A escassez de água no sul de Portugal manteve-se em finais de dezembro de 2023
O sul de Portugal despediu-se de 2023 mergulhado em preocupações hídricas, com a crise climática a agravar a escassez de água no Alentejo e Algarve. As barragens, especialmente a sul do Tejo, registam níveis críticos, o que agrava as apreensões para o próximo ano agrícola.
O ano de 2023 despediu-se com um cenário preocupante no que diz respeito à disponibilidade de água no sul de Portugal, especialmente nas regiões do Alentejo e Algarve. A crise climática e os padrões de precipitação irregulares agravaram a situação, deixando a maioria das barragens nesta região com níveis preocupantemente baixos de armazenamento de água.
Desigualdade hídrica: desafios assomam com reservas críticas no Sul de Portugal
O Serviço Nacional de Informação de Recursos Hídricos (SNIRH) publicou recentemente o boletim semanal, a 27 de dezembro de 2023, destacando a disparidade entre as reservas hídricas a norte e a sul do rio Tejo. Se por um lado, as barragens a norte apresentam reservas superiores a 80%, a maioria das barragens a sul está abaixo dos 50%, e algumas delas, como Campilhas, Monte da Rocha e Vigia, registam níveis críticos, com apenas 7%, 8% e 17% de armazenamento, respetivamente.
Destaca-se também que em 12 bacias hidrográficas ocorreu uma diminuição nas reservas de água durante a última semana (entre 18 de dezembro e 27 de dezembro), agravando ainda mais a situação em algumas partes do país.
A análise das albufeiras monitorizadas revela uma realidade preocupante. Destas, apenas 44% apresentam disponibilidades hídricas superiores a 80% do volume total. Em contrapartida, 22% destas albufeiras possuem disponibilidades inferiores a 40% do volume total, indicando uma situação crítica em ¼ das áreas monitorizadas.
Ao avaliar os armazenamentos no final de dezembro de 2023 por bacia hidrográfica, observa-se que, em termos gerais, os números superam as médias históricas de armazenamento para o mês de dezembro, considerando o período que medeia entre 1990/91 e 2022/23. No entanto, vale ressaltar que algumas bacias hidrográficas, como o Mondego (68,2%), Sado (40,4%), Mira (30,8%), Arade (24,7%), Ribeiras do Barlavento (7,7%) e Sotavento (29,8%), permanecem abaixo das médias históricas, indicando desafios persistentes em algumas destas áreas.
Barragem de Santa Clara e Alqueva encontram-se entre as principais ameaçadas
A situação é particularmente preocupante na albufeira de Santa Clara, onde os sedimentos acumulados ao longo dos anos contribuíram para uma redução significativa do volume de água armazenado. Em 2008, o Instituto Nacional da Água estimou que aproximadamente 200 hm3 de sedimentos estavam depositados no leito da albufeira, e desde então, a coluna de água foi reduzida em 10 metros.
A incerteza quanto às previsões de precipitação nas próximas semanas aumenta as preocupações em relação ao próximo ano agrícola. A Associação de Beneficiários do Mira ainda não informou os agricultores sobre a quantidade de água disponível para a rega em 2024. O presidente suspenso da associação, Manuel Amaro Figueira, antecipa um cenário de pesar, afirmando que, com o volume atual em Santa Clara, uma campanha normal de rega é inexequível.
As consequências da sedimentação nas barragens não são exclusivas de Santa Clara. Um inventário realizado, em 2008, pelo Instituto Nacional da Água revelou que, das 166 barragens portuguesas inventariadas, Santa Clara destacava-se com o maior volume de sedimentos, comprovando a gravidade do problema em diversas albufeiras.
É certo que a gestão da água em território nacional, durante 2024, enfrentará desafios pautáveis, especialmente com a reserva de água de Alqueva próxima do limite máximo estabelecido para o regadio.
Diplomacia com Espanha em torno da gestão dos recursos hídricos
A disputa iminente com Espanha pela água tem vindo a exacerbar-se, com as autoridades andaluzas a pedir a transferência urgente dos direitos de água da albufeira portuguesa de Alqueva. O conflito surge perante a dependência de Portugal em relação a Espanha relativamente a 40% da quantidade da água, evidenciando a vulnerabilidade do país na gestão conjunta dos recursos hídricos.
A Convenção de Albufeira, que regula a transferência de água entre Espanha e Portugal, assume-se como um acordo de grande relevância para o próximo ano, atendendo a que as autoridades espanholas procuram uma revisão do acordo para garantir o abastecimento em tempos de seca extrema. A gestão rigorosa e os cortes nos consumos ilegais são destacadas como medidas cruciais para otimizar a utilização da água disponível.
Num momento em que Portugal observa desafios significativos na gestão de seus recursos hídricos, a incerteza climática e a dependência de acordos internacionais ressaltam a necessidade de uma abordagem adaptativa e sustentável para enfrentar as mudanças nas condições climáticas e garantir a segurança hídrica no futuro.