comunidade autónoma da Andaluzia, mais precisamente na província de Huelva. Os morangos são uma das principais culturas da região, pois têm uma grande expressão económica, já que grande parte da produção é exportada para outros países europeus. Uma nova tentativa de aumento da produção deste fruto, através da implementação de sistemas de rega, que podem retirar grandes quantidades de água dos aquíferos do Parque, está a preocupar a comunidade cientifica local bem como as autoridades da União Europeia.

Para as entidades europeias com competências em matéria de ambiente, estes habitats estão listados como de conservação prioritária. Assim, há a forte possibilidade de a Comissão Europeia voltar a levar o Estado espanhol à barra do Tribunal de Justiça da União, depois de já o ter feito em 2021. Segundo a Comissão, o Governo de Espanha não está a tomar as medidas necessárias e adequadas para proteger o Parque e os seus habitats.

Os efeitos da atividade humana (e não só)

A maioria das lagoas existentes no Parque Nacional de Doñana são lagoas rasas, sazonais e que dependem diretamente dos aquíferos que, por sua vez, são abastecidos pelas águas das chuvas. O grande aquífero que alimenta o Parque ocupa uma área quase 5 vezes maior que a área do próprio Parque. Está comprovado que, nos últimos anos, 3 dos 5 corpos que compõem o aquífero estão em sobreexploração, o que tem levado a que vastas áreas já não fiquem inundadas no Inverno e Primavera, com consequências nocivas para os ecossistemas.

Este Parque é uma área protegida desde 1969, mas nas últimas décadas tem-se assistido a uma mudança significativa do uso do solo, principalmente nas áreas limítrofes. A construção de estâncias turísticas, com os seus campos de golfe, o aumento brutal do uso de estufas para cultivar morangos (mais de 11000 hectares, atualmente) e as captações ilegais de água têm contribuído para a descida constate do nível dos aquíferos.

Os fatores climáticos (temperatura e precipitação) também desempenham um papel fundamental nesta análise. As alterações climáticas “normalizaram” anos mais quentes e menos chuvosos. Assim, cerca de 60% das lagoas conhecidas no Parque de Doñana já não ficam inundadas desde 2013, sendo que, desde então, estas áreas têm sido colonizadas por arbustos e pinheiros em crescimento.

O Parque Nacional de Doñana, tal como outras áreas protegidas pela Europa, encontra-se em situação crítica, que requer ações urgentes. A conjugação de fatores físicos e humanos está a fazer com árvores centenárias, como os sobreiros que abrigavam as famosas garças, estejam a secar. Se não forem tomadas medidas políticas atempadamente a paisagem pode mudar de forma irreversível.