20 de fevereiro de 2010: o dia do temporal que a Madeira não irá esquecer

A 20 de fevereiro de 2010, a ilha da Madeira experienciava aquele que ficaria marcado como um dos piores dias da sua história, provocada por uma situação meteorológica adversa. Volvidos 13 anos recordamos o episódio.

Ilha da Madeira; aluvião; temporal 2010
A ilha da Madeira vivenciou há precisamente 13 anos um dos piores dias da sua história. Fonte: Lusa

A 20 de fevereiro de 2010, na sequência de um período chuvoso na ilha da Madeira, uma situação meteorológica adversa, conhecida regionalmente como aluvião, atingiu, com grande intensidade, alguns concelhos da vertente sul da ilha, em particular os concelhos do Funchal e da Ribeira Brava.

O aluvião continua (e continuará) gravado na memória dos madeirenses, uma vez que deixou um rasto de destruição, provocando a morte a 47 pessoas, deixando quatro desaparecidos, 600 desalojados e 250 feridos. Os estragos materiais foram avaliados em 1.080 milhões de euros.

Esse mês de fevereiro de 2010 foi particularmente chuvoso e ficou marcado pelos maiores valores registados de precipitação, com uma acumulação mensal de 458,47 mm, sete vezes maior do que a média histórica da região, segundo o IPMA. O valor total da quantidade de precipitação nesse mês variou entre 170.4 mm em Porto Santo e 1379.1 mm no Areeiro.

No fatídico dia 20 de fevereiro, das 00 h às 24 h, registou-se uma precipitação de 144.3 mm no Funchal, o equivalente a cerca de 144 litros de água por metro quadrado. Das 09h do dia 20 até às 09h do dia 21 caíram 97.0 mm, o 2º maior valor observado no mês desde 1949, só ultrapassado pelo registado das 09 h do dia 1 às 09 h do dia 2 do mesmo mês (111.0 mm).

Naquele trágico dia, o estado do tempo no arquipélago foi condicionado pela passagem de uma depressão muito cavada, à qual estiveram associadas nuvens com grande desenvolvimento vertical, que deram origem a precipitação muito forte e intensa.

Aluviões: afinal o que são?

Podemos defini-los como fenómenos complexos, resultado da interação de processos meteorológicos, hidrológicos e geomorfológicos, provocados por precipitação intensa, que originam cheias repentinas de grande dimensão, associadas a desmoronamentos e movimentos de massa em vertentes, e a um enorme potencial destrutivo.

A ocorrência deste tipo de fenómenos na ilha da Madeira são frequentes. Quem o diz é a história. Desde o início do século XIX já se deram, nesta ilha, cerca de 30 aluviões de intensidade significativa, caracterizadas por cheias rápidas e violentas que transportam elevadas concentrações de material sólido.

O mais significativo destes ocorreu a 9 de outubro de 1803 que, segundo registos de relatos da época, ceifou a vida a entre 800 a 1000 pessoas, a maioria residente no concelho do Funchal.

youtube video id=EFvAAmrQGMw

A causa da severidade dos efeitos relacionados com o aluvião de 2010 deu-se tanto por fatores antrópicos, quanto por motivos naturais, maturados ao longo do processo histórico de evolução da paisagem da ilha, ainda que os antrópicos tenham aqui um peso muito mais significativo.

Aliás, diversos autores defendem que a frequência e a capacidade destrutiva destes fenómenos aumentou de forma significativa a partir da década de 70 do século XX, o que se poderá explicar pelo crescimento populacional, a ocupação do solo e a modificação dos perfis de leito de cheia das ribeiras, e a crescente impermeabilização do solo e subsolo.

Madeira: algumas características e possíveis causas da tragédia

A ilha da Madeira apresenta algumas características particularmente interessantes e que fazem desta um mais apetecíveis territórios insulares do mundo para a prática do turismo.

O seu relevo irregular e montanhoso é um dos seus mais conhecidos e admirados atributos, o que também se revela como um fator explicativo da perigosidade natural predominante, normalmente associada a eventos de precipitação intensa.

A sua rede hidrográfica é composta por ribeiras que se desenvolvem desde a cordilheira montanhosa central até à costa, em vales estreitos e profundos, de declive acentuado. As ribeiras onde o Funchal está inserido, por exemplo, possuem cerca de 13 km², com um tempo de concentração de cerca de 2 horas.

A geomorfologia da ilha condiciona fortemente a ocupação deste território e levou as populações a instalarem-se nas partes terminais das ribeiras, como é o caso, entre outros, das principais povoações da vertente sul da ilha, como Machico, Funchal e Ribeira Brava. Também a pressão urbanística conduziu à ocupação das cotas mais elevadas das vertentes, em locais onde o risco de movimentos de massa em vertente é acentuado.

Todos estes fatores conjugados contribuíram para o desfecho do fatídico 20 de fevereiro de 2010. Paralelamente, as ações antrópicas, a formação geológica da ilha e a sua evolução geomorfológica, resultaram em bacias declivosas com um curto tempo de concentração, tornando a ilha mais suscetível à ocorrência de eventos extremos como este.